27 de julho de 2019

CÂNTICO DOS CÂNTICOS, UMA HISTÓRIA DE AMOR

Um dos poemas de amor mais famoso de todos os tempos é também um dos livros mais enigmáticos da Bíblia. O Cântico dos Cânticos, que compõe o livro do Antigo Testamento, começa atribuindo sua autoria ao rei Salomão (971-931 a.C.), talvez por entender do tema amor, pois segundo a história ele tinha um harém de 700 esposas e 300 concubinas. O livro começa assim: “Beija-me com teus beijos! Tuas carícias são melhores que o vinho!”. Com estes versos inaugura o Cântico dos Cânticos, um longo diálogo entre um jovem casal apaixonado.

Entre os judeus e os cristãos não faltaram polêmicas sobre a inclusão ou não do poema nas Escrituras Sagradas, assim como não faltaram traduções e interpretações que buscavam minimizar, ou até eliminar, seu erotismo elegante, mas, desinibido. Todavia, ninguém duvida quando ouvimos as expressões: “lábios de mel” ou “olhos de jabuticaba”, são nesses versos que escutamos ecos de uma tradição poética de mais de três mil anos, inaugurada, ao que tudo indica, pelos escribas egípcios e, portanto, tão antiga quanto à própria civilização.

Durante milhares de anos a palavra “amor” sofreu uma metamorfose tremenda com a entrada em cena do Novo Testamento. Agora “Deus é amor”, proclamada por São João Evangelista (10-103 d.C.) em sua Primeira Epístola, talvez a manifestação mais clara de que o termo antes usado para se referir à atração entre homem e mulher muda de sentido e é adotado como base de toda uma nova religião. Essa revolução só pode realmente ser compreendida, quando descobrimos que nada menos que três palavras diferentes do original grego do Novo Testamento foram traduzidas como “amor”.

O amor “ágape”, ou seja, um amor desinteressado, de doação sem espera de recompensa: “caridade”. Essa terminologia foi utilizada pelo Evangelista São João e também pelo São Paulo Apostolo (05-67 d.C.), no célebre capítulo 13 de Coríntios, transformado em balada pop por Renato Russo (1960-1996) da Banda Legião Urbana na canção “Monte Castelo”: “ainda que eu falasse a língua dos homens e dos anjos, e tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda tivesse toda a fé, se não tivesse amor, eu nada seria”.   

Finalmente, da para entender porque em várias edições do Novo Testamento, esse trecho aparece com a palavra “caridade” no lugar de “amor”. A influência grega nessa espiritualização do conceito de amor, não foi pequena. A prova principal está na expressão “amor platônico”, que entrou para o vocabulário popular do mundo todo com seu sentido distorcido. Vale à pena voltar à fonte do “O Banquete”, escrito por Platão (427-347 a.C.), simplesmente porque é um dos textos chaves da cultura clássica ocidental e um dos mais saborosos tratados filosóficos da Grécia Antiga sobre o amor.

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