30 de junho de 2021

O CAMINHO DO AMOR SE FAZ PELA CONSCIÊNCIA

Relacionar-se significa que estamos sempre começando, sempre tentando nos tornar conhecidos. A alegria da amizade está na exploração da consciência. Quando investigamos o outro, fazemos o mesmo conosco. Aprofundando-nos no outro, nos aprofundamos em nós mesmos. Tornamo-nos espelho para o outro e o amor torna-se meditação. Quanto mais descobrimos, mais misterioso o outro se torna: “o amor é uma aventura constante”. Pessoas iluminadas têm mais inimigos do que os não iluminados, pois os cegos não perdoam quem enxerga e os ignorantes não perdoam quem sabe mais. Ser amigável, amoroso, autêntico, inocente sem causa é suficiente para disparar muitos egos contra si. De modo que, relacionar-se é uma das maiores coisas da vida: “é amor compartilhado”.

De modo que, para amar é preciso transbordar de amor e para compartilhar é preciso ter o amor. Quem se relaciona respeita e não possui. A liberdade do outro não é invadida, ele permanece independente. Possuir é destruir todas as possibilidades de se relacionar. Compreendo o relacionar-se como um processo. Relacionamento é diferente de relacionar-se: "é completo, fixo, morto”. Antes devemos nos relacionar conosco mesmos e escutar o coração para a vida ir além do intelecto, da lógica, da dialética e das discriminações. É bom evitar substantivos e enfatizar os verbos. Como falei em outra reflexão, a vida é feita de verbos como: “amar, cantar, dançar, relacionar, viver, etc”.

Portanto, somos um fim em si mesmo. Ninguém existe para ser usado. Quem está no auge da solidão só se atrai por quem esteja só. Dois solitários olham um para o outro, mas dois que conheceram a solidão olham para algo mais elevado. Porque a felicidade simplesmente acontece. Para ser feliz é preciso deixar acontecer. O caminho do amor deve ser tomado com tremenda consciência e o da consciência, com tremendo amor. Depois de cada experiência profunda nos sentimos sós e tristes. Mas, a alegria traz a necessidade de compartilhar. A paixão é muito pequena diante da compaixão. Contudo, solidão é mover-se para dentro e amor é mover-se para fora. Ambos os movimentos são enriquecedores e aumenta cada vez mais o potencial do relacionar-se. Só quem é capaz de ser feliz sozinho, pode contribuir com a felicidade do outro.

29 de junho de 2021

PARA ALÉM DE SI MESMO ESTÁ O OUTRO

Tornou-se muito comum as pessoas nutrir uma atitude de posicionar-se frente à vida de maneira arrogante e prepotente, que impede de enxergar o que está além de si mesmo. Há uma tendência, principalmente entre os jovens, de acharem que sabe e pode tudo, que está sempre certo e os outros errados. Cuidado, essa postura pode ser uma doença. Todavia, existe uma fase na vida em que despertam estas características: ver-se como o centro do universo, ter um ponto de vista limitado, defendê-lo ferrenhamente e não conseguir colocar-se no lugar do outro, sendo incapaz de modificar a própria conduta. Este é um comportamento egocêntrico, que impede o indivíduo de compreender o que vem de fora. Está sempre certo e os outros errados, ele sabe tudo. Esse é o tipo mais odioso de pessoa, para se conviver.

É comum na infância a criança desenvolver uma típica forma de pensamento mágico: quando ocorrem duas coisas simultaneamente. Se o outro está de mau humor, deve ser por minha causa; se está bem comigo hoje, deve ser porque alguém me elogiou. Deduzo o que me convém, para me tranquilizar, e esqueço-me de ver a realidade como ela é. Se não consigo ter clareza sobre o que está acontecendo, em vez de usar o “dedutômetro”, seria melhor perguntar diretamente. Mas o egoísta não faz isto porque ele acha que o mundo gira em torno dele. Esta fase ocorre naturalmente entre dois e sete anos de idade, na fase do pensamento pré-operacional ou do egocentrismo. Esse é um período no qual a criança acha que sabe tudo, muito mais do que os adultos.

Entretanto, de acordo com a idade pode ser pouco, se comparado à de um adulto, ou ser muito para alguém jovem, mas nem por isto deve-se pensar que sabe tudo. A leitura, o conhecimento e o aprendizado vão mostrando-nos que quanto mais sabemos, mais sabemos que não sabemos nada. O astuto acha que sabe tudo e o sábio é aquele que sabe que estará em constante processo de aprendizado. O mundo não gira apenas ao nosso redor, que existem fatores alheios e externos que nos ajudam a perceber que não estamos sozinhos no mundo e que os outros não estão ali somente para nos servir, como pensa as crianças que é servida pelos adultos devido as suas limitações pela idade.

Aquele que se enquadra nestas características, ao menos em parte, precisa expandir a consciência, ampliar a cultura, ler mais, obter mais informações, permitir-se amadurecer, considerando que o mundo do outro também faz parte do próprio mundo, direta ou indiretamente. A teimosia, o egoísmo, a falta de benevolência, a intransigência, a arrogância e o orgulho são sintomas de egocentrismo, de uma “parada” no tempo do desenvolvimento intelectual, emocional, moral e social. Devemos observar a nós mesmo em momentos de teimosia, de defesa de nossas ideias e questionar a nós mesmos como: “Por que sou teimoso e insisto tanto no erro? Estou certo na minha insistência? Isto me leva a algum lugar? Estou aberto ao ponto de vista do outro, mesmo que sua opinião seja diferente? Quero impor minha maneira de pensar ao outro? Só levo em conta o que quero e quando quero? Vale lembrar, da vida nada se leva a não ser a vida que se leva.  

Portanto, quando a pessoa passa essa fase de maneira inadequada, levam para a vida adulta neuroses, psicoses que se transformam em enfermidades mentais, como a esquizofrenia, o transtorno de personalidade narcisista e o transtorno bipolar. Ocorre um desinteresse pelo que é do outro, tornando-se responsável pela perda de contato com a realidade. Carrega em seu inconsciente uma culpa por ser quem é, remetendo-o a um sentimento de inferioridade, incapacidade e inadequação, à vulnerabilidade ao humor do outro. Tudo isso por não estar ao alcance do consciente devido às resistências e ao sentido de preservação. Acaba tomando o sentido inverso: ao invés de se sentir inferior, toma o caminho da arrogância, da petulância e do pedantismo. Talvez como forma de defesa. Dessa maneira, instala-se uma falsa sensação de proteção, convencendo-se de que sua autoestima é muito bem manejada e adaptada. Vivendo uma situação infernal de ruim e dizendo que o outro é a causa do seu desconforto.

23 de junho de 2021

O AMOR DA FORMA E MOVIMENTA A VIDA

A função do amor é despertar a consciência de cada pessoa no sentido de romper fronteiras, seja qual for, permitindo a fusão entre as consciências envolvidas. Gerando, contudo, essa força que nos aproxima e nos atrai rumo a novos ideais. Porém, este sentimento chamado amor, que não sabemos exatamente qual seria a sua melhor definição. Mas, sabemos que é um sentimento profundo e essencial a vida, embora pouco falado e pouco estudado nas escolas e principalmente nas universidades, onde se concentra à força jovem, terreno fértil para semear o amor. Por se tratar de uma manifestação humana, merecia uma atenção especial. Tendo em vista, que o ser humano não se reconhece somente pela racionalidade, mas também pelos sentimentos. Existe em cada pessoa uma integração nítida e harmonizada entre pensar e sentir que lhes garante a condição de transcendência, como vem demonstrando os estudos ao longo desses anos, sobre a capacidade e alcance da nossa mente humana.

Na música “mania de você” de Rita Lee, a letra nos diz o seguinte: “A gente faz amor por telepatia”. Não sei dizer exatamente se quando a cantora compôs essa letra, pensou realmente na existência desse tipo de comunicação entre as pessoas. Entretanto, a verdade é que esse fenômeno extra-sensorial chamada telepatia existe e manifesta de fato. Muito estudado e demonstrado pela parapsicologia, a telepatia é a capacidade que nós humanos temos para captar a distância o que acontece com nossos entes queridos. São pressentimentos ligados as pessoas do nosso circulo afetivo. Por exemplo: pais, filhos, namorados e amigos mais próximos. Telepatia é uma palavra que vem do grego, patheia = sofrimentos ou doenças e tele = distância. Isto é, sofrer ou sentir a distância o que alguém ligado a mim está pensando ou sentindo naquele momento. Segundo a parapsicologia, essas manifestações acontecem muito em momentos tristes, onde usamos todas as forças do nosso pensamento, sempre ligados a alguém que amamos muito ou de pessoas muito próximas do nosso circulo afetivo.

Todavia, quem já não pensou em uma pessoa que não via há muito tempo e de repente do nada a pessoa aparece ou telefona. Quantas vezes a gente não está andando pelas ruas pensando numa determinada pessoa e de repente ao virar a esquina tromba com a mesma, e logo vem àquela velha frase: “você não morre mais”, estava pensando em você. Às vezes o outro não acredita muito. Mas é a mais pura verdade, essas coisas acontecem de fato. E principalmente entre os amantes esses fenômenos extra-sensoriais são mais comuns. Por que será? Talvez porque só o amor constitui a linguagem universal eficaz para esse tipo de comunicação integrada. Entendo que só o amor tem o poder de eliminar as fronteiras entre as consciências afetivas. Quem eu amo habita em mim e eu nele. Há um intercambio psíquico muito profundo entre nós.

Entretanto, a linguagem universal do amor nos coloca em igualdade, contudo, desmanchando as barreiras etnocêntricas, avançando na compreensão do ser amado e distribuindo a paz entre todos os seres humanos. Muitas dessas comunicações amorosas entre os apaixonados efetivam-se através dos olhares que transmite, com grande exatidão, pensamentos e sentimentos, porque os olhos tornam evidentes as atividades da consciência mais intima de cada um. Nossos olhos revelam o que pensamos e sentimos. Como diz um adágio popular: “os olhos são as janelas da alma”.

Portanto, o amor da forma e movimenta a vida. Ele representa a força integradora do viver em harmonia, que expressa afinidade de um ser com os demais seres do universo. Por se alojar na essência, o amor é invisível ao olhar menos apurado, mas seu rastro permanece em toda a parte, perceptível a aqueles que com ele se identificam. Contudo, essa dinâmica do amor permite o desenvolvimento das consciências e, estas somam qualidades entre si quando estão amando. Essa força poderosa do amor justifica a humanização do ser humano, orientando sua expansão para estágios mais elevados de espiritualidade e consciência. Enfim, a experiência mais profunda do ser humano é o amor, por ser uma vivência única.     

19 de junho de 2021

COMO É BOM TER ALGUÉM QUE NOS COMPLETA

Como é bom viver um romance, tem coisa melhor do que isso? Como é bom encontrar alguém que te completa, que faz o seu mundo melhor, alguém com quem você quer viver momentos inesquecíveis e apaixonante, alguém que faz o seu coração ficar em paz ou que bagunça o seu mundo da melhor forma possível. Falar de amor é muito bom, declarar-se é melhor ainda. Seja porque você descobriu-se apaixonado, seja porque quer reavivar a chama de uma paixão latente, expressar seus sentimentos, tudo isso faz parte essencial de qualquer romance.

Mas, às vezes, faltam as palavras para conseguirmos explicar tudo aquilo que se passa em nossos corações. Mais muitas vezes certas palavras ditas de maneira errada e em hora errada, pode machucar profundamente aquela pessoa que você ama. Porém, antes de machucar essa pessoa que você diz especial, pegue uma folha de papel e amasse.

Depois de amassado, tente fazer com que essa folha fique como antes. Impossível não é? O coração humano é como essa folha de papel; uma vez machucado, é difícil que volte a ser como antes. Então, antes de machucar alguém, seja ele quem for, pense nisso! As palavras de amor são presentes que expressam nossos sentimentos das mais ricas e belas maneiras.

O que há de ser mais dolorido nesta vida do que um amor impossível? Há quem duvide, há quem não acredite que isso possa acontecer, mas sim, acontece. Acontece e essa é a pior de todas as certezas, é saber que você ama alguém, que este alguém também te ama, mas que ambos não podem ficar juntos. Mas, se eles se amam, porque então não poderiam viver este amor? Ahhhh quem dera eu fosse capaz de responder esta pergunta, metade dos meus problemas estariam resolvidos.

Portanto, ninguém vai saber, nem sequer vão desconfiar. Que dois corações se abraçaram, numa simples troca de olhar. Digo sempre ao meu coração se aquieta, ninguém pode fazer nada. Pertencemos um ao outro, porque esse outro nos completa, mas, seguimos só, cada um por uma estrada. Até parece que queremos nos livrar um do outro. Como dizia o filósofo alemã Friedrich Nietzsche (1844-1900): “cuidado, pois ao livrar-se de seu demônio, poderá se livrar do melhor que há dentro de você”. Contudo, faça a seguinte pergunta: “Você está pronto”? Ninguém nasce pronto, mas, estamos cada dia mais perto. E quando chegar lá, completamos o ciclo do amor.  


14 de junho de 2021

QUANDO A PAIXÃO DA LUGAR AO AMOR

Nas aulas de filosofia, depois dos alunos conhecerem o filósofo grego Platão (427-347 a.C.), mais precisamente a sua obra “O Banquete”, logo desperta a curiosidade deles sobre o tal amor platônico, que levanta uma questão extremamente pertinente para eles: “a paixão”. Existe algo mais apaixonante, de si para consigo, do que a paixão? Ao julgar se a paixão vale ou não vale a pena ser vivida, é responder uma das questões cruciais da filosofia platônica. 

Muitas pessoas confundem o amor com paixão. Quando estão apaixonadas, julgam estar amando. O amor, porém, é uma vivência mais ampla, é um modo de ser, de viver, que se conquista gradualmente, à medida que se desenvolve a sensibilidade para com as outras pessoas, isto é, através de uma amizade constituída. É a capacidade de descentra-se, sair de si, ir ao encontro do outro, em uma atitude de zelo e respeito que nada quer em troca. Amar demanda cuidados com o outro, preservar a identidade e as diferenças do outro, sem perder a sua, evidentemente. É o mesmo que estar comprometido com a realização do outro, é um querer bem ao seu próximo.

A capacidade de amar pode expandir-se e atingir um envolvimento e um compromisso com todos os seres vivos e até mesmo com seres inanimados. Os movimentos ecológicos atestam gestos de amor de pessoas que lutam pela preservação da fauna, da flora, das águas e do ar, na questão da poluição, segundo afirma a filósofa e educadora Neusa Vendramin Volpe.

Ao contrário do amor está a paixão. O filósofo holandês Baruch Spinoza (1632-1677) compreendeu que toda a nossa felicidade e toda a nossa miséria residem num só ponto: “a que tipo de objeto estamos presos pelo amor”? Se este suposto amor estiver centrado no egoísmo do sujeito que se diz amar de paixão, fuja desse amor. Ele só ama a si próprio. É a carência dele que grita mais alto. Segundo Platão, o amor perfeito só existe no mundo das idéias, ou seja, idealizamos esse amor e projetamos no outro. É um gostar de mim mesmo no outro. A partir do momento que esse não corresponder mais as minhas expectativas, deixo de amá-lo. Esse amor centrado no egoísmo é a paixão. A idealização projetada no objeto de desejo. 

Portanto, às vezes pensamos que gostamos de uma determinada pessoa, só porque ela nos entende. O que mais precisamos naquele momento é ser compreendido por alguém, ou seja, alguém com uma percepção aguçada, para ler nas entrelinhas o que acontece com o nosso sentimento. De modo que ser amoroso é uma característica da nossa personalidade e pressupõe toda vivência desde o seio materno. Só quem recebeu o amor é capaz de amar. Ninguém da o que não tem. Se nunca fomos amados de verdade é pouco provável, entregarmos totalmente a um grande amor. Vamos estar sempre com um pé atrás. Vamos buscar no outro aquilo que não temos, aquilo que nos faltam e acreditamos encontrar na nossa  outra cara metade, como afirmava Platão.

10 de junho de 2021

ATRAVÉS DO AMOR BUSCAMOS NOSSA UNIDADE PERDIDA

Consideramos junho como o mês dos namorados. Talvez pelo romantismo que a data doze de junho nos envolve. Assim, como dia treze de junho, que se comemora o dia de Santo Antônio, santo casamenteiro, segundo dizem os devotos. É um dia para consolidar o amor. A paixão está no ar e no olhar dos amantes. É a razão pela qual ninguém teria razão para nos tirar. É ser só de alguém e nunca deixar esse alguém só. Penso que amar é olhar para dentro de si mesmo e dizer: “eu quero alguém para ser feliz”. Há uma tentativa de explicar a razão contida em gestos basicamente instintivo das seduções. Por que será que o olhar da sedução é tão fascinante a ponto de despertar inesperadamente o desabrochar da paixão? Na verdade, é a paixão que vem primeiro. Aqui está um enigma para os humanos pensar. Todavia, os poetas já diziam que os olhos são a janela da alma. E de alma o grande filósofo grego Platão (427-347 a.C.), entende. Já dizia o poeta: “é no olhar que te vejo, no olhar te mexo e no olhar-te desejo”. 

Apesar de todo o temor que sentimos diante do encontro amoroso. Embora não o reconheçamos, ainda assim o amor permanece como um enigma que norteia a nossa vida. Até porque há uma tendência em nós, de maltratar o amor quando ele aparece. Agregamos tudo de ruim, a começar pelo ciúme que é um péssimo sentimento. Justificamos como se isto fizesse parte do amor. As pessoas sempre buscaram preencher o sentido da sua existência com amor. Esse sentimento que sempre se apresentou como um mistério para os humanos, que ao longo dos séculos, filósofos, poetas, assim como os psicanalistas, tentaram desvendar. Mas, quem melhor explicou e mais aproximou o amor dos humanos, foi o filósofo grego Platão.

No diálogo o “Banquete”, que até virou peça de teatro, Platão explica a origem do amor, a partir da mitologia grega. Diz nos seus diálogos que num passado remoto existiam criaturas monstruosas. Metade homem e metade mulher. Seres humanos completos, com duas faces, quatro braços, quatro penas, continha em sim mesmo os dois sexos. Essas criaturas andrógenas, num dado momento, resolveram invadir o “Olimpo”, a morada dos deuses. Zeus como o representante maior dos deuses e responsável pelo Olimpo, na tentativa de punir essas criaturas andrógenas ele num golpe as partiu ao meio, tornando-se metade, separando em dois sexos. De modo que foi a partir daí, que essas criaturas, saíram pelo mundo e passaram a buscar incessantemente a outra metade, para assim restituir a plenitude perdida. Claro que isso é uma explicação mitológica, mas que faz todo o sentido para nós humanos. Cada um tem a sua essência, é um ser único, não existe outro exemplar idêntico. Portanto, somos individualmente insubstituíveis.

Segundo Platão, essas criaturas somos nós mesmos, em busca da nossa parte perdida, ou seja, é no outro que vamos encontrar a nossa cara metade. Por conseguinte, é através do amor que buscamos a nossa unidade perdida, a totalidade que se rompeu com a separação. O que fazemos no momento da sedução? Senão buscar no outro a nossa identidade. Desta forma, viver o verdadeiro encontro amoroso seria reviver o encontro com a nossa própria essência, que desperta com o amor. Sendo assim, o meu desejo pelo outro é para nos crescer juntos neste amor. De modo que tudo que você ama eventualmente perderá, mas, no fim, o amor retornará de uma forma diferente. A natureza é tão pródiga com seus filhos. Às vezes percebo que o mundo é o lugar mais lindo que existe, e vejo a imensa sorte que temos de viver nele.

Portanto, para o poeta o amor é uma vida, mas, uma vida que é e foi um tudo que sempre se manterá. O amor de uma vida, o sangue do sempre. Uma vida em dádiva, um nada inexistente e tudo existe. Passam anos, nascem flores de todas as cores e corre o rio sem medida e passam anos sem que nosso amor desvaneça. Tudo muda, sorrisos de esperança como canções são declamados no coração de alguém, que como nós amamos também, porém, no tempo da eternidade. Concluo essa reflexão parafraseando o poeta Vinícius de Moraes: “De tudo ao meu amor serei atento. Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto que mesmo em face do maior encanto dele se encante mais meu pensamento”. Contudo, enquanto houver uma alma apaixonada, o cérebro e o coração dividirão a soberania das emoções, confundindo paixão e amor.


5 de junho de 2021

O AMOR NÃO É REGIDO PELA LÓGICA

Os místicos e apaixonados concordam em que o amor não tem razões. Angelus Silésius (1624-1677), místico medieval, disse que ele é como a rosa: “A rosa não tem ‘porquês. Ela floresce porque floresce”. O poeta e cronista brasileiro Carlos Drummond de Andrade (1902-1987), repetiu a mesma coisa no seu poema “as cem-razões do amor”. É possível que ele tenha se inspirado nestes versos mesmo sem nunca os ter lido, pois as coisas do amor circulam com o vento. “Eu te amo porque te amo, cem razões”. “Não precisas ser amante, e nem sempre saber sê-lo”.

Meu amor independe do que me fazes. Não cresce do que me dás. Se fossem assim ele flutuaria ao sabor dos teus gestos. Teria razões e explicações. Se um dia teus gestos de amante me faltassem, ele morreria como a flor arrancada da terra. “Amor é estado de graça e com amor não se paga”. Nada mais falso do que o ditado popular que afirma que “amor com amor se paga”. O amor não é regido pela lógica das trocas comerciais. Nada te devo. Nada me deves. Como a rosa floresce, eu te amo porque te amo. “Amor é dado de graça, é semeado no vento, na cachoeira, no eclipse. Amor foge a dicionários e a regulamentos vários. Amor não se troca. Porque amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo”.

Drummond tinha de estar apaixonado ao escrever estes versos. Só os apaixonados acreditam que o amor seja assim, tão sem razões. Mas, talvez por não estarmos apaixonados, suspeitamos que o coração tenha regulamentos e dicionários. E o matemático, físico e filósofo francês Blaise Pascal (1623-1662) nos apoiaria, pois foi ele quem disse que “o coração tem razões que a própria razão desconhece”. Não é que faltem razões ao coração, mas que suas razões estão escritas numa língua que desconhecemos. Destas razões escritas em língua estranha o próprio Drummond tinha conhecimento e se perguntava: “Como decifrar pictogramas de há dez mil anos se nem sei decifrar minha escrita interior? A verdade essencial é o desconhecido que me habita e a cada amanhecer me dá um soco.” O amor será isto: “um soco que o desconhecido me dá”?

Ao apaixonado a decifração desta língua está proibida, pois se ele a entender, o amor se irá. Como na história de Barba Azul, um personagem de um famoso conto infantil: “se a porta proibida for aberta, a felicidade estará perdida”. Foi assim que o paraíso se perdeu: quando o amor – frágil bolha de sabão, não contente com sua felicidade inconsciente, se deixou morder pelo desejo de saber. O amor não sabia que sua felicidade só pode existir na ignorância das suas razões. Foi o filósofo dinamarquês Soren Kierkergaard (1813-1855) que comentou o absurdo de se pedir dos amantes explicações para o seu amor. A esta pergunta eles só possuem uma resposta: o silêncio. Mas que se lhes peça simplesmente falar sobre o seu amor – sem explicar. E eles falarão por dias, sem parar. Mas, olho o amor com olhos de suspeita, curioso. Quero decifrar sua língua desconhecida. Procuro, ao contrário de Drummond, as cem razões do amor.

Vamos a Santo Agostinho (354-430), em busca de sua sabedoria. Releio as Confissões, texto de um teólogo que meditava sobre o amor sem estar apaixonado. Possivelmente aí se encontre a análise mais penetrante das razões do amor jamais escritas. E me defronto com a pergunta que nenhum apaixonado poderia jamais fazer: “Que é que eu amo quando amo o meu Deus?” Imaginem se um apaixonado fizesse essa pergunta à sua amada: “Que é que eu amo quando te amo?” Seria, talvez, o fim de uma história de amor. Pois esta pergunta revela um segredo que nenhum amante pode suportar: que ao amar a amada o amante está amando uma outra coisa que não é ela. Nas palavras do escritor e pintor alemão Hermann Karl Hesse (1877-1962), “o que amamos é sempre um símbolo”. Daí, conclui ele, a impossibilidade de fixar o seu amor em qualquer coisa sobre a terra.  

Variações sobre a impossível pergunta: Te amo, sim, mas não é bem a ti que eu amo. Amo uma outra coisa misteriosa, que não conheço, mas que me parece ver aflorar no teu rosto. Eu te amo porque no teu corpo um outro objeto se revela. Teu corpo é lagoa encantada onde reflexos nadam como peixes habituados a fugir. Como Narciso, fico diante dele. “No fundo de tua luz marinha nadam meus olhos, à procura.” (Cecília Meireles 1901-1964): “Por isto te amo, pelos peixes encantados”.

Mas, os peixes são escorregadios. Fogem. Escapam. Escondem-se. Zombam de mim. Deslizam entre meus dedos. Eu te abraço para abraçar o que me foge. Ao te possuir alegro-me na ilusão de os possuir. Tu és o lugar onde me encontro com esta outra coisa que, por pura graça, sem razões, desceu sobre ti, como o vento desceu sobre a Virgem Bendita. Mas, por ser graça, sem razões, da mesma forma como desceu poderá de novo partir. Se isto acontecer deixarei de te amar. E minha busca recomeçará de novo.

Portanto, esta é a dor que nenhum apaixonado suporta. A paixão se recusa a saber que o rosto da pessoa amada (presente) apenas sugere o obscuro objeto do desejo (ausente). A pessoa amada é metáfora de uma outra coisa. “O amor começa por uma metáfora”, diz o escritor tcheco Milan Kundera (1929): o amor começa no momento em que uma mulher se inscreve com uma palavra em nossa memória poética”. Temos agora a chave para compreender as razões do amor, segundo o psicanalista, filósofo e educador Rubem Alves (1933-2014): “o amor nasce, vive e morre pelo poder – delicado – da imagem poética que o amante pensou ver no rosto da amada”.

POEMA INSTANTE DO POETA JORGE LUÍS BORGES

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ...