29 de janeiro de 2013

A MORTE É ONDE MORA A SAUDADE

Entendemos como morte tudo aquilo que não temos mais. A morte que para nós existe visível é a do outro que já não existe mais. Penso que se fossemos Brás Cuba, aquele do romance escrito por Machado de Assis (1839-1908), com certeza este trabalho de nossas memórias póstumas, talvez pudéssemos adiantar algo de concreto sobre a morte, por isso somos eternos inconformados, pois, o que nós não podemos conceber é não ter memória da nossa morte. Passamos a vida inteira morrendo aos pouco e, quando a morte vem nos buscar, não podemos assisti-la.

A morte está onde menos esperamos que ela estivesse. Tanto naquelas fotos que guardo dos meus filhos quando eles tinham aproximadamente entre três e quatro anos de idade, como naquela música da época que nos traz lindas recordações de momentos que vivemos, que a morte levou e nos deixou saudades. Como diz a música de Nelson Cavaquinho e Jair Costa, Eu e as Flores: “Quando eu passo perto das flores quase elas dizem assim: Vai, que amanhã enfeitarei o seu fim”. Entretanto, ao olhar hoje para as fotos dos meus filhos quando eram pequenos, sinto um aperto no coração e prontamente sou tomado por um saudosismo incomensurável, sinto que aquelas crianças da foto não existem mais, como jamais voltarão a existir. É aqui onde mora a nossa saudade.

Como argumenta o escritor irlandês James Joyce (1882-1941): “A nossa história é um pesadelo do qual estamos tentando acordar”. O final das coisas é sempre doloroso para quem fica. Sinto que a dor faz parte do simples fato de que o mundo existe. A dor é o preço que pagamos por estar vivos. Para o filósofo Karl Marx (1818-1883), “a alienação cria o descompasso entre a nossa existência e a nossa essência. Não vivemos o que somos e nem podemos ser o que gostaríamos de viver”. Entretanto, a meu ver essa adequação entre a essência e a existência, está a nossa santidade. Contudo, a dor pelos vivos às vezes dói muito mais, arranca de nós um pedaço, ou seja, a metade adorada e querida de mim que vai junto.

Certa vez li uma crônica de Millôr Fernandes, que trazia como título: “A morte da tartaruga”. Conta a história de um garoto que foi ao quintal de sua casa e voltou chorando. A tartaruga de sua estimação tinha morrido. O menino não se conformava com a cena do bichinho morto. A mãe foi ao quintal com ele, mexeu na tartaruga com um pau e constatou que a tartaruga tinha morrido mesmo. Diante da confirmação da mãe, o garoto pôs-se a chorar ainda com mais força. A mãe, a princípio, ficou penalizada, mas logo começou a ficar aborrecida com o choro do menino. “Cuidado, senão você acorda o seu pai”. Mas o garoto não se conformava. Pegou a tartaruga no colo e pôs-se a acariciar-lhe o casco duro. A mãe disse que comprava outra, mas ele respondeu que não queria, só interessava aquela, viva! A mãe lhe prometeu um carrinho velocípede e lhe prometeu uma surra, caso não parasse com aquela choradeira, mas o pobre menino parecia estar mesmo profundamente abalado com a morte do seu animalzinho de estimação.
                                                                                         
Entretanto, com tanto choro, o pai que estava descansando depois de uma longa noite de trabalho, acordou com o barulho. Levantou para certificar o que estava acontecendo. O garoto prontamente mostrou-lhe a tartaruga morta. A mãe disse: “Já conversei com ele e até prometi outra tartaruga, mas não adianta ele continua berrando desse jeito”.

O pai examinou a situação e propôs o seguinte: “Se a tartaruga está morta não adianta mesmo você chorar filho. Deixe-a e venha aqui com o pai, pois tive uma ideia”. O garoto colocou cuidadosamente a tartaruga junto ao tanque de água e seguiu o pai, pela mão. O pai serenamente sentou-se na poltrona, botou o garoto no colo e disse: “Eu sei que você sente muito a morte da tartaruguinha. Eu também gostava muito dela. Mas nós vamos fazer para ela um grande funeral”. O menininho parou imediatamente de chorar. “O que é funeral?” O pai lhe explicou que era um enterro. “Olha, nós vamos à rua, compramos uma caixa bem bonita, com bastante bala, bombons, doces e voltamos para casa. Depois botamos a tartaruga na caixa, em cima da mesa da cozinha, e rodeamos de velinhas de aniversário. Convidamos os seus amiguinhos, acendemos as velinhas, cantamos o Feliz Aniversário pra tartaruguinha morta e você assopra as velinhas. Depois pegamos a caixa, abrimos um buraco no fundo do quintal, enterramos a tartaruguinha e botamos uma pedra em cima com o nome dela e o dia em que morreu. Isso é funeral! Vamos fazer isso?”

Depois de ouvir o pai, o garoto já estava com uma carinha melhor. “Vamos papai, vamos! A tartaruguinha vai ficar contente lá no céu, não vai? Olha, vou buscá-la”. E saiu correndo. Enquanto o pai trocava de roupa, ouviu um grito no quintal. “Papai, papai, vem ver, ela está viva!” O pai correu para o quintal e constatou que era verdade. A tartaruga estava andando de novo, sem nenhum problema. “Que bom, hein?” Disse o pai. “Ela está viva! Não vamos ter que fazer o funeral”. “Vamos sim, papai”, disse o menino ansioso, pegando uma pedra “Eu mato ela com uma pedrada”.

Portanto, como toda história tem a sua moral e com essa não poderia ser diferente. Ou seja, o mais importante não é a morte, mas o que ela nos tira. Seja uma pessoa, seja um animalzinho de estimação ou mesmo a morte de um grande amor que não temos mais e que hoje nos faz muita falta. Como dizia Dorival Caymmi: “É tão triste ver partir alguém que a gente quer com tanto amor”. Contudo, o que fica na memória são saudades e lembranças de algo que nos foi tirado.
        

28 de janeiro de 2013

O QUE É A VERDADE?

Quando perguntamos o que é a verdade, está implícito que seja tudo aquilo que posso comprovar ou verificar. Isto é, a verdade é a representação fiel de alguma coisa existente na natureza. É a qualidade pela qual as coisas se apresentam como são. Para o filósofo grego Aristóteles, a verdade é a harmonia total ou parcial, entre o meu pensamento subjetivo e a realidade objetiva, existe uma completa identificação do sujeito com o objeto.

Segundo a filósofa Marilena Chauí, a idéia de verdade foi construída ao logo dos séculos, com base em três concepções diferentes, vindas da língua grega, do latim e do hebraico. A palavra verdade do grego alétheia, quer dizer: “o não esquecido, não escondido, não dissimulado”. Todavia, a verdade é o que vemos numa contemplação ou o que se mostra aos nossos olhos. Verdade em latim, veritas quer dizer: “precisão ao rigor e à exatidão de um relato, no qual se diz com detalhes pormenores e fidelidade o que realmente aconteceu”. Em hebraico, verdade quer dizer emunah, que significa: “confiança” está ligado à pessoa que cumpre o que promete e que é fiel a palavra dada ao pacto feito, que não traem a confiança. Por conseguinte, palavras como averiguar e verificar indica buscar a verdade; veredicto é pronunciar um julgamento verdadeiro.

Por outro lado, pergunta-se se a verdade tem valor objetivo e autônomo, ou se não passa de uma opinião subjetiva e heterônoma. A verdade, dizem os relativistas, não é uma norma fixa, espécie de monopólio, pelo qual eu deva orientar o meu espírito e a minha ética, mas é, antes de tudo, como um boneco ou fantoche que eu mesmo fabrico e manipulo como bem entendo, segundo as conveniências do momento. Se minha verdade for desfavorável aos meus interesses individuais, modifico-a até que se amolde aos meus gostos pessoais, aos interesses do meu grupo, da minha pátria ou da minha igreja.

Neste último caso, a verdade deixa de ser livre e soberana, para se tornar escrava e servidora dos meus interesses. Deixa de ser uma verdade libertadora, pois ela mesma não é livre. O conhecimento é uma relação entre o sujeito que conhece e o objeto conhecido. O conhecimento para ser verdadeiro, tem que corresponder ao objeto existente na realidade exterior, neste caso o conteúdo do conhecimento é verdadeiro, não depende de nossa consciência, de nossa vontade ou preferência. Por conseguinte, está implícito que estamos diante de duas categorias de verdade.

Tendo como verdade objetiva, as leis naturais descobertas pelo homem, que não depende de nós, elas simplesmente existem, que não dependem da nossa vontade, são as chamadas ciências naturais como: Astronomia, Física, Química, Biologia, Antropologia, Sociologia, Psicologia, etc. Por outro lado, estão as verdades convencionais, relativas e subjetivas. Criadas pelo homem para regular a convivência humana em sociedade. As chamadas verdades axiológicas ou normativas, que são as leis jurídicas, éticas e religiosas. Embora sejam também ditadas por determinadas condições objetivas da nossa existência social, mas essas leis normativas podem ser revogadas pelos homens, pois foram feitas por eles, assim como: Direito, Política, Ética, Religião, Regras de Trânsitos, etc. São verdades subjetivas, relativas, que posso adulterar de acordo com os meus interesses.  

No entanto, o que existe na realidade, no mundo dos fatos, não pode ser verdadeiro ou falso. Simplesmente existe. Verdadeiro ou falso só podem ser os nossos conhecimentos, nossas percepções, nossas opiniões, nossos conceitos ou juízos a respeito do objeto. Para muitos filósofos céticos e idealistas, afirma que a verdade não tem caráter objetivo, que a verdade é relativa, múltipla, o que é verdade para uma pessoa, pode não ser para outra, isto é, cada sujeito tem a sua verdade.

Para o filósofo existencialista Jean-Paul Sartre (1905-1980), a palavra verdade ao longo do tempo, perdeu todo o seu sentido. Cada um coloca arbitrariamente as normas do verdadeiro e do falso, por uma decisão não menos arbitrária de escolher normas totalmente diferentes. Acontece que o raciocínio desses filósofos é errôneo. Eles confundem os sentidos diferentes dos conceitos de objetivos e subjetivos.

Todavia, para essas pessoas, os objetos e suas propriedades só existem dentro do sujeito que conhece, isto é, tem caráter subjetivo. Por outro lado, consideram a verdade como subjetiva, uma opinião toda pessoal que não tem correspondência adequada no mundo objetivo, exterior. Eles acham que a verdade é uma construção subjetiva que depende da nossa consciência, de nossa vontade, desejo e gosto.

O escritor francês Saint-Exupery, relata no seu livro “O Pequeno Príncipe”, o personagem principal é um subjetivista típico. Tudo que ele quer ou sonha, pensa que é real. A realidade e a fantasia se confundem não há distinção entre o real e o irreal, entre o verdadeiro e o falso. Quando o Pequeno Príncipe pediu ao rei que “ordenasse ao Sol que se ponha”, o rei muito sensatamente replicou: “É preciso exigir de cada um, o que cada um pode dar. A autoridade repousa sobre a razão. Se ordenares ao teu povo que ele se lance ao mar, certamente esse povo fará uma revolução.”

Entretanto, o conteúdo da verdade não depende da nossa mente e nem da nossa vontade. Sendo um reflexo fiel da realidade, a verdade só pode ser uma só. Por conseguinte, estão redondamente enganados aqueles que afirmam que cada um tem a sua verdade, que existem tantas verdades quantos sujeitos e que não existem verdades objetivas, validas para todos. Há um grande equivoco em torno da verdade. O fato do daltônico sentir erradamente como verde a cor vermelha, isso não significa que seja assim na realidade, significa apenas que os sentidos dessa pessoa não refletem corretamente as ondas luminosas. O fato de termos a impressão de que a Terra é plana e imóvel e que o Sol gira em torno dela não significa que seja assim na realidade. Alias, durante muito tempo a humanidade toda pensava assim. A afirmação estabelecida pela ciência, de que a Terra é redonda e que ela gira em torno do seu próprio eixo e em torno do Sol é uma verdade objetiva, que não depende de nossa opinião ou vontade subjetiva. Contudo, quantas pessoas foram queimadas em praças publicas na época da Inquisição por causa dessa afirmação verdadeira.

Podemos citar outros tantos exemplos para constatar a verdade objetiva. Assim, como o fogo queima a mão, de que certas substâncias são venenosas e não são invenções do homem. É preciso ser muito infantil para não acreditar na objetividade dessas verdades estabelecidas pela mente humana no decorrer de sua longa experiência. Alias é o que fazem as crianças enquanto não põem a mão no fogo não se convencem disso.    

Por outro lado, a aceitação de uma verdade absoluta, como acontece na religião, tem consequências graves. Todavia, existe uma adesão a uma verdade relativa, mais complexa ainda. Esse conflito em torno da verdade cavou um abismo invisível entre esses dois grupos em que se divide a humanidade em todos os tempos. Portanto, todos os bens e todos os males, no plano da moral e da ética, derivam da aceitação prática desta ou daquela filosofia sobre o caráter e a função da verdade.
Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará. Nesta frase lapidar contém uma profunda filosofia de vida, que pode amenizar esse conflito entre os povos. Ninguém tem a verdade, mas, todos buscam a verdade. Como argumenta o filósofo e escritor turco, de origem armênia Jacob Bazariam, no seu livro “O Problema da Verdade”: “sem o sujeito cognoscente não há verdades. Mas isso não significa que a verdade seja subjetiva, pois o conteúdo dessa verdade não depende de nós, de nossa vontade. O que nós podemos é estudar os objetos e fenômenos e descobrir as verdades e as leis naturais pelas quais elas se regem, refletindo corretamente na nossa mente aquilo que existe na realidade objetiva”. Para o pensador indiano Mahatma Gandhi (1869-1948): “A verdade é dura como diamante e delicada como a flor de pessegueiro”.

Portanto, está mais que claro, que o conteúdo da verdade não depende de nós ou de nossa vontade, porque a verdade não é subjetiva. Nós não podemos criar, fabricar, inventar verdades e leis naturais. Elas estão ai para serem descobertas. O que nós podemos é estudar com profundidade os objetos e fenômenos e através deles descobrir a verdade e as leis naturais que estão implícitas. Mesmo o amor que sentimos um pelo outro, só pode sobreviver alicerçado na verdade. A grande verdade está em “amai-vos uns aos outros”. Todo mundo como irmão, uma vida de fraternidade, ligados pelo amor divino, substituindo o egoísmo estúpido e estreito de hoje, pelo respeito e o amor inteligente e altruístico ao meu semelhante.  Como disse Mahatma Gandhi: “Tudo o que vive é o teu próximo”.      

14 de janeiro de 2013

O TRABALHO DO FILÓSOFO

O papel social do filósofo é por pensamento no mundo, isto é, colocar as pessoas para pensarem, estimular o senso crítico, despertando-os para o mundo do saber. Diariamente precisamos tomar decisões rápidas, sem perder muito tempo com reflexões e questionamentos. Todavia, quando alguma coisa não da certo em nossa vida, nós e a sociedade como um todo entramos em crise. É nesse momento que necessitamos de uma reflexão mais apurada dos fatos.

Entretanto, o filósofo faz interpretações e construções calcadas no saber filosófico, mas, principalmente, usa de sua sensibilidade, criatividade e, sobretudo sua intuição, o mesmo que comparado a uma manifestação artística. Ele, assim como o artista, vive emoções multicoloridas quando realiza seu trabalho. O artista, bem como o filósofo, cria. Criar é tirar algo do nada, mas esse nada é algo que não é perceptível num olhar superficial, requer um olhar profundo, um olhar crítico e apurado.

O filósofo vai desbravando arduamente, como um arqueólogo, esse universo simbólico da nossa inteligência, trabalhando profundamente e descobre que nesse universo não há somente escuridão, monstros, demônios, perseguidores ou bruxos. Há, sobretudo, claridade, anjos, um tesouro rico em qualidades, bondades e capacidade de conhecer. Há obras de arte preciosas adormecidas que podem ser acordadas.

O objetivo do filósofo é ajudar os seus discípulos a conceberem suas próprias ideias. Essa pratica ficou conhecida como maiêutica, termo grego usado pelo filósofo ateniense Sócrates (469-399 a.C.) que significa a arte de trazer a luz, em homenagem a sua mãe que era parteira. Sócrates interrogava seus interlocutores sobre aquilo que pensavam saber. Usava a ironia, palavra grega que quer dizer interrogação. Na linguagem cotidiana, a ironia tem um significado depreciativo, sarcástico ou de zombaria.     

O filósofo capta o sofrimento dos seres humanos com seu coração paterno, amoroso, acolhedor e paciencioso. Ele vai caminhando lado a lado com os seus discípulos por dentro desse universo simbólico, viajando pelas paisagens multicoloridas, sem memórias e sem pressa. Semeando o saber com provas. Conheça-te a ti mesmo, é o ponto de partida e o principal fundamento da filosofia de Sócrates. 

O filósofo, permitindo-se tocar pelo seu sentimento, comunica aos seus discípulos sua compreensão desta relação, com a proposta de facilitar mudanças de pensamentos diante do mundo em que vivemos. O que o filósofo põe em palavras, faz eco para muitos e o assegura de que seus discípulos estão em sintonia emocional e racional com ele.

No seu trabalho o filósofo estuda o significado mais profundo da existência humana. Contribui para a discussão e interpretação dos principais problemas da realidade histórica de uma sociedade. É abrindo esse espaço de reflexão que leva o filósofo a ser um artista em seu trabalho, assim como o pintor quando pinta, o escultor quando esculpe e o músico quando compõe.

O filósofo, interagindo com seus discípulos permite que a razão entre nesse universo simbólico e se espalhe como tintas que vão deslizando e colorindo seu espaço interior. Juntos, filósofo e discípulos vão lapidando o diamante bruto que já existe dentro de cada um de nós, talvez, até então, despercebido. A cada encontro com os seus discípulos é um novo encontro artístico, onde produzem obras de arte belíssimas.

À medida que esses encontros vão evoluindo, principalmente com a supervisão e orientação do filósofo, cada vez mais, vai abrindo espaço para que se torne criativo, verdadeiro e amoroso o seu trabalho. Provocando mais discernimento na percepção e, principalmente, o autoconhecimento, que é fundamental para o senso crítico e, sobretudo, criar um terceiro olho, para um olhar analítico e racional.

Portanto, ambos, artista e filósofo, desenvolvem um trabalho artesanal, em que, por meio de um mergulho profundo para dentro de si, resgatam as suas próprias riquezas internas, e as oferece, por sua vez, o artista, aos seus expectadores, e o outro, neste caso o filósofo, aos seus discípulos. É discutindo a vida, que compartilhamos com a arte de pensar diferente. Como diz o filósofo e educador Eduardo Prado de Mendonça (1924-1978): “Os homens que julgam não afastar-se da vida, estes, por não se ocuparem da filosofia, estes sim podem estar afastados da realidade, pois deixam, por deficiência de concepção, de viver como poderiam e deveriam viver”.               

10 de janeiro de 2013

O SIGNIFICADO DA FÉ


A fé é uma palavra de origem latina que significa fides, e quer dizer: fidelidade, confiança, credibilidade. A fé é um sentimento de total fidelidade por alguma coisa ou por alguém. Somente a fé pode nos mover na direção da esperança. A esperança é um elemento intrínseco da estrutura da vida, faz parte da dinâmica do espírito humano. Por conseguinte, a fé convive com a dúvida e elimina a possível certeza que alguém possa vir a ter. Assim como crer não é a mesma coisa que ter fé. Crer é algo incerto e vago. Por exemplo, quando digo, creio que vai chover hoje, não estou afirmando. Crer em Deus, não é a mesma coisa que ter fé. Quem tem fé ou fidelidade para com Deus, estabelece perfeita sintonia de pensamento com esse Eu divino. É na verdade, um salto no abismo, isto sim é ter fé.

Todas as pessoas que tem certeza são intolerantes. Estão sempre certas sobre seus pensamentos. Por que iria ouvir ideias diferentes de outras pessoas? As pessoas que têm certeza não são abertas as novas ideias. Não são abertas ao diálogo e não estabelecem relações duradouras por acharem que estão sempre certas, no seu conceito e ideal de vida.

Por outro lado, nos foi ensinado no catecismo dominical, que o mundo criado por Deus tem muito mais coisas boas do que ruins. Nós achamos os desastres da vida desconcertantes não apenas porque são dolorosos, mas também porque são excepcionais. A maioria das pessoas se sente bem disposta para ir a luta diariamente. Com o avanço da medicina muitas das doenças hoje são curaveis. Diariamente os aviões decolam, pousam em segurança. A maior parte das vezes que enviamos nossas crianças para brincar, elas retornam para casa sãs e salvas.

Os acidentes, os roubos, o tumor que não pode ser operado, com raras as exceções, nos despedaçam frente a vida. Quando se é golpeado por algum desses fatos é muito difícil mantermos a calma. Quando se está próximo de um objeto muito grande, tudo que se pode ver é o objeto em si. Somente quando nos afastamos do problema é que podemos perceber dentro contexto que os monstros criados pelo nosso universo simbólico, não é tão assustador assim.

Quando somos desnorteados por alguma tragédia, só podemos ver e sentir a tragédia. Quem tem um ente querido morto, vítima da criminalidade, vai desejar a pena de morte a todos os bandidos e delinquentes. Apenas com o tempo e a distância veremos a tragédia no contexto da vida inteira e do mundo inteiro.

Na tradição judaica, a oração especial conhecida como Kaddish não é sobre a morte, mas sobre a vida. Ela louva a Deus por ter criado um mundo basicamente bom, em que se pode viver. Recitando aquela oração, a pessoa de luto é lembrada de tudo o que é bom e digno de ser vivido. Para o rabino Harold S. Kushner (1935), a oração Kaddish é uma afirmação de vida e esperança.

Que diferença faz a fé em nossa vida? Para que serve Deus em nossa vida se Ele nem cura e nem mata? Parece que Deus não interfere no mundo físico dos vivos. Mas, Deus faz coisas muito nobres, inspirando pessoas a se ajudarem, principalmente aquelas que foram feridas pela vida e a protegê-las do perigo quando se sentirem as sós, abandonadas ou julgadas pelo seus opressores.

Deus faz com que algumas pessoas queiram tornar-se educadores, engenheiros, médicos e enfermeiros, aplicando-se noite e dia, com sacrifício e intensidade que nenhum dinheiro pode compensar, à tarefa de sustentar a vida e aliviar a dor. Fazendo com que as pessoas se inclinem às pesquisas, focalizando sua inteligência e energia sobre as causas e as possíveis curas de algumas das tragédias imposta pela vida.

Quando eu era criança, no início do verão era tempo mais agradável em Rubião Junior, distrito de Botucatu, cidade no interior do Estado de São Paulo, onde nasci e vivi toda a minha infancia e uma parte da minha juventude. Era também uma época de apreensão para as famílias com crianças pequenas pelo receio de surtos de poliomielite. Pessoas dispostas e interessadas usaram incansavelmente a inteligência estudando muito, dedicando-se seu tempo integral a pesquisa dessa epidemia e logo descobriram a cura e esse temor foi eliminado.

Através da história humana ocorreram pestes e epidemias que varreram cidades inteiras. Os casais sabiam que tinham de ter muitos filhos para que algum deles sobrevivesse até a idade adulta. A inteligência humana chegou a uma compreensão maior das leis naturais no que diz respeito ao sanitarismo, aos germes, à imunização, aos antibióticos, conseguindo eliminar muitas daquelas doenças. E até hoje a humanidade agradece.

Deus, que não causa e nem elimina as tragédias, ajuda inspirando as pessoas a ajudarem-se. Como o rabino ortodoxo Harold S. Kushner, certa vez observou: “os seres humanos são a linguagem de Deus. Deus demonstra sua oposição ao câncer e aos defeitos de nascença, não eliminando-os ou fazendo-os acontecer apenas às pessoas ruins, mas convocando amigos e vizinhos para aliviar o fardo e preencher o vazio”.

Portanto, para quem perguntar por que ter fé ou confiar em Deus, eu diria que Deus não pode evitar as calamidades da natureza física, mas pode dar-nos inteligência, sabedoria, coragem e perseverança para superá-las. Onde mais iriamos conseguir essas qualidades que antes não tínhamos? Contudo, concluímos que Deus não pode fazer tudo, mas faz coisas muito importantes para o nosso espírito. Tudo depende da nossa fé. É a partir dessa fé que inventamos um mundo mais seguro e mais humano para se viver.     

4 de janeiro de 2013

LER É MAIS IMPORTANTE QUE ESTUDAR

Quem disse essa frase: “ler é mais importante que estudar”, foi o cartunista e cronista Ziraldo (1932). Que na verdade é um hábito pouco comum em nosso meio diário. Para Ziraldo, quando se cria o hábito da leitura ganha em conhecimento e enriquece o vocabulário. Alguns estudos nessa direção nos mostram que os brasileiros ainda não descobriram o prazer na leitura e que ocupam o tempo livre, vendo televisão, ouvindo música, descansando e raramente se propõe a ler um livro, jornal ou um texto do seu interesse sobre determinado assunto.

Entretanto, quero aqui dedicar esse ensaio aos meus seguidores do blog, que de certo modo apreciam a boa leitura e gostam do que penso e escrevo. Conheço alguns dos meus leitores e sei o quanto estão preocupados com o mundo em que vivemos. Mesmo aqueles que não me conhecem e lêem os meus textos, os tenho como meus amigos. Através do blog, debatemos, questionamos e procuramos entender as questões emblemáticas da nossa sociedade e do mundo globalizado. Somos um grupo pequeno, mas temos objetivos claros e pontuais. Alguns não me conhecem pessoalmente. Outros foram meus alunos, professores colegas e outros tantos, amigos que foram aos poucos se juntando, identificando-se e consolidando com as nossas reflexões e proposta de uma vida mais consciente.

Estamos em uma época da história da humanidade na qual, mais do que nunca, uma das coisas mais importantes para nós seres humanos é aprender a aprender. Essa busca da palavra é uma procura dolorosa. Por conseguinte, é através de muita leitura que vamos melhorando e enriquecendo o nosso vocabulário e alargando o horizonte de conhecimento. Fico feliz quanto encontro adolescentes como a Kaira Galhardi Andrade, uma garota de 15 anos que adora ler e escrever. Ela fica fascinada ao entrar numa livraria, seus olhos até brilham de alegria e felicidade. Ela consegue passar esse prazer ao manusear um livro. É como se tivesse nos dizendo: "a leitura é um exercício de generosidade e crescimento intelectual. Através da leitura nos sentimos seguros porque alarga o horizonte do nosso conhecimento, além enriquecer o nosso vocabulário". Que maravilha se todos os jovens fossem assim como essa menina, seria uma delicia ser professor nos dias de hoje.   

Sinto e percebo que o nosso grupo no blog está se tornando um gigante em conhecimento e consciência crítica do seu papel na sociedade. São pessoas dispostas e abertas a mudanças. O desejo de conhecimento não é um instrumento passivo. Meus amigos leitores é preciso aprimorar a cada dia nossa maneira de cuidar de nós mesmos, das pessoas que amamos, dos outros seres humanos nossos semelhantes, de nosso planeta que anda tão carente de cuidados básicos.

Portanto, quero muito que, apesar dessas limitações inerentes ao que escrevo, possamos estabelecer um verdadeiro diálogo. Pois, são vocês o grande exemplo e a esperança de que um número ainda maior de pessoas venha descobrir esse mesmo prazer e gosto pela leitura. Quero agradecê-los pela companhia nessa aventura do filosofar, do pensar diferente. Contudo, aquilo que o escritor pede ao leitor não é a aplicação de uma liberdade abstrata, mas a doação de toda a sua pessoa, com suas paixões, suas prevenções, suas simpatias, seu temperamento e humor, sua escala de valores. Somente esse leitor se entregará com generosidade a essa aventura de lado a lado e juntos vão transformar as massas mais obscuras da sensibilidade humana.           

2 de janeiro de 2013

ENTRE O CÉU E A TERRA

Aproximadamente há dois mil e treze anos atrás apareceu um Homem, entre milhões de habitantes terrestres. E por ventura esse Homem veio tornar-se o centro da história da humanidade. Não fez descobertas nem invenções, não derrotou exércitos nem escreveu livros, esse Homem singular. Não fez nada daquilo que a outros homens garante imortalidade entre os mortais. O que nele havia de maior era Ele mesmo.

Pelo ano do seu nascimento datam todos os povos cultos a sua cronologia. Possuía esse Homem exímios dotes de inteligência e infinita delicadeza de coração. A sua vida se resume numa epopéia de divino poder e num poema de humano amor.

Havia na vida desse Homem uma pátria e uma família, mas também um exílio e uma solidão. Havia inocentes com o sorriso nos lábios e doentes com as lágrimas nos olhos. Havia apóstolos e apóstatas. Brincava nos caminhos desse Homem a mais bela das primaveras e espreitava-lhe os passos a mais negra das mortes.

Esse Homem vivia no mundo, mas não era do mundo. Quando chegou, não havia lugar para Ele na estalagem e quando partiu, só havia lugar numa cruz, entre o céu e a terra. Esse Homem não mendigava amor, mas todas as almas boas o amavam.

Era amigo do silêncio e da solidão, mas não conseguia fugir ao tumulto da sociedade, porque todos o procuravam. Irresistível era o fascínio da sua personalidade, inaudita a potência das suas palavras. Todos sentiam o envolvente mistério da sua presença, mas ninguém sabia definir esse estranho magnetismo.

Não bajulava a nenhum poderoso e não espezinhava nenhum miserável. Diáfano como um cristal era o seu caráter e, no entanto, é Ele o maior mistério de todos os séculos. Poeta algum conseguiu acompanhar a sua imensa sabedoria e sensibilidade. Filósofo algum chegou perto de tamanho conhecimento e grandeza espiritual.

Esse Homem não repudiava Madalenas nem apedrejava adúlteras, mas lançava às penitentes palavras de perdão e de vida. Não abandonava ovelhas desgarradas nem filhos pródigos, mas cingia nos braços a estes e levava aos ombros aquelas. Esse Homem não discutia, falava simplesmente. Não esmiuçava palavras nem contava sílabas e letras, como os rabis do seu tempo, mas rasgava imensas perspectivas de verdade e beatitude. Por isso diziam os homens, felizes e estupefatos: “Nunca ninguém falou como esse Homem fala!”

Portanto, para esse Homem não era no caixão o ponto final da existência, mas no berço para a vida verdadeira. Todavia, vivemos por Ele e para Ele os melhores dentre os filhos dos homens, porque adoram nesse Homem o homem ideal, o Homem DEUS. Esta reflexão, só vem a confirmar um sentimento que tenho: “quem somos nós para julgar?” E parece que esse é um dos grandes ensinamentos desse Homem chamado Jesus Cristo. A vida é sofrimento, diz o budismo. Contudo, ao julgar o meu próximo, estarei negando a sua dor e esterilizando o meu amor.           

UMA HISTÓRIA DE AMOR QUE SÓ O TEMPO ENTENDE

Vou dividir com você essa História de Amor, porque ela tem muito do que vivi nesses últimos anos e mais precisamente nos últimos meses. Até ...