30 de junho de 2020

O TEMPO COMO SENHOR DA RAZÃO

Dizemos comumente: “o tempo passa”, quando na verdade, o que é o tempo? Por que ele passa? Como ele passa? Passa para onde? Talvez para fugir da ideia de que nós passamos, envelhecemos e morremos, despistamos nossa consciência para a ideia de que é o tempo que passa. Comemoram-se aniversários, natais e passagens de ano, fazendo-se barulhentas festas como que para exorcizar de nós a ideia da enfermidade da vida; como que para enganar-nos com a ideia de que é o tempo (dias, meses, anos) que está passando. Quando na verdade, somos nós que passamos pelo tempo. A única certeza da existência do tempo são suas marcas que carimbam os nossos corpos, fazendo com que envelheçam até morrer.

Há um momento especialmente comovente no livro “Confissões” do teólogo e filósofo bispo de Hipona Santo Agostinho (354-430), em que ele escreve sobre o que é o tempo e argumenta: “Se ninguém me pergunta o que é o tempo, eu sei o que ele é. Mas, se me fizerem a pergunta e eu quiser explicar o que é o tempo, já não saberei o que dizer. Porque, segundo eu posso pensar que o tempo divino, não é o tempo humano. O tempo divino seria a duração pura, eterna, infinita, portanto, sem passado, presente e futuro. Ao passo que a primeira percepção que o ser humano tem do tempo, é de passado, presente e futuro”. E Santo Agostinho continua sua reflexão dizendo: “Mas é estranho nós pensarmos que o passado passou, não existe mais e que o futuro ainda não existe e que o momento presente é um movimento para o passado. Daqui a um minuto de ter afirmado o que estou dizendo agora, já será passado”.

Mais adiante continua Santo Agostinho: “no palácio da memória o homem fica maravilhado de perceber, o que existe é o presente das coisas passadas, o presente das coisas futuras e o presente das coisas presentes”. Isto ele falou a quatorze século antes de Sigmund Freud (1856-1939), no sentido de que é o passado que permanece na estrutura psíquica, na estrutura de alma, na estrutura de vida do ser humano. Esse é o presente das coisas passadas. No entanto, o futuro é projeto, desejo, planejamento, ou seja, é o presente das coisas futuras. Sendo assim, o presente das coisas presente é quando estou respondendo à paixão de viver em harmonia a vida que me foi confiada.

Prossegue o filósofo cristão os seus pensamentos sobre temporalidade, considerando esta última de um ponto de vista psicológico. Argumenta Santo Agostinho que tempo longo ou breve só o podemos afirmar do futuro ou do passado. Chamamos longo ao tempo passado, se é anterior ao presente. Por exemplo, como era a organização social há cem anos? Do mesmo modo dizemos que o tempo futuro é longo se é posterior ao presente. Por exemplo, como estará o mundo daqui a cem anos? Chamamos breve ao passado, se dizemos já faz dez dias, e ao futuro se dizemos, daqui a dez dias. Mas, como pode ser breve ou longo o que não existe? Com efeito, o passado já não existe mais e o futuro ainda não existe. Por isso que só podemos estudar o tempo do ponto de vista psicológico, isto é, o tempo tal como é dado ao ser humano percebê-lo com suas possibilidades mentais.

Portanto, essa realidade complexa chamada tempo, uma vez considerada na teia das nossas maquinações mentais, é da maior importância para a compreensão da vida e da historicidade da vida humana. Segundo o filósofo alemão Martin Heidegger (1889-1976), argumenta: “O tempo é o próprio tecido da existência”, pois, o “ser” ocupa um lugar no espaço e define sua realidade no fluir do tempo. Eis porque o tema da temporalidade se constitui em um dos pilares de sustentação da teoria da historicidade humana. E assim sendo, torna-se de todo indispensável que examinemos  as modalidades que a realidade tempo assume nas construções praxiológicas e metas-reflexivas do ser humano. Para nós seres humanos o tempo não pode ser mais do que aquilo que nos é dado apreender de sua existência. De modo que, encerro essa reflexão com a metáfora: “o tempo como senhor da razão”.

21 de junho de 2020

DO MITO DA CAVERNA AO WHATSAPP E REDES SOCIAIS

Em seu livro “Diálogos”, Platão (427-347 a.C.) apresenta o chamado “Mito da Caverna” como uma maneira de ilustrar a ignorância humana, frente à existência. Nessa narrativa, um grupo de seres humanos vivia acorrentado em uma Caverna, sendo que as únicas impressões que obtinham sobre o mundo exterior, eram as sombras das pessoas que transitavam pelo entorno. Sendo assim, acreditavam que as sombras que observavam era a própria “realidade”. Certa vez, um desses indivíduos conseguiu sair da Caverna. Ao retornar, informou aos demais que a realidade exterior era bastante diferente do que pensavam. No entanto, ele foi desacreditado pelos seus companheiros, que seguiram ingenuamente apegados às suas verdades sensitivas.

Séculos depois da clássica alegoria platônica, podemos afirmar que determinados grupos criados no WhatsApp e nas redes sociais, constituem-se em espécies de Caverna de Platão contemporâneo. Onde seus membros também possuíam as suas próprias verdades convenientes. O apego à ignorância e o receio de rever convicções são os mesmos de outrora. A diferença é que, atualmente, as antigas “sombras”, agora são conhecidas como “fake news”. Lembrando o pensamento de Friedrich Nietzsche (1844-1900), os membros de grupos de WhatsApp e redes sociais, estão mais preocupados em “crer” na verdade do que propriamente com a “legitimidade” da verdade.

De modo que, desde que uma determinada informação seja condizente com suas ideias, automaticamente será compartilhada nas redes sociais, independentemente de sua veracidade (aliás, isso é o que menos importa). Trata-se da prática designada por psicólogos como “viés da confirmação”: não se recorre a uma publicação para formar opiniões; mas para reforçar argumentos. As correntes que prendiam os membros da Caverna na alegoria platônica foram substituídas por aparelhos de celulares. Identificado por mim como coleira.

Como afirma ironicamente o geógrafo e educador Francisco Fernandes Ladeira que: “a terra é plana. O nazismo não é de extrema-direita. Leonardo DiCaprio está financiando queimadas na Amazônia. O kit gay foi distribuído em escolas na época de governos petistas. Não houve ditadura militar no Brasil. A Teoria da Evolução é cientificismo. A ideologia de gênero é ensinada em sala de aula por professores adeptos do marxismo cultural. E o Oscar (a premiação do cinema estadunidenseé uma estratégia da esquerda para dominar a educação e a cultura”.

Portanto, o indivíduo que questionar as postagens publicadas nas redes sociais, ou que propuser uma análise mais crítica sobre os fatos, não é apenas desacreditado (como foi o exemplo da Caverna de Platão). Ele é excluído do grupo, achincalhado nas redes sociais, caluniado e, não raro, pode ser alvo de violência física. Desse modo, a evolução dos meios de comunicação, responsável pela difusão de conhecimento em larga escala, também trouxe, como efeito colateral, a possibilidade de formação de novas bolhas ideológicas que permanecem presas a preconceitos e falsificações históricas e científicas. Os grilhões da ignorância insistem em nos rodear, seja na Grécia Antiga, seja no Brasil desde o início do século XXI. Platão ficaria surpreso com tamanho culto à estupidez. 

17 de junho de 2020

A VIDA É UMA PEÇA DE TEATRO E NÃO PERMITE ENSAIOS

Há um momento em nossa vida que acreditamos que tudo está sob nosso controle. Trabalhamos na carreira dos nossos sonhos. Parece que todo mundo é capaz de dominar uma dor, exceto quem a sente. Achamos que nossos filhos passam por uma adolescência normal, sem precisar de nós. Pura ilusão! Às vezes acordamos de manhã, nos sentindo completamente infelizes. Temos a sensação de ter sido um péssimo pai ou mãe. Sentimos completamente incapazes de compensar nossos filhos pelos anos de loucura a eles infligidos. Quem olha de fora acha que realmente nós temos tudo para ser feliz. Contemplamos a exuberante beleza da natureza, sentimos que estamos em comunhão com o mistério da vida. Quando olhamos para a beleza de uma criança ou idoso é a face visível de Deus que vemos.

Na luta diária nos convencera de que os outros tinham razão. A sensação de tristeza, confusão e desespero começaram a crescer como um fungo irritante em nossas mentes. Passamos a ser ríspidos com os outros. Perdemos a parte da cabeça que nos faz negar os fatos durante grande parte da nossa vida. É o que chamam de insanidade temporária. Aquela parte de nós que continua a se preocupar, que vive na dúvida, que é cheia de receios, que julgam os outros que tem medo de confiar, que precisa de provas, que acredita apenas quando lhe convém, que não consegue dar continuação às coisas, que se recusa a praticar o que prega e que precisa ser salvo, que quer ser vítima, que dá verdadeiras surras no “Eu interior”, que precisa estar certo o tempo todo e que insiste em se agarrar àquilo que não funciona.

Estranho seria olhar para essa parte nossa que se apresenta e não reconhecer que é nesse coração, nesta vida, que habita a melhor parte de nós. Sendo que uma parte de nós é todo mundo; a outra parte é ninguém, pelo menos que o conhecemos. Há uma outra parte que anda por aí entre a multidão. Que se revela estranha para nós e que a chamamos de solidão. A parte nossa que se apresenta, pesa, pondera, enquanto a outra parte delira e se espanta com a nossa reação. Às vezes somos permanentes e a outra parte de nós nos surpreende de repente. Somos vertigem enquanto a outra parte é linguagem. Como diz o poeta e ensaísta brasileiro Ferreira Gullar (1930-2016): “Traduzir-se uma parte na outra parte, que é uma questão de vida ou morte, será arte?”.

Portanto, a vida é uma peça de teatro que não permite ensaios. Por isso, cante, chore, ria e viva intensamente, antes que a cortina se feche e a peça termine sem aplausos. Com o tempo, nós percebemos que para ser feliz com outra pessoa, precisamos em primeiro lugar, não precisar dela. Percebemos também que aquele alguém que amamos pode ser definitivamente a pessoa da nossa vida. Porque só o amor faz as pessoas evoluírem espiritualmente. A capacidade de sentir amor é que faz a pessoa melhorar como ser humano. Tem coisas que atravancam a nossa vida e aquela parte de nós consegue superar aquele desencontro. Porque só o amor vai nos fazer melhor. O segredo é não correr atrás das borboletas e sim cuidar do jardim para que elas venham até nós. Contudo, no final das contas, essa parte de nós vai achar não quem estamos procurando, mas quem está nos procurando. Aquela parte de nós sabe onde encontrar a parte que nos completa. Abram-se, algo muito maior do que pensam está acontecendo em nós. 

14 de junho de 2020

UM MUNDO EM RÁPIDO PROCESSO DE EXTINÇÃO

Uma pequena olaria, um centro comercial gigantesco. Um mundo em rápido processo de extinção, outro que cresce e se multiplica como um jogo de espelhos onde não parece haver limites para a ilusão enganosa. Este romance fala de um modo de viver que vai sendo cada vez menos o nosso e assoma-se à entrada de um “Admirável Mundo Novo” cujas consequências sobre a mentalidade humana são cada vez mais visíveis e ameaçadoras.

Foi uma alerta incomensurável feita pelo ilustre ganhador do Prêmio Nobel de Literatura em 1998, José Saramago. José de Sousa Saramago (1922-2010) foi um importante escritor português, que também ganhou em 1995, o Prêmio Camões, o mais importante prêmio da língua portuguesa. Dizia ele com certo pessimismo em relação aos humanos: “todos os dias se extinguem espécies animais e vegetais, todos os dias há profissões que se tornam inúteis, idiomas que deixam de ter pessoas que os falem, tradições que perdem sentido, sentimentos que se convertem nos seus contrários. Fim de século, fim de milênio, fim de civilização”.

Portanto, uma família de oleiros compreende que deixou de ser necessária ao mundo. Como uma serpente que despe a pele para poder crescer noutra que mais adiante se há de tornar pequena, o centro comercial diz à olaria: “Morre, já não preciso de ti”. Em A Caverna José Saramago enfrenta-se ao processo acelerado de desumanização que estamos vivendo. Com os dois romances anteriores – “Ensaio Sobre a Cegueira e “Todos os Nomes - neste ultimo livro, forma uma trilogia em que o autor deixou inscrita a sua visão do mundo atual, da sociedade humana tal como a vivemos. Não mudaremos de vida se não mudarmos a vida.

COM NOSSA VAIDADE SUFOCAMOS A HUMILDADE

Vivemos em tempos de modernidade líquida, nada é feito para durar muito, nem mesmo as amizades. Nós não consertamos mais coisas, assim como não consertamos mais relações humanas, nós trocamos. A vaidade é o preço maior que pagamos para qualquer coisa. Nós não compartilhamos mais dores e fracassos, pelo contrário, bloqueamos qualquer um que se atreva a nos contrariar no “Facebook” ou no “Whatsapp”. Julgamos o outro com facilidade, com sorriso no rosto e mostramos uma imagem falsa, de uma vida feliz. Ao trocarmos de carro, de computador ou de pessoas que amamos por outras, vamos substituindo a dor do desgaste pela vaidade da novidade. Ao trocar alguém creio, imediatamente tornamo-nos pessoas mais interessantes aos olhos do novo. E não percebemos que aquele espelho, continua sendo o drama da nossa vaidade.

Todavia, o que não toleramos na pessoa anterior é que ela nos mostrou o quanto estamos decaindo, envelhecendo e que não somos mais interessantes para ela. E na nova pessoa, exploramos o quanto queremos ser interessante. É triste constatar que o nosso mundo hoje tenha eliminado a humildade como virtude. É fascinante, por exemplo; que aceitamos todo e qualquer elogio, porque dentro de nós, segundo os místicos medievais, há um demônio da vaidade esperando por elogios. Aquele que acredita no que não pode ser acreditado. Como Lúcifer um dia, acreditou que podia ser igual a Deus. Apesar de saber que um Arcanjo criado, jamais poderia ser igual a Deus. Ou seja, repetimos e é aqui que a natureza humana entra: “O pecado de Lúcifer”.

Entretanto, brigamos permanentemente por esse “Ego” insaciável. Vale lembrar os budistas, que centraram fogo nesse ego que nos corrói por dentro. Porque nós preferimos ser perseguidos, a ser ignorados. Preferimos tudo, menos não ser visto e elogiado, porque viver hoje é ser visto. Senão fotografar onde estivemos e o que estamos fazendo, de nada valeu a nossa estadia. Ver é viver. E ser visto é ter a certeza que vivi. Se o homem escolher, poderá saber que tudo aquilo que parece fazer bem aos outros é na verdade, um engano de vaidade. De modo que, a todo instante a nossa vaidade é testada. E como não gostamos de dizer que somos vaidosos, nós a desfazemos através de recursos, fazendo-se passar por humildes e simpáticos a todos que nos rodeiam. De modo que, acabamos sustentando esse grande vicio que é o da vaidade. As pessoas não estão sempre iguais, ainda não foram terminadas. Mas que vão sempre mudando. Afinam ou desafinam. O que nos determina é o que a vida nos ensinou.

Portanto, temos que nos conformar que a vaidade seja uma instituição, que a vaidade esteja presente entre nós permanentemente. Temos que aprender a lidar com ela, para não ficar com falsas humildades. Temos que aprender, que sempre haverá alguém mais hábil, melhor e acima de nós. A única maneira de não ser vaidoso e pensar apena em nós, é parar de nos comparar com os outros, ou seja, devo pensar somente em mim. Isto é uma redundância. Por conseguinte, não tem saída jeitosa para nós humanos, estamos todos isolados. Nos momentos que o meu “Eu” é reconhecido e dialoga com os outros. Chamamos a isso de encontro, amizade, namoro ou casamento. E nos momentos que não dialoga, que ninguém se escuta e não se entende, chamamos a isso de encontro, amizade, namoro ou casamento. Contudo, no meio desta dialética, nós tratamos então, do pecado, do erro, do vício e da vaidade. Concluo com uma frase que gosto muito de João Guimarães Rosa (1908-1967), do seu livro: “Grande Sertão Veredas”: “Amigo para mim, é só isto: é a pessoa com quem a gente gosta de conversar, do igual o igual, desarmado. O de que um tira prazer de estar próximo do outro. Amigo, é que a gente seja, mas sem precisar saber o por que é que é”.

9 de junho de 2020

NINGUÉM É FELIZ O TEMPO TODO

Demora, mas vem. Depois do encontro, da festa, do êxtase, das delícias em fila, dos sentimentos em fartura, da esperança vigorosa, da promessa de felicidade, do amor em seus indícios, da saudade e seus inícios, depois de tudo isso, quase sempre vem a tristeza nos fazer companhia. Uma fria e descabida tristeza que sempre vem.

No fim de tanta alegria perfeita dá as caras uma dura, cruel e implacável sensação de desalento. Depois das emoções superlativas vem um quase nada, um vazio dolorido, uma luz amarela, abatida, luzindo acanhada pela fresta da porta, como quem espia um estranho, o quarto do homem sozinho que tropeçou em seu amor iluminado pelo sol e morre de medo do escuro.

De vez em quando me acontece de ser triste. Vai ser assim para sempre? Como diz o jornalista e publicitário André Gomes: “é da vida e não precisa ficar triste por isso”. Depois passa é verdade. A angústia e a tristeza visitarão nossa alegria de quando em vez, como velhos vizinhos indesejados cobiçando nossa amizade, nossos bens maiores e nossos afetos. Então seremos como dois soldados em guerra contra o que nos ameaça, protegendo as costas um do outro.

Como dizia o filósofo, escritor e teólogo judeus Martin Buber (1878-1965): “seguiremos assim até voltarmos a ser nada senão Eu e Tu em nosso ontem, nosso hoje e nosso depois de amanhã”. Cabe acrescentar, perdidos em nosso caminho certo, seguindo honestos nosso rumo escolhido, cuidando de nós, tratando dos nossos. Vivendo o amor em sua longa e linda e eterna imperfeição.

Portanto, essa coisa de não ter felicidade o tempo todo, se passa com todo mundo. Vira e mexe passa com aqueles que estão entre nós. E quando nos faz tristes, nos mostra o quanto podemos ser muito, mais muito mais felizes. É só uma questão de serenidade e sabedoria, para perceber que a felicidade está dentro de cada um, basta olhar para dentro de si mesmo.

1 de junho de 2020

COM A MATURIDADE VEM A SERENIDADE

Vivemos uma grande transformação de costumes, são novos paradigmas surgindo como uma proposta de vida plena. O valor da espiritualidade, do autoconhecimento, do afeto, a alegria e a liberdade de ser e se exprimir é o que anuncia como qualidade para o viver bem e com dignidade. Mas, se não temos estudos profundos e suficientes sobre o próprio envelhecer, se a sexualidade somente nas últimas décadas deixou de ser negado, então, o que dizer da sexualidade e qualidade de vida na terceira idade? Muitas vezes nos atemos a costumes para dizer que é assim mesmo. Entretanto, são tantas as realidades que compõem a verdade que podemos observar no dia a dia. Pessoas explorando pessoas e as matando de todas as formas. Desde a indiferença até a morte física.

Por outro lado, os estudos mais recentes são animadores para essa geração da terceira idade. Não é necessário envelhecer como estamos fazendo, evidentemente, considerando naturais as doenças próprias da maturidade e mudanças fisiológicas que ocorrem em nosso corpo com o passar dos anos. Tendo em vista, que o mundo ocidental não reconhece o sexo como modo experiencial de evolução da própria espiritualidade quando afirmamos que é nos braços do ser amado que encontramos o paraíso, que os beijos dos amantes nos conduzem às esferas celestiais e que a perda da pessoa amada nos faz conhecer a condição de alma penada. E para sentir isso não tem idade. A epiderme, ou seja, o contato com a pele é gostosa em qualquer idade. O corpo humano é um complexo laboratório de reações química, sem falar do DNA que se une ao outro DNA, em função de um terceiro DNA. Mas também pode ter como finalidade o crescimento e a prosperidade no amor que surge dessa união. É bom lembrar, que é o DNA que escolhe o nosso par. A chamada química. Somos movidos e atraídos por essa força.   

Entretanto, as vantagens da terceira idade estão no campo afetivo. É na experiência do amor que ascendemos igualmente ao sublime e ao medonho. E é no sexo amoroso, em qualquer idade, mas, principalmente na terceira idade que conhecemos a eternidade, dentro da própria temporalidade. O sabor da vida, o prazer verdadeiro, o encontro do meu Eu divino no outro, a troca de corações, cada um se apossa do coração do outro, numa atitude de cuidar e preservar o amor. Como dizia os antigos: “se você quer ser feliz, não se case. Se você quer fazer o outro feliz, então se case”.

Na terceira idade dispensa as preocupações que teria um jovem quanto a sua sexualidade. Na maturidade o sexo é a própria vivência da alegria e da beleza e o encontro é na sua totalidade uma grande caricia que envolve o corpo, o psiquismo e a alma. Neste encontro ambos vivem a certeza do amor pleno. Nesse estagio de maturidade, passa a pensar com o coração, a fazer sexo amoroso com o corpo todo e com a mente possuída pela divindade. Pois na plenitude do prazer de se encontrar, experimentar o paradoxo e o milagre da vida, do nascimento e da morte. Cada encontro é um renascer. Cada orgasmo é um morrer. Quem sabe a respeito dessa maturidade, pouco fala, só quer sentir.

Portanto, é com a experiência e com a maturidade, que passamos do processo jovem da segunda idade, onde somos criativos e produtivos, para o processo maduro de introspecção e sabedoria existencial. Com a maturidade também vem à serenidade, a paciência histórica e o bom humor. Contudo, a relação madura é marcada pela alegria e felicidade a cada encontro, onde os gestos dizem mais que as palavras. A experiência sexual amorosa na terceira idade é consciente e madura, integrada e ao mesmo tempo sensorial e biológica, mental e psicológica, sensual e espiritual, carregada de generosidade e de muita sabedoria. Estado pleno de crescimento, que vai do físico ao espiritual. Há um provérbio oriental que diz: “Se mergulhas e não encontras pérolas no fundo do rio, não pensem que elas não existem”. Tal é a arte de viver e de morrer. Que o sexo amoroso e o amor pleno, na maturidade por si só, parecem saber do poder de cumplicidade que domina.   

POEMA INSTANTE DO POETA JORGE LUÍS BORGES

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ...