30 de setembro de 2012

ECOLOGIA, A CASA DA VIDA

A palavra Ecologia é derivada do grego oikos, que significa ”casa“ e, ”logos“ que significa estudo. Entretanto, juntando as duas palavras gregas e fazendo a tradução etimológica para o português que quer dizer: ”estudo da casa“. No sentido mais amplo, pode-se considerar o termo casa como todo o ambiente terrestre; a palavra ecologia, então passa, a se referir ao estudo do ambiente. Vamos então refletir sobre essa Casa Ambiental.

Todavia, nunca em nenhum momento da história, a questão ambiental esteve tão em evidência aos olhos da civilização humana, como está atualmente. O que justifica essa mudança tão repentina? Para uma espécie que, na sua relação com a Terra, acostumou-se a retirar dela o que precisava para sua existência material, cultural e porque não dizer simbólica.

Será ética e verdadeira a nossa paixão pela Terra, pelos outros seres vivos, incluindo nossos semelhantes? Na verdade, estamos falando de solidariedade universal, do respeito ilimitado a todo o organismo vivo que anima esse Planeta. Existe de fato responsabilidade frente às consequências dos nossos atos e do cuidado que se caracteriza como uma relação amorosa, carinhosa, de ternura, bondade e amabilidade perante as coisas e as pessoas da nossa Casa Comum, que é esse Planeta.

Na verdade, somos seres que vivem na pele dessa pérola chamada Terra. Então, me intriga pensar nessa forma de amar a Natureza. Seria, pois uma paixão e não um amor a Terra, no qual o que está em questão é se estamos sendo prejudicados ou não nessa relação? Nosso eco paixão é um estado de satisfação individual?

Entretanto, somente os apaixonados saberão a intensidade da analogia que me proponho a fazer. No estado de paixão nos apossamos do outro como objeto que, em alguma medida, nos pertence e usamos ou somos usados por ele. É um jeito de gostar intenso e de adoecedor o outro. Quando amamos verdadeiramente, queremos ver o outro bem e feliz. Ocorre-me pensar que num estágio patológico, de gostar do outro, sua destruição também nos satisfaz. Isso é gozo e não desejo, ou seja, o outro lado do mal. Quantos relacionamentos sofrem dessa inversão afetiva, isto é, do amor ao ódio e a descoberta do não amor, da indiferença. Nas nossas almas, onde moraria esse amor à oikos, nossa Casa Terra? Vivemos humanamente na Casa Comum a todos? Parece que nosso discurso teórico está desconectado da pratica. Falamos mais do que fazemos.

Portanto, compaixão seria entender e dividir o sofrimento do outro. Estaríamos dispostos a ter compaixão pela Terra que hoje está adoecida, pelos pobres, pelos miseráveis e famintos do mundo? Contudo, encerro essa reflexão, deixando o seguinte pensamento. Será que a forma de como nos relacionamos com a nossa Casa, com nossa maneira de morar nela e de nos relacionarmos com os nossos semelhantes e seres de outras espécies, realmente está correta? Vamos juntos pensar nisso?  

27 de setembro de 2012

O PROBLEMA DA ANGUSTIA

A ideia de que vamos deixar de existir um dia, nos assusta e traz um desconforto enorme, pois essa consciência do nosso fim é que produz angústia. Na entanto, o centro da personalidade humana é a angústia. Uma sensação de impotência e vazio diante da vida. Minha saudosa mãezinha usava a palavra vertigem sempre que ficava nervosa por alguma coisa. Uma terminologia que designa um sentimento de angústia, de insegurança.

Evidentemente, que a minha mãe não compreendia o significado que carregava essa palavra, mas o fato é que ela sentia. Pois, imediatamente esboçava uma reação de tristeza e repudia a tudo que estava a sua volta. Ela tinha uma sensação clara de medo e pavor. Só não sabia explicar. Nunca pude entender muito bem esse sentimento. Todavia, angústia deriva do latim e quer dizer apertado, estreito. É aquele aperto que sentimos na região do tórax, parece que o canal da respiração fica estreito.  

Algum tempo atrás lendo o filósofo dinamarquês Soren Kierkegaard, é que pude compreender numa de suas citações a palavra “vertigem da liberdade”. Ele foi capaz de perceber as transformações socioculturais do seu tempo. Fez uma analise profunda da angústia que continua ainda hoje após ter passado mais de cento e cinqüenta anos de sua morte. A angústia do homem contemporâneo tem muito em comum com a angústia tratada por Kierkegaard nas suas obras.

A ansiedade ou a angústia são praticamente da mesma família. É um medo disperso, fora de foco. Para entender melhor esse conceito, vamos usar o exemplo de uma pessoa na beira de um precipício. Quando essa pessoa olha para baixo ela experimenta um medo mórbido de cair, mas ao mesmo tempo, ela sente um grande impulso de se atirar intencionalmente para o precipício. Essa experiência de dupla sensação é a ansiedade devido a nossa completa liberdade para escolher saltar ou não. O mero fato de alguém ter a possibilidade e liberdade de fazer algo, mesmo os mais aterrorizantes, desencadeia um imenso sentimento de angústia, que Kierkegaard denominou isto de “vertigem da liberdade”.

A escolha de Adão em comer da árvore do conhecimento, proibido por Deus. Pelo fato dos conceitos de bem e de mal não existirem antes de Adão comer o fruto da árvore, considerado o pecado original, Adão não possuía estes dois conceitos, não sabendo que ao comer do fruto da árvore que era considerado um mal. O que ele sabia era que Deus lhe tinha dito para não comer daquela árvore. A angústia vem do fato da própria proibição por parte de Deus, tendo em vista que Adão era livre e que poderia escolher obedecer ou desobedecer a Deus. Depois de Adão ter comido da árvore do conhecimento, o pecado nasceu. Então, para Kierkegaard, a angústia precede o pecado e foi à angústia que levou Adão a pecar.

Todavia, a angústia informa-nos das nossas possibilidades de escolha, do nosso autoconhecimento e responsabilidade pessoal, levando-nos de um estado de imediatismo não autoconsciente a uma reflexão autoconsciente. Uma pessoa torna-se verdadeiramente consciente do seu potencial através da experiência de angústia. Entretanto, a angústia pode ser uma oportunidade para a prática do pecado, mas pode também ser o caminho para o reconhecimento ou realização da identidade e liberdade de cada um. Lembrando sempre que uma pessoa no estado alterado de angústia é movida pelo desespero, que a leva fazer loucuras sem pensar nas conseqüências de seus atos.

O ser humano está perdido na sua subjetividade e faz basicamente o que pode para sobreviver. Ninguém pode dizer que é bem resolvido, caso conheça alguém assim, mantenha distância dessa pessoa. Por exemplo, se eu tenho fé num Deus que na realidade não precisa de mim. E se alguém acha que Deus precisa de nós, então essa pessoa está com problema. Se Deus precisa de nós realmente ele não é Deus, porque precisa de um mortal para não se entediar. Que Deus é esse? Por outro lado, se Deus não existe, então nós somos fruto do nada? Por conseguinte, na realidade somos meio livres porque a rigor não temos significado nenhum. Deus não depende de nós, somos nós que dependemos dele. Nesse sentido, somos filhos do nada, fruto do acaso. Logo tanto faz, nada tem mais sentido para nós. Quando começamos a pensar assim, a olhar o mundo com essa perspectiva lógica de raciocínio, sentimos um abismo diante de nós, um vazio, isto já é a angústia.

Kierkegaard, vai dizer que existe três formas de enfrentar a angustia para ser feliz, ou seja, para sobreviver e não se entediar. A primeira é o que ele chama de estagio estético, seria nós acharmos que vamos escapar da angustia sendo felizes comprando coisas, viajando muito, curtindo noitadas em busca da fantasia, comendo e bebendo exageradamente, é no consumismo que se realiza o estagio estético. Não funciona, chega uma hora que entramos em desespero e isso tudo não faz mais efeito e ai mergulhamos na angústia. A segunda forma é o estagio ético. Achamos que somos bons, acreditamos que fazemos tudo que é bom para agradar a todos. Uma pessoa politicamente correta. É aquele que vive dizendo sou uma pessoa ética e luto pela moralidade e os bons costumes. Também não funciona, vai cair na angústia num dado momento da sua vida. O terceiro e ultimo, é o religioso. Kierkegaard, divide em dois grupos. O religioso um, é aquele que acha que vai fugir da angústia seguindo a doutrina religiosa pura e simples. Que vai viver de acordo com a doutrina cristã, mais uma hora a angústia vai lhe comer por dentro. O religioso dois, é aquele que desiste de ser feliz aqui na terra, de se achar legal, de ficar imitando como alguém poderia fazer para ser um bom cristão. Essa pessoa desiste de tudo isso e aposta somente em Deus. É pessoa resignada, que espera em outra vida. Isso também não funciona, porque não vai encontrar nenhuma forma de vencer esse profundo sentimento de tristeza, de vazio, de tédio e angústia, que o ser humano sente quando olha para si mesmo. Não é desistindo de ter prazer na vida que vamos encontrar a felicidade eterna. Sentir prazer é na realidade não ser escravo do desejo.

Portanto, é muito difícil manter autoestima quando o ser humano é mortal, envelhece, fica doente, perde quem ama, não sabe muito bem qual rumo a tomar na vida. Tudo isso é muito complicado para a preservação da autoestima, por conta da tradição judaico-cristã que implantou a teoria do pecado no mundo. O fato de ficarmos provando e projetando o tempo inteiro a ideia de que damos certo e, que é nossa obrigação ser feliz, só vai aumentar cada vez mais o numero de remédios que temos que tomar. Contudo, ao colocarmos limite nos desejos é que podemos encontrar uma ponta de felicidade nesse abismo que criamos.

22 de setembro de 2012

MEDO OU CORAGEM DE SER FELIZ?

Em determinada circunstância o medo pode inibir a nossa coragem de ser feliz, de arriscar a viver um grande amor, pelo simples fato da nossa educação apontar para a sexualidade como algo pernicioso. De certo modo, o fenômeno amoroso está relacionado ao sexo. Segundo nossos costumes, isso não pode porque é indecoroso. Proibimos demais e de repente essa energia vital explode, gerando uma neurose de angústia.

No entanto, a maioria das relações amorosas e sexuais praticada hoje no mundo é basicamente falsificada ou fingida, justamente por esse principio moral. Toda relação amorosa que implica sexo antes do casamento não pode. Contudo, vivemos uma relação de amor e sexo muito contida. Com medo de tocar o corpo do outro e ser tocado na mesma intensidade. Pois a falta de coragem inibe a minha intimidade com a pessoa que amo, aquele momento prazeroso de um brincar com o corpo do outro. O medo de acariciar esse corpo, como se fosse o playground das minhas fantasias no momento do encontro. Esse brinquedo gostoso e tão prazenteiro que é o nosso corpo, a nossa pele. 

Podemos comparar esse momento como uma revelação divina, da qual não sabemos muito bem o que fazer, e ao mesmo tempo ficamos com medo e perplexo com tamanha felicidade que experimentamos. Parece-me ser o nosso papel como seres humanos buscarmos sempre aprender a amorosa gentileza, principalmente quando estamos encantados por alguém. Aprender a amar e a ser gentil está intimamente relacionado ao sentido do toque, que seria muito benéfico para a nossa humanização. Dar mais atenção a necessidade de experiências táteis, sentida por todos nós.  No entanto, a nossa sexualidade de certo modo é colocada de lado, ignorada como se ela não fosse importante para a manutenção da nossa existência.

Entretanto, o amor e a humanidade começam onde começa o toque, o contato físico, naquele intervalo de poucos minutos que se seguem ao nascimento. Ao chegarmos a esse plano físico, somos prontamente amparados pelo aconchego do toque epidérmico. A comunicação que nos é transmitida no momento do nascimento através do toque constitui o mais poderoso meio de criar relacionamentos humanos, como fundamento da nossa experiência. Capaz de ampliar nossa valorização do outro e do mundo em que vivemos e acima de tudo, de aprofundar nossa compreensão em ralação a eles.

Todavia, essa experiência do nascimento parece que teve um efeito colateral. Com o crescimento da indiferença ou o medo que sentimos do outro, vem surgindo uma nova raça de intocáveis. Tornamo-nos estranhos uns aos outros, não só evitamos todas as formas de contato físico ou carícias, como ainda vivemos precavidos contra essas pessoas. Somos mais um no meio dessa multidão sem rosto, entre esse amontoado de figuras anônimas, solitárias e temerosas de intimidade. Estamos todos diminuídos na mesma extensão. Devido o fato de sermos todos intocáveis, não conseguimos criar uma sociedade em que as pessoas se abracem e se toquem com admiração e respeito.

Portanto, quanto mais civilizado, mais distante e frio o ser humano permanece. Sobretudo, porque estamos cercados o tempo todo daquilo que mais desejamos e ninguém ousa se apropriar. Parece que ninguém tem a coragem de viver esse encontro com a divindade, através do outro. Estamos todos doentes por falta de proximidade, de abraços e trocas de carícia, extremamente fundamental para a nossa felicidade tântrica. Caminhamos a passos largos em direção destrutiva da espécie humana. Não nos juntamos em ação comum em defesa da vida de todos nós, tão ameaçada por tantos perigos. A pergunta é: por que nos afastamos tanto assim uns dos outros? De que doença sofremos? Por que negamos esse amor? Quanto mais educados, mais distantes e separados estamos. Contudo, amor não é o que faz a gente feliz. Amor é o que faz a gente se sentir vivo. Porque, o amor é o símbolo da nossa própria existência.  

20 de setembro de 2012

CONVIVER COM AS CONSEQUÊNCIAS

A vida tornou-se complicada para o ser humano, pelo simples fato de ter que conviver com as conseqüências de suas ações e decisões. Sobretudo, porque fazemos escolhas a todo o momento em nossas vidas. Até mesmo o fato de não escolher, já é uma escolha. Escolhemos sair ou ficar em casa num final de semana, assim como terminar um trabalho hoje ou deixar para amanhã. O fato é que as escolhas tem as suas conseqüências. Seja qual for a minha decisão ela vai trazer alguma conseqüência, para a minha vida futura.

Entretanto, o que precisamos avaliar é que ao decidirmos seguir um caminho, realizar um sonho ou conquistar uma meta, até mesmo mudar de profissão, certamente ira pagar um preço por isso. Muitas pessoas agem movidas pelos seus impulsos, sem uma reflexão apurada sobre as conseqüências de seus atos ou escolhas. Só vamos dar conta depois da ação concluída.

Não quero aqui fazer nenhum juízo de valor, tampouco julgar a escolha de cada um. Mas apenas mostrar que os fatos da natureza seguem uma ordem lógica natural. Por isso é importante refletir muito antes de agir, para ter menos aborrecimento no resultado final. Estar consciente das conseqüências, como nos ensina o budismo, testar todas as coisas e cada idéia ou pensamento, examinar cuidadosamente o mundo que nos cerca, isto é, conhecer em vez de querer acreditar ou esperar. Buda nos ensinou que grande parte do sofrimento tem origem em nosso pensamento e comportamento, somos influenciados pelos desejos: de poder, bens materiais, fama, ciúme e raiva. São fontes de sofrimentos causadas por apego a essas sensações. A obsessão humana com as aparências e com o que as pessoas pensam a seu respeito também são fontes de sofrimento. Por isso a importância de pensar e refletir muito sobre nossas ações. Quando agimos pela emoção, na certa perdemos a razão.
 
A conseqüência da ação do tempo e de nossas escolhas torna-se evidente porque há uma consciência do sofrimento e dos nossos limites, que é percebido e sentido no corpo. Pensando bem a vida para o ser humano é inviável por tudo que ela nos causa de dor e sofrimento. A própria idéia de um ser humano feliz é um contra senso. Não há possibilidade de felicidade sem pensar no sofrimento. Na verdade, a vida material para o ser humano é inviável, uma hora ela acaba, ou seja, vamos morrendo aos poucos. É o apego a matéria que causa o sofrimento e dor, de que fala o budismo. 
 
Todavia, a vida pode ser para nós uma batalha perdida, do ponto de vista biológico. Basta olharmos para o nosso corpo hoje, para que comprove a ação do tempo. Isto para nós mortais tem uma conseqüência dolorosa do ponto de vista estético. Por outro lado, existem pilhas de estudos sobre o comportamento humano, falando das conseqüências graves geradas pela falta de solidariedade e da amizade, do companheirismo e do compromisso com a vida.

A idéia de que o ser humano é o sujeito da história passa por uma corrente de pensamento européia denominada “Humanismo”. Para o Humanismo, o ser humano deve ser valorizado acima de tudo; deve estar no centro das preocupações sociais.

Entretanto, o ser humano surgiu através de uma genealogia lenta, passando pela filosofia e algum tempos depois pelas ciências humanas. Paralelamente ao seu surgimento apareceram os hospitais públicos, as penitenciárias, as necessidades de leis para a punição de infrações, a desigualdade social, a tirania e a violência. Todos esses elementos, somados ao desenvolvimento da Medicina, Psicologia, Psicanálise e a Sociologia. Contudo, a concepção que hoje temos do ser humano é, de um sujeito racional, capaz de pensar por si mesmo, de tomar decisões, de agir por conta própria, de analisar o mundo ao seu redor. 
  
Portanto, não compreendo os mistérios da vida e nem suas razões. Só espero estar certo no que penso e sinto. Que é continuar a cultivar esse amor que tenho, pelo meu próximo. Penso um mundo melhor para todos nós. Talvez, então nesse dia, o ser humano inverta os seus valores atuais e coloque ordem nesse planeta que é a nossa morada. Que possa olhar para o seu semelhante com respeito e admiração, e finalmente como conseqüência desse gesto sublime, todos poderem conviver em Paz e Harmonia. Só assim teremos um mundo mais humano e feliz.

19 de setembro de 2012

A MORTE DA NOSSA COTIDIANIDADE

A cada dia que vivemos é um dia a menos que temos para viver. Porém, a nossa consciência do viver é contínua e eterna. Não aceitamos a idéia de envelhecer e morrer, embora seja um fenômeno evidente na natureza das coisas. Estamos geneticamente programados para a extinção, só não sabemos quando essa passagem ocorrerá. A ação do tempo é implacável no cotidiano da espécie humana. Todavia, a nossa situação atual exige um pensar profundo. Afinal, o que significa pensar? Qual é o sentido do pensar?

Muitas vezes confundimos o pensar com o exercício do estudar. Entretanto, são duas atitudes completamente diferentes. Estudar é um trabalho intelectual sobre um determinado assunto ou um tema proposto. Demanda concentração e muito desejo de aprender, tendo em vista, que aprender não é um instrumento passivo. Nesse sentido, afirmamos que estudamos quando lemos um texto e o compreendemos, depois o recordamos, sintetizamos e o expomos. Isso certamente é estudar, mas não pensar filosoficamente.

Pensar é refletir. Refletir é como que um ruminar, um voltar sobre as coisas. Por isso, são poucos os que pensam e muitos os que memorizam ou acumulam mecanicamente determinadas informações. Não usa a sensibilidade, a criatividade e, sobretudo, não usa a intuição que é a própria manifestação do pensamento sobre os acontecimentos da nossa existência, ou seja, não cria e nem descobre algo novo. Criar é tirar do nada algo, que não é perceptível num olhar superficial, requer um olhar profundo, um olhar analítico e filosófico.

O começar a pensar supõe sempre em desprendimento no qual podemos dominar a crise que nos abate. A crise, que em grego procede do verbo “krincin”, indica mais distanciar-se do que julgar. É necessário esse distanciamento, afastar-se da vida cotidiana para poder pensá-la de fora e assim compreendê-la.

O cotidiano é antes de tudo, a organização diária da vida, a repetição e reiteração das atividades. É a divisão do tempo e do ritmo com que se desenvolve a história pessoal de cada um. No cotidiano as coisas, as ações, as pessoas, os momentos e toda a circunstância que nos cercam, são dados aceitos como algo conhecido. Tudo está ao alcance das mãos e por isso se considera a realidade como um mundo próprio.

A cotidianidade é uma espécie de tirania de um poder impessoal, anônimo que impõe a cada individuo seu comportamento, seu modo de pensar, seus gestos, suas crenças. O mundo cotidiano é o mundo do familiar. É a partir desse horizonte que compreendemos o mundo, as pessoas e a nós mesmos. Todos têm esta compreensão pelo simples fato de sermos seres humanos, de existir. Mas esta compreensão familiar da realidade é um obstáculo para o pensar filosófico.

Para esse pensar é necessário sair do mundo do cotidiano. Este sair do mundo familiar, o estar fora do óbvio, do herdado, do cotidiano recebido pela tradição é o que os filósofos gregos chamavam o admirar-se. A admiração não é olhar distraidamente as coisas que nos rodeiam. Não é também o surpreender-se com as novidades diárias, porque estas novidades sempre estão presentes no âmbito do cotidiano.

A admiração supõe uma estranheza, um olhar diferente ao mundo do cotidiano. Como um camponês que chega a cidade e sente-se estranho a ela. Como o poeta que olha para uma coisa e vê outra. Por exemplo, os peixes para mim, são objetos oníricos, quando os vejo na lagoa eles me fazem sonhar. Esta atitude nasce quando nós admiramos e olhamos com o coração a nossa realidade diária. O ser humano não é seus atos transitórios, ele é a sua atitude permanente. A inteligência quando divorciada do espírito, é uma porta aberta para um universo de maldades. Quem olha o outro com a inteligência, o olham com superioridade e egoísmo. Quando olhamos com o espírito é um olhar de compaixão e vemos um ser humano, aquele que é capaz de transformar a nossa vida, dando um sentido a ela. Porque só o amor constrói.

Portanto, o pensar filosófico é sair do cotidiano e analisá-lo de fora, para não morrer nele. É deixar a vida irradiar luz e, contudo, ressaltar o nosso brilho. Sair da morte da cotidianidade para dar um pouco mais de sentido a nossa existência.  Viver profundamente é preciso sentir a essência da vida em cada vivente.  Para sentir, tem que pôr em relevo tudo o que existe a nossa volta.  Se há existência, a recompensa é a experiência e o crescimento. Contudo, estas coisas são muitas vezes dolorosas, embora sejam transitórias. Lembrando sempre, que o amor não é aquilo que queremos sentir e sim aquilo que sentimos. Amar não é verbo para se conjugar, mas para se praticar.

15 de setembro de 2012

PRESERVAÇÃO E CUIDADOS COM A INTIMIDADE

Ao longo dos últimos anos a nossa vida social tornou-se penosa demais e de difícil convivência e trocas de intimidades com as pessoas próximas. Sobretudo, pela individualidade emergente que vem a cada dia crescendo e distanciando as pessoas uma das outras. Viver em sociedade já nos deu muito prazer, mas atualmente, tornou-se um peso. Não compartilhamos o mesmo ideal do bem comum. Isto se agrava quando a crise torna-se norma em vez de exceção. O respeito pelo outro ficou distante. Como salvar a nossa vida social? Como preservar a nossa vida pessoal, como um ponto rico de apoio à intimidade?

Vivemos a época do simulacro, do amor líquido, das amizades efêmera, do transitório, do fast-food, das múltiplas janelas abertas, das mensagens rápidas, fragmentadas e instantâneas, da aceleração geral de todas as esferas da vida. Vivemos, ao mesmo tempo, em uma época em que a imagem tornou-se poderosa demais.

A reflexão filosófica não se contenta com o simulacro, a impressão dos sentidos, a liquidez das relações, o instante transitório. A filosofia pelo seu modo de ser e atuar convoca a uma atitude contemplativa, especulativa e questionadora. Libertando o pensamento para uma relação livre, crítica e refletida para com o próprio tempo. Penso que deste modo a filosofia poderá ensinar a virtude do diálogo, a força da verdade e a importância dos conceitos. Uma forma talvez de preservar e cuidar da intimidade.

Mas, o que fazer diante da crise? Que tipo de cuidados devemos ter para que nossa vida seja melhor? Para compreender o momento critico em que nossa humanidade atravessa precisamos antes, de uma maneira meio simplificada, dividir a nossa vida numa dimensão publica social, privada, pessoal e até mesmo numa dimensão intima.

A vida publica social, para algumas sociedades foi fundamental. Para a democracia ateniense, apesar de ter durado pouco tempo, ela continua sendo uma espécie de referencia para quem estuda filosofia, democracia e fenômenos sociais. Na democracia ateniense, a ideia de que o homem só se realiza em sociedade era vital para eles. O homem que não vivesse em sociedade era alguém considerado limitado. Era alguém que não participava das decisões comum a todos. Era um cidadão privado que vivia em oposição ao Estado. Considerado pelos gregos como um idiótes ou idhiótis, traduzindo etimologicamente para o português quer dizer: idiota. Pessoa fechada em si mesma, limitada, que não participa da vida em sociedade.  O poeta e dramaturgo alemão Bertolt Brecht, argumenta num dos seus textos que, “o pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio, depende das decisões políticas. O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado e, o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo”.
  
Na verdade, onde concentramos os nossos esforços? Não é necessariamente no social e sim na vida privada. Quando falamos da vida privada é bom lembrar que ela tem vários níveis. Podemos falar da vida privada como a minha vida profissional, onde ganho dinheiro, meus costumes. Falamos da vida privada como meu espaço de intimidade, onde ninguém tem o direito de invadir e muito menos de dar opinião. Diferente da vida publica, onde estou exposto e vulnerável a chantagens.

Entretanto, a intimidade é mais especifico ainda que a vida privada, porque a intimidade diz respeito a algo que é quase secreto. A vida privada pode ter suas vantagens, por isso a preferimos. A intimidade pode variar muito conforme a pessoa. A intimidade não é algo reversível. Enquanto, na minha vida privada eu posso mudar de emprego, mudar de profissão, mudar de fonte de renda, distanciar de certas amizades, já aquilo que pertence a minha intimidade não é fácil de trocar ou mudar. A não ser por vaidade.

Todavia, o tema vaidade foi abandonado pela filosofia a mais de duzentos anos e nunca foi assumida devidamente pela psicologia, embora seja tema central na nossa sociedade. Estudada pelos gregos na antiguidade e até o século XVIII a vaidade foi objeto de estudo recorrente em todas as épocas. Thomas Hobbes falava da van gloria, que significa quando meço o meu valor pelos olhares que os outros têm sobre ele e não pelo meu valor justo. A desumanização dessa percepção é tão aguda, que torna difícil a gente perceber esse elemento alternativo que é a vaidade. Extremamente presente na vida social e, sobretudo, no mundo da mídia e pouco estudada pela filosofia, segundo o filósofo Renato Janine Ribeiro. Ele argumenta que a psicanálise estudou a fundo o Complexo de Édipo que na verdade é uma hipótese, e que não se aprofundou o tema da vaidade que é uma evidência. Está presente o tempo todo no nosso meio, seja no mundo das celebridades, seja na política ou nas redes sociais.  

Por que a vaidade ameaça a intimidade? Pelo simples fato da intimidade ser algo precioso, dificilmente deve ser divulgada ou exposta. O mais grave ainda é um fenômeno complementar a vaidade que é a bajulação. E a bajulação produz um terceiro fenômeno que é levar o vaidoso acreditar no que dizem a ele. Isso produz um desgaste na vida pessoal. Para o filósofo Janine, existem duas hipóteses para esse desgaste da vida pessoal. Primeiro a nossa expectativa na vida pessoal é muito alta, num nível de satisfação muito elevado, sobretudo, no que diz respeito à cumplicidade, a paixão, o desejo e a excitação sexual. Segundo, a crise que sobre nós se abatem, ela com frequência tem como escudo a pessoa que está próxima de nós, o ponto mais afetado.

Na literatura jurídica, lemos com frequência casos de pessoas inocentes que responderam Processos Judiciais, sofrendo injustamente por calunia, difamação e até perderam seus empregos. Viram pessoas mais próximas se afastarem do seu convívio, os filhos se distanciaram, em alguns casos, tiveram seus casamentos defeitos por conta dessa exposição publica. Entretanto, a parte mais afetada são essas pessoas. Em tese poderiam ficar do nosso lado num gesto de solidariedade no momento da crise. Mas o nível de tensão é tamanho que acaba arrebentando na parte mais fraca. A pessoa vitima sente-se vulnerável e sem apoio nenhum. Nem com os filhos pode contar.

Portanto, viver em sociedade demanda princípios éticos e morais. O maior perigo do nosso mundo não está na violência urbana, nem mesmo nos poderosos; está na falta de alegria de viver das pessoas, no seu tédio, na sua frustração e na sua indiferença. Relacionar-se com qualidade é também admirar o outro com maturidade.

5 de setembro de 2012

O MITO DA PERFEIÇÃO HUMANA

Estamos sempre buscando a perfeição em tudo que fazemos. Achamos que sempre há margem para o aperfeiçoamento, tendo em vista que a perfeição não é um atributo humano. Mas ela está na natureza das coisas. A perfeição caracteriza um ser ideal que reúne todas as qualidades e não tem nenhum defeito. Designa uma circunstância que não possa ser melhorada ainda mais em hipótese alguma.

A perfeição seria o vazio, se a perfeição for realmente à ausência de erros e defeitos, ela é sinceramente algo desprezível, sobretudo, porque vamos fazer os nossos erros parecerem certos e, não há como julgar, pois, tudo é extremamente relativo, existem pessoas que dizem se empenhar na busca da perfeição, todavia, é um caminho no qual você se machuca a troco de nada, porque onde não há erros e nem possui defeitos, é algo pelo qual não vale à pena. As pessoas são feitas de suas escolhas e, o certo e o errado são apenas uma questão de ponto de vista, se não fossem os defeitos, não existiriam as qualidades e, consequentemente, não existiria a perfeição. No entanto, nessa linha de raciocínio, a perfeição é o vazio, o que mais o ser humano teme.

Platão foi discípulo de Sócrates, e um grande venerador da perfeição. Criou o “mundo das idéias”, que ele afirmava já ter sido habitado pelas almas, antes de caírem neste mundo material, só não explicou por qual motivo. Assim, o corpo passou a ser “cárcere” da alma, algo como um estorvo, cuja única função seria a de nos purificar das imperfeições. No “mundo das idéias”, está à essência da perfeição, que manifesta sob diversos conceitos. Nessas idéias, o mundo material é visto como que réplicas imperfeitas, um mundo de aparências. Cada ser tem por modelo uma idéia, que o supera de muitos, que o torna diferente e único. Assim, a busca do melhor seria à volta aquela única realidade verdadeira e inatingível, desligar deste mundo de imperfeições e fraquezas. Todo ser humano sente saudades do que já foi um dia e não é mais. De certa forma, essa teoria vai coincidir com a história da humanidade, colocada pela religião quando faz referência ao paraíso de Adão e Eva.
  
Vivemos criando regras e normas para tudo aquilo que fazemos a título de nos aproximarmos o mais que puder da perfeição. Seria um atrevimento sem precedente tentar estabelecer normas ou regras de comportamento nos relacionamentos afetivos. É interessante perguntar as pessoas, principalmente às casadas o quanto de energia psicológica está sendo consumida por homens e mulheres que tentam viver em seus casamentos atrás de uma máscara, quase sempre recheada de intrigas, crueldades e ciúmes.

Quantos casais se unem levados pela chama ardente do amor que nasce do fundo da alma, se adoram e até acreditam que nada e ninguém podem separá-los. Quando menos esperam são traídos pelo inimigo secreto, o ego, essa legião de agregados psicológicos que destrói a beleza do amor puro e inocente. Essa é a conseqüência da saída do Jardim do Éden espiritual, terrível seqüela deixada para nós humanos por conta do mito da perfeição, tornando-se explicito a nossa imperfeição.

Nós estamos acostumados a ver o mundo de forma desordenada, de forma restrita e selecionada. Depois de certa idade não ficamos muito mais exposto ao sol para não queimar o rosto e envelhecer a nossa pele. Procuramos esconder as feições e as marcas da pele. Tudo que é desordem, esteticamente falando, causa revolução interior, seja ela tardia ou prematura.

Temos uma tendência ao perfeccionismo, que pode se arrastar por tudo que fazemos. Substituímos o relaxamento pela ansiedade e a satisfação pelo descontentamento quando algo não sai perfeito como desejamos ou queremos. Todavia, deveríamos saber que a perfeição verdadeira não é algo que atingimos. Pois ela é um estado que floresce espontaneamente. Eu diria um senso de plenitude e de unidade que vem do coração.

Entretanto, os textos yóguicos nos falam que tudo no mundo surge a partir da energia que está contida dentro do shakti, que é uma energia plena, completa e perfeita que está presente em todas as formas de pensamentos e estados do Ser. Contudo, contrasta com a nossa idéia ordinária de perfeição. Nos nossos discursos diários procuramos o perfeito, que significa sem defeito. Tendo em vista, que a perfeição é um objetivo humano e não um presente genético. Vivemos em uma sociedade em que a mídia escrita e televisava, insiste que podemos e devemos pagar o preço para atingir a perfeição. Quando não conseguimos fazer as coisas perfeitamente como cobramos de nós mesmos, logo pensamos que deve haver algo errado conosco ou com o mundo em que vivemos. A ironia é que o nosso ideal de perfeição surge da necessidade do nosso ego de explicar e controlar tudo a nossa volta. Contudo, inevitavelmente nos mantém distante da experiência da perfeição e com isso sentimos medo de falhar e não ser aceito. Somos o tempo todo, julgados e controlados por todos, não porque acham que estão certos, mas por medo de não estarem certos. A perfeição está dentro de cada ser humano, naquilo que ele está buscando. Mas o medo da imperfeição e de falhar nas suas circunstâncias particulares é o que faz ser rigoroso consigo mesmo.

Portanto, a perfeição é algo que nunca vamos alcançar e que também, naturalmente nunca vamos desistir de buscá-la. Talvez porque não aceitamos nossa condição de ser humano, com todos os defeitos e falhas, que nos é peculiar. Nossa maior imperfeição é o de criticar o outro, porque é nele que projetamos nossas fraquezas. Esquecemos das nossas qualidades, que aos olhos de muita gente boa, torna-se um modelo diferente de perfeição, baseado no que cada um tem de melhor para oferecer.     

AS COISAS SÃO OS NOMES QUE LHE DAMOS

O que é que você está fazendo com a sua solidão? Quando você a lamenta, você está dizendo que gostaria de se livrar dela, que ela é um sofri...