30 de novembro de 2021

NOS HOSPITAIS QUE A VIDA REVELA O SEU MISTÉRIO

Todas as vezes que vou a um hospital por algum problema de saúde, desconfio que a morte ronda por esses lugares. A caminho para a sala de exame, passando por corredores gelados, porém, o frio dentro de mim ainda era maior. Levamos uma eternidade até chegar a tal sala de exame. Talvez parecia demorar por conta da minha ansiedade em fazer logo a tal biópsia.

Porém, o que me ocorreu naquele momento, foi fazer um pacto com a morte: “nem eu te procuro e nem você me procura, um dia a gente se encontra, mas, que não seja aqui”. No entanto, a minha memória recorrente do passado, ao sofrer um choque anafilático, veio à tona juntamente neste momento.

Choque anafilático, para quem não sabe, é uma reação alérgica de hipersensibilidade imediata, que afeta o corpo todo, com a diminuição da pressão arterial e taquicardia em que há risco de morte. Tinha que pensar nisto agora? De modo que, só aumentou a minha ansiedade naquele corredor interminável.

Já na sala de exame para a coleta do material. Percebo uma movimentação em torno de mim. Tudo acontecendo muito rápido. Foi nesta hora que senti que não somos absolutamente nada e que a morte pode estar por perto nos observando. Pensei comigo, de que adianta tanto orgulho se precisamos desses profissionais da saúde para nos manter vivos?

Para eles sou só mais um paciente. O médico se aproximou de mim e perguntou: “tudo bem com você”? Imagina, quem fica bem nesta situação? Para piorar, vem a enfermeira pede para tirar a calça e a cueca. E oferece-me um avental aberto atras para vestir. Quase perguntei, mais a senhora vai ficar aqui junto? Pois, ela permaneceu ali auxiliando o médico. Eu deitado quase de bruços, com tudo exposto em uma situação vexatória. Quase morri de vergonha!   

Não sabia se ria ou chorava! Mas o pacto com a morte estava selado. Tinha certeza que ela não iria me incomodar, pelo menos, não naquele momento de ansiedade. Passado alguns segundos começa a viagem pelo interior do meu corpo. Entro numa dimensão de serenidade e paz. Pensava na fala do médico e ria por dentro. Como posso estar bem se algo está sendo introduzindo via reto em meu corpo?

Posso descrever esta experiência como uma viagem, que nos coloca na fronteira entre a vida e a morte. É nesta hora que o milagre torna-se eminente e a nossa certeza que Deus está no comando de tudo. De modo que, quem quiser conhecer a verdadeira sala dos milagres, faça uma visita ao centro cirúrgico ou a sala de exames. É impressionante como as pessoas chegam e sai bem. Costuma-se entender por milagre um fato maravilhoso ou extraordinário que suscita admiração. Hoje posso dizer que o milagre é o preâmbulo da nossa fé. É a assinatura de Deus.

Nos hospitais vidas são salvas a todo instante. Não perguntamos sobre os caminhos pelos quais a vida nos conduz. Nesta hora nos restam às lembranças dos encontros com o que a vida nos apresentou de poético e fugaz. Quando tudo parece desabar, cabe a nós decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir ou lutar. Descobri no caminho incerto da vida, que o mais importante é o decidir. Seja para qual for a direção, temos que escolher.

Portanto, a vida nos toma pelas mãos, nos da à possibilidade de rever os nossos conceitos, nos revela o seu mistério, nos esconde da morte e às vezes nos concede novamente aquela oportunidade de dizer a quem amamos: “preciso de você”. Às vezes sou julgado por coisas que não fiz e não sou. Gente maldosa fazendo a cabeça de gente fraca de caráter. Do gosto pela vida nasce a solidariedade e desta emana uma força muito grande, que nos arranca da acomodação e nos faz reerguer. Sou um novo homem e reconheço a minha fragilidade e impotência, diante dos percalços da vida.

29 de novembro de 2021

A VERDADE ALIVIA MAIS DO QUE MACHUCA

As relações humanas, ao contrário do que todo mundo acha, estão deveras, muito longe de ser uma relação pautada no diálogo, na compreensão e no desenvolvimento dos seres humanos. Presenciamos em todos os seguimentos sociais cada um defendendo o seu ponto de vista e não consegue ouvir e nem entender o outro. Isso acontece no Supremo Tribunal Federal, nas famílias, nos relacionamentos amorosos e até no trabalho. A maior dificuldade é quando se pretende estabelecer um diálogo e a cooperação efetiva entre as pessoas. Como dizia o psiquiatra José Ângelo Gaiarsa: “existe um preconceito lógico, situado nas raízes da inteligência. Ele cria um vicio, porque não conversamos e não escutamos o outro. Não fazemos e ninguém faz quase nada do que diz. Não dizemos e ninguém diz quase nada do que faz”.

A conversa, em suma, não é nada do que está sendo falado. É preciso começar daí. Na verdade, a maior parte do tempo ela está muito próxima de ser o contrário do que está sendo dito. Tem tudo a ver com um palco onde cada um tenta, continuadamente, representar como ele gostaria de ser. Pouco ou quase nada tem a ver com o que as pessoas fazem, sentem ou acham que são. Estão completamente alienadas no seu mundo de ilusão. E não percebem o isolamento que estão criando em torno de si. Muitas vezes procuramos a felicidade, mas não acreditamos no amor.

Às vezes, nós não compreendemos por que temos certos tipos de comportamento ou atitudes. Não tentamos verificar que isso pode acontecer, porque trazemos dentro de nós conflitos que não conseguimos resolver. Esses conflitos íntimos impedem nossa maneira eficiente de agir e conhecer melhor o outro. As pessoas não percebem a atmosfera psicológica que criam em ambientes como o trabalho, no lar com a família, nas relações amorosas, etc. Elas não percebem que o seu comportamento está afrouxando os laços afetivos nas suas relações.

Entretanto, pessoas que não aceitam críticas e quando surge um conflito que demanda diálogo, prontamente ela se arma de algum tipo de defesa, para fugir às ameaças e não enfrentá-las na base de uma conversa franca e aberta, ouvindo os contras e os prós, sem acusações. Pessoas que acusa a outra é o tipo mais odioso de se relacionar. Elas se julgam certinhas. Não conversam e com isso perdem uma grande oportunidade de conhecer o outro e ter seus conflitos amenizados. Por outro lado, se a pessoa procurasse mais pensar como age e porque age e tentar descobrir maneiras para compensar tais comportamentos, isso ajudaria a agir com mais segurança e eficiência no relacionamento interpessoal e na compreensão intrapessoal.

Por conseguinte, uma pessoa que tem o triste vício de fumar, por exemplo, pode achar que todos ao seu redor deveriam fumar assim se incomodaria menos com ela. Pessoas que são agressivas acreditam que todo mundo a provoca. Elas são capazes de invadir e violar a privacidade de alguém, só para manipular informações e construir provas e com isso mostrar que estão certas. Isso é muito comum nas redes sociais. Usam de falsidades ideológicas a título de se convencer que estão falando a verdade. São pessoas completamente doentes e infelizes na sua subjetividade. Sobretudo, porque são criticas e encontram dificuldades para fundamentar suas razões, porque baseia suas vidas em meras opiniões, forjando situações para sustentar sua lógica e detonar o outro.

Todavia, é muito difícil entender alguém sem primeiro estabelecer com essa pessoa um diálogo em vez de censurá-la. Podemos conhecer melhor as pessoas, observando o seu comportamento, dando a ela a oportunidade de expor seu pensamento, sentimento e ações. O não conseguir conversar é uma pratica muito comum quando se têm um pensamento rígido, sentimentos cristalizados, que mudam e que bitola o comportamento da pessoa no entendimento com o outro. A pessoa passa a ver e a julgar o outro com base no seu estereótipo, para alguém estar certo tem que agir de acordo com ela. Esse comportamento chama-se estereótipo porque se trata de uma pessoa rígida e cristalizada nos seus princípios e atitudes diante da circunstância em que vive.

Portanto, é na comunicação com o outro que buscamos a experiência de nos sentirmos vivos, de tal forma que nossas experiências no nível puramente físico tenham ressonâncias internas no mais profundo do nosso ser e da nossa realidade. Contudo, só vamos compreender o outro e o mundo em que vivemos se agirmos com delicadeza, compaixão, dialogando e examinando os pontos de vista de cada um, procurando ouvir mais o outro. Porque quando alguma coisa dói em nós, só vamos resolver a custa de muita conversa, ou seja, falando sobre nossos medos e nossas dores, assim como ouvindo os medos e as dores do outro, sem censura. A verdade alivia mais do que machuca. E estará sempre acima de qualquer falsidade como o óleo sobre a água. Enfim, quando nos desesperamos, por não ser compreendidos, lembremo-nos que em toda a história, a verdade e o amor sempre venceram. Houve tiranos e assassinos, assim como psicopatas que pareciam invencíveis. Mas, no final, essas pessoas caem. Como dizia Nelson Rodrigues, “toda pessoa tem o seu dia de Hiroshima”.          

27 de novembro de 2021

SE O AMOR EXISTE, QUANDO SURGIU?

As pesquisas têm revelado que o amor é um fenômeno biológico e não apenas uma questão cultural como afirmavam até então os cientistas. Mas, o que é o amor? Até pouco tempo, cientistas assumiram que o amor era apenas um conceito presente na cabeça dos homens da cultura ocidental. Hoje, no entanto, a ciência vem revendo a sua posição e, segundo novas descobertas, publicadas na penúltima edição da revista Time, levam a crer que o romance é um fato biológico e não apenas uma questão cultural como se dizia. Estaria certo o poeta quando disse: “fundamental é mesmo o amor, é impossível ser feliz sozinho”.

Perguntas ainda se levantam. A primeira é porque, apenas agora, pesquisadores e filósofos se enveredaram por este caminho antes percorrido apenas por poetas e novelistas. São duas hipóteses: uma é a questão da Aids que está aí em nosso meio e o sexo casual agora carrega riscos mortais. A outra é o número cada vez maior de mulheres fazendo pesquisas nesta área, provavelmente elas levam o amor mais a sério. Independentemente do porque, o mais importante são as conclusões: o romance é real, está em nosso DNA. Em nossa biologia.

Para o psicólogo e pesquisador Lawrence Casler, autor do livro: “O Casamento é Necessário?”, que diz não acreditar no amor como parte da natureza humana, fica a questão; se nós podemos procriar sem necessariamente amar, porque muitas vezes o amor desabrocha no meio do caminho? Se o amor foi plantado nas cabeças por agentes como trovadores, a custa do que persiste até hoje? A esta altura todos já deveriam estar imunes.

Para desbancar a tese da herança cultural, os antropólogos William Jankowiak e Edward Fisher, publicaram um trabalho afirmando que encontraram evidências de amor romântico em 147 das 166 culturas que estudaram. O que as diferenciavam, segundo os pesquisadores, era a forma de expressar o sentimento, não necessariamente através de chocolates e flores, como se faz no mundo ocidental.

Os antropólogos que se propuseram a estudar o amor no passado, segundo os pesquisadores atuais, se enveredaram pelo lugar errado. Buscaram respostas nos rituais de casamento e cortejo. Em muitas culturas, como ficou provado, amor e casamento não anda junto. Em muitas sociedades os casamentos podem ter todo romantismo de um negócio de interesse de família ou território. Mas, mesmo nestas sociedades, onde a união é um acordo comercial, Jankowiak afirma que não se pode dizer que o amor não existe, pois ele se manifesta de forma clandestina, como um fenômeno com o qual temos que lidar.

Se o amor existe, quando surgiu? O ponto de partida do amor acredita os cientistas, foi quando deixamos de andar de quatro e passamos a usar apenas as pernas, colocando em evidência tanto nossos órgãos sexuais, como a cor dos olhos e a própria dimensão do corpo. Foi possível, então, tentar novas maneiras de fazer sexo amoroso, que possibilitaram fazer do sexo um encontro romântico. Os casais começaram a procurar posições que os deixasse face a face e a atração física passou a ter maior importância, principalmente, para despertá-lo o amor romântico. A natureza sabe como conduzir o DNA do amor.

O lado romântico das relações permitiu aos indivíduos estabelecerem relacionamentos de longa duração, fundamentais na criação dos filhos, pois em campos selvagens, tornava-se muito mais difícil zelar pela criança tendo ainda que cuidar da própria sobrevivência. Ficava mais fácil unir-se a um parceiro e, juntos, assumirem a criação dos filhos.

Esta ideia inicial levou a antropóloga e pesquisadora do comportamento humano Helen Fisher (1945), do Museu de História Natural de Nova York a tecer outras teorias, uma delas sobre a duração do amor. Enquanto a cultura ocidental prega que ele é eterno, na natureza, Fisher diz existir provas de que o amor foi feito para durar cerca de quatro anos. Ela cita a crise dos quatros anos, mostrada nas estatísticas de divórcio de pelo menos 62 das culturas que estudou. Se o casal tem outro filho três anos depois do primeiro, como geralmente ocorre, a união tende há durar quatro anos mais.

Por essa tese, o amor não é eterno. Por outra, também defendida por Fisher, o amor não é exclusivo. Segundo a autora dos livros: “Anatomia do Amor” “A História Natural da Monogamia” “Adultério e Divórcio”, menos de 5% dos mamíferos formam pares rigorosamente fiéis e, os seres humanos, desde o começo dos tempos, mantêm o padrão de monogamia com adultério clandestino. O que pode ser rotulado de sem vergonha, cafajeste. Para alguns pesquisadores, os estudos de Fisher provam serem uma maneira de se formar novas combinações de “gens” para serem passados para as gerações futuras. Além disso, os homens que buscaram novas parceiras tiveram mais filhos; enquanto as mulheres, sempre agindo por debaixo do pano, garantiam melhor a sobrevivência. Até as pré-históricas tendiam a ter relação extraconjugal.

O amor é tudo que precisamos, raramente funciona. Quem realmente quer aceitar seu parceiro pelo que ele é o tempo todo? Parece que o tempo todo não é uma expectativa muito realista. O respeito mútuo e a disposição para a mudança, negociação e acomodação até um ponto são necessários para manter um equilíbrio razoável e cultivar o romance ao longo dos anos. Talvez seja melhor encontrar alguém que vá tratar você bem o tempo todo, que seja honesto e respeitoso, de modo que o amor possa ficar cada vez mais solido. 

Portanto, penso que o amor nunca morre de morte natural. Sendo assim, ele pode morrer um dia porque nós não sabemos como renovar a sua fonte. Morre de cegueira e dos erros e das traições que eventualmente venha ocorrer. Morre da doença do ciúme e das feridas que ele nos causa. Morre de exaustão, da devastação que a falta de respeito provoca. Morre muitas vezes por falta de brilho. Nós não somos tomados pelo amor que não recebemos no passado, mas pelo amor que não estamos dando no presente. Contudo, o amor permeia entre o corpo e a alma, ultrapassando a dimensão biológica onde tudo começa, para o plenamente espiritual onde se conclui na sua essência cósmica. 

24 de novembro de 2021

ENVELHECER COM SABEDORIA ESTÁ NO VIVER PLENO

Vivemos uma grande transformação de costumes neste último século. A começar pela liberdade de ser e de se exprimir. Novos paradigmas estão surgindo, como a espiritualidade, o autoconhecimento, o afeto e a alegria. Somente nos últimos quarenta anos, a sexualidade deixou de ser negado, o que significa que essa temática também está ganhando terreno na maturidade.

Segundo a psicóloga e antropóloga Ana Perwin Fraiman, homens e mulheres mais velhos aprenderam muito mais sobre sexo do que sobre erotismo. A sedução fazia parte do cardápio de conquistas nos bailes da vida, no piscar de olhos, nos toques ligeiros e discretos, no tímido sorriso insinuante, no rastro de perfume deixado no ar. Muito diferente do erotismo de hoje, com a exposição explicita do corpo, usando aquele fio dental ou uma minissaia, em muitos casos, até o nu total.

Alguns homens mais velhos dizem apreciar um corpinho lindo desnudo de uma moça jovem, mas a maioria se excita muito mais com um decote insinuante ou uma nuca exposta daquela coroa enxuta para ser levemente roçada por seus lábios quentes. Há uma gama considerável de mulheres acima de cinquenta anos que não conseguem sequer imaginar tendo relações sexuais com outro homem que não os respectivos maridos, além de algumas mulheres que nunca folhearam uma revista pornográfica por questões morais ou porque sentem vergonha e não têm coragem.

Entretanto, há mulheres dessa mesma idade cujo casamento acabou e estão namorando novamente ou tendo um caso, por ser mais atrativo e menos desgastante. São mulheres decididas, buscando um novo parceiro, fazendo sexo e sentindo prazer, coisa que não sentia no casamento. Coisa do gênero, “primeiro a gente faz sexo, se der certo e a gente gostar continua, mas casar de jeito nenhum”. Curiosamente essa era uma proposta tipicamente masculina e chegava a ser ofensiva para a mulher de outra época. Hoje temos uma grande variedade de situações, até as coisas ditas sexuais estão mudando também para as mulheres maduras.

Por conseguinte, a mulher madura busca um homem gentil, protetor se solicitado, que tome iniciativas e satisfaça alguns de seus desejos. Que seja responsável, atencioso, carinhoso e aceite carícia e as saboreie. Que saiba receber e se entregar, que viva o erotismo no corpo todo, cujo encontro não seja só sexo, mas também celebração. Essa nova mulher quer um homem sensual, de prazer pleno difuso, com o qual nasce para saber aproveitar a vida de várias formas, o que só acaba com a própria morte.

Por outro lado, está o homem maduro, que busca uma mulher ativa, segura, provocante. Traduzindo melhor, uma mulher gostosa, quente, que goste de ser apreciada, que goste de fazer sexo, que goste de dar prazer, que fique excitada quando está junto do seu parceiro. Entretanto, são poucas e raras as pessoas que chegam a idade madura na plenitude sabendo se abrir para a vida, dar e receber, fazendo do sexo uma contra dança de parceiros que se encontram, se apreciam, se realizem, caso venham a se separar, sentem falta depois e até mesmo saudades.

Quando os amantes conseguirem colocar o sexo num plano maior ligado à espiritualidade, isso ajudara as pessoas a se libertarem de seus medos, culpas e vergonhas, raivas e desesperos de solidão, tudo o que traz infelicidade e impedem a nós todos de amar para valer, em qualquer idade. Se nós não curarmos primeiro todas essas feridas, não se fará a revolução sexual na maturidade. E não há como curá-las a não ser por meio da informação clara, da palavra cuidadosa, do toque amoroso. Da verdade implícita. E mais que isto, a verdade sobre sexo e alegria, beleza e liberdade em qualquer idade. Diz um provérbio oriental: “se mergulhas e não encontras pérolas no mar, não penses que elas não existem”.

Portanto, ao nascer o nosso corpo ainda não foi escrito, no dizer do filósofo inglês John Locke, a nossa mente é como uma folha de papel em branco, uma tabua rasa, que durante a nossa experiência no mundo se incumbiu de imprimir. Com o passar dos anos a nossa própria história, a cultura, os desejos e a própria vida se escreveram e inscreveram. Para Fraiman, trazemos muitas biografias de uma mesma vida. Quase tudo o que foi possível lá está firmemente registrado no corpo e na mente. De modo que tal é a arte de envelhecer, que o sexo pleno, amoroso e maduro até parece saber e dominar a própria essência do ser humano.

20 de novembro de 2021

A MILENAR ARTE DO AMOR TÂTRICO

Quando se redescobre a milenar arte do amor Tântrico, a forma apressada e neurótica do moderno relacionamento entre os amantes melhora e muito. A relação deixa de ter a característica compulsiva a qual destrói os mais belos vínculos de afeto e de ternura que possam vir a existir, comprometendo consideravelmente a harmonia e a felicidade dos enamorados. O amor Tântrico dignifica e enobrece o ser humano propiciando o seu retorno à inocência original, fazendo renascer os mais puros sentimentos de amor e  o apelo de ascensão espiritual.

Não há nada mais delicioso que a aventura do encontro de duas almas que se amam verdadeiramente. A emoção que invade o coração da pessoa que está encantada com a outra é de importância vital para a prática do relacionamento Tântrico. Aqueles que praticam sentem-se renascidos, revitalizados, repletos de energia tântrica, de entusiasmo e alegria.

Viver momentos de êxtase prolongado com descontração é viver momentos de paz nos braços da pessoa amada... ou isso tudo é considerado coisa do passado? Parece estar fora de moda ou no mínimo ocorre de maneira fugaz, sem profundidade, sem magia, sem nenhuma intimidade, excessivamente fácil. Os beijos, carinhos e carícias se banalizaram tanto que quase já não produzem assombro. Aquele tal arrepio. A mídia, de modo geral, tem contribuído muito para a robotização do amor. O mito de perfeição com relação ao homem e à mulher só tem aumentado e desvalorizado ainda mais o amor romântico.

Quantos casais se unem levados pela chama ardente do amor romântico que nasce do fundo da alma, se adoram e acreditam que nada e ninguém poderão separá-los. Quando menos esperam são traídos pelo inimigo secreto, o ego, essa legião de agregados psicológicos que destrói a beleza do amor puro e inocente.

Entretanto, a sabedoria Tântrica nos ensina que devemos nos concentrar nas afinidades que nos é peculiar e no amor que sentimos pelo outro. Procurando sempre visualizar através da imaginação criadora um quadro mental repleto de alegria, ternura, afeto no momento que suas almas e corpos se unem deliciosamente para a celebração com a divindade.

Portanto, viver o amor Tântrico é ambos estarem tranquilos e se ajudarem mutuamente. Quando a confiança estiver estabelecida, já não haverá mais regras. O amor se conduzirá por si mesmo e juntos percorrerão as mais belas e paradisíacas paisagens que ficarão marcadas para sempre na memória dos eternos apaixonados.  

15 de novembro de 2021

AMOR E DOR CAMINHAM JUNTOS

Como quer que pensamos o amor, encontramos nele a ideia da ultrapassagem de um estado natural originário, de unidade e satisfação superiores, quase divino, rompido por uma falta cometida pelo homem que o leva ao decaimento na finitude da sua condição propriamente humana (por exemplo, Adão e Eva).

Acrescente-se a isso a nostalgia de retornar àquele estado através da fusão com outro, tendo por base a relação sexual e a procriação, ou a simples “trocas dos corações”, como no amor trovadoresco.

Os mitos de Adão e Eva, os andróginos partidos ao meio de “O Banquete” de Platão, o filho expulso do ventre da mãe, onde repousava imune a todo desejo e desprazer, a proibição do incesto; mas, também as lendas de “Tristão e Isolda”, as tragédias românticas, de “Romeu e Julieta” até “Love History”.

De modo que, quase tudo da poesia lírica ocidental, não cessam de evocar, direta ou indiretamente, a ideia desse estado de fusão que faz de duas pessoas, tornar-se uma e, simultaneamente, a sua absoluta impossibilidade, porque ele implicaria o retorno a uma condição originária doravante interditada aos humanos.

Portanto, no amor a face do outro é o espelho onde compreendemos no mais alto grau possível o que significa humanidade porque amo sua vida humana, se o amor é autêntico, amo o que ele é, não o que ele tem (riqueza material ou um corpo bonito). O amor é parte de um prazer que o filósofo alemão Schopenhauer, chamava de prazer negativo. O amor funciona como um remédio para sensação desagradável de desamparo.

14 de novembro de 2021

AMAR É UMA TRAJETÓRIA DE VIDA PESSOAL

É um desafio falar sobre o amor. Afinal, o amor é falado em todo lugar, embora não saibamos bem o que é amor. Quando vemos o que a outra pessoa pensa do amor, podemos até nos sentir “atacados”, pensar: “isso não é amor”. Às vezes você já percebeu que não há amor onde o outro acredita que exista, você tem outra visão, ou nem sentiu nada disso, pensa ser uma fantasia.

Cada um tem uma noção de amar. Se alguém apenas viu pessoas reclamando sobre não serem amadas, exigindo amor para terem uma postura ética, e não o dando a ninguém, provavelmente vai se questionar onde está amor nisso. Se não viemos de lares onde havia amor, será mais difícil perceber o que é amar ou até acreditar que ele exista.

Frequentemente repetimos padrões do ambiente no qual fomos criados. Quando crianças podemos até perceber o que não é amor, mas, ao mesmo tempo, vamos assimilando a ideia de amor que vemos para sobreviver. Assim, amar é perceber que cada um está tendo uma trajetória de vida, vendo o tema amor por ângulos diferentes. 

Quem sabe, um dia, todos já vão ter passado por todas as etapas da vida, e nem vão estar olhando para o mundo de fora, mas para o mundo de dentro, buscando o “Eu” em si mesmos. Na vida desenvolvemos uma sequência de diferentes afeições. A criança tem interesse pela suas coisas, seus brinquedos, no envolvimento entre seu pensamento e o seu meio. Nisso, as primeiras trocas entre o seio materno e o bebê são, como sabemos, muito importantes.

O grau de envolvimento passa pelas necessidades de alimento e prazer. Em algum momento da infância poderá vir o pensamento de que “não é bom quebrar o brinquedo”, “não é bom morder pessoas”, desenvolvendo a consideração pelo que o outro sente, a empatia. O amor se desenvolve dessas formas, inclusive o amor “ágape”, o amor incondicional, ao desejarmos o bem do próximo, apesar das próprias frustrações.

Portanto, ter pensamento de respeito por todas as formas de vida, e que cada um atinja o seu potencial, sem expectativas, sem pedir nada em troca, nem mesmo o prazer de ver isso acontecer. E o amor provavelmente vai além, com considerações cada vez mais abrangentes sobre diversos aspectos, que o pensamento humano ainda nem conseguiu atingir.

7 de novembro de 2021

O ABRAÇO SIGNIFICA PROTEÇÃO IMUNOLÓGICA

Parece que as pessoas e os parceiros afetivos, tanto homens como mulheres, estão se esquecendo de que as relações humanas precisam ser nutridas e adubadas todos os dias para se manterem vivas, essa não parece ser uma tarefa impossível, pois há de se praticar os exercícios naturais de constantes carícias como o abraço, palavras carinhosas de incentivo e aceitação do outro.

A carícia significa toda a manifestação humana física, verbal ou gestual que transmita a outra pessoa uma sensação de bem estar, aceitação e reconhecimento. Uma manifestação que demonstre o quanto ela é importante para você. Melhor do que falar sobre carícias é recebê-las ou praticá-las.

Os estudos vêm demonstrando que a falta ou a insuficiência de carícias tem enorme influência no bem estar, até mesmo na saúde física e mental das pessoas. Fenômeno esse que começa nos primeiros anos de vida. Especialistas são unânimes em afirmar que a criança precisa tanto de estímulos físicos quanto de alimentos. Sem os toques e carícias, ela provavelmente acabará sofrendo de alguma debilidade mental e poderá até morrer por sentir-se rejeitada, caso seja privada dessas relações físicas.  

Segundo o filósofo e psiquiatra canadense Eric Berne (1910-1970), criador da “Análise Transacional”, ele acredita que exista na nossa estrutura corporal uma cadeia biológica que leva da privação emocional e sensorial a mudanças degenerativas e até a morte por causa da apatia. Neste sentido, as fomes de contato físico, de abraços e de aconchego têm a mesma relação com a sobrevivência de um organismo humano quanto à fome de alimento.

Portanto, o livro “O Tocar”, escrito pelo antropólogo e humanista inglês Ashley Mantagu (1905-1999), nos mostra o fantástico valor psicológico, salutífero, social e afetivo do contato físico. O livro fala da importância da envolvência, carinho e contato como ações que estimulam a idade vital. Contudo, o contato físico é o melhor estímulo conhecido para a defesa do sistema imunológico que são as trocas de carícias bem feitas e bem recebidas. De modo que para o pesquisador, o melhor remédio para aliviar o stress são as carícias, entre elas o abraço prolongado.

2 de novembro de 2021

SOU AQUELE QUE ENXERGA ATRAVÉS DAS PALAVRAS

Gostaria de ser um feiticeiro ou bruxo, aquele que enxerga através das sombras do inconsciente. Como não sou, escrevo. O escritor brasileiro Guimarães Rosa (1908-1967) reconhecia que poesia e magia eram irmãs, e confessava abertamente ser um alquimista que trabalhava com o sangue do coração humano. E acho mesmo que foram seus sucessos alquímicos que o levaram à morte aos 59 anos. Deus percebeu que, se ele vivesse um pouco mais, acabaria por descobrir o segredo do poder divino de falar e fazer acontecer, que é a essência da magia. Feiticeiros são aquelas pessoas que carregam o poder de falar e fazer acontecer, trazem o poder da magia nas palavras. Se alguém duvida que o escritor seja um feiticeiro que se entrega ao prazer supremo de escrever, leia o poeta e escritor português José Saramago (1922-2010). Eu ficava angustiado só de pensar na possibilidade da sua morte. Infelizmente ele faleceu no mesmo ano que minha mãe (2010). Para mim se Saramago parasse de escrever, ficaria para sempre triste, pensando no mundo fantástico, que moravam na sua alma e que não tiveram tempo de nascer.

Talvez seja esta a razão por que Deus criou o mundo, só para ter o prazer de ler os livros que o coração bruxo é capaz de escrever. Porque as histórias não são invenções dos homens, não lhes pertencem. Flutuam livres no espaço como o vento, e vão aparecendo aqui e ali, e se deixam contar de diferentes formas, como se fossem variações de um tema eterno que a ninguém pertence e que pertence a todos. Uma estória que marcou muito para mim, foi contada pelo escritor colombiano, Prêmio Nobel de literatura, Gabriel García Márquez (1927-2014), sob o título: “O Afogado Mais Lindo do Mundo”. Ele mistura ficção com realidade, uma estória fantástica que vou contar. Conta-se que numa aldeia de pescadores perdida no fim do mundo, onde a vida tinha sido engolida pelo tédio, e tudo era o mesmo, e se sabia de antemão o que cada um iria falar, os homens e as mulheres enfadados do amor, pois dele se haviam esquecido, e viver não era melhor que morrer.

Foi então que apareceu na praia um corpo de um afogado. Tinha que ser enterrado. E o costume era que as mulheres preparassem os cadáveres para a sepultura. E foram isto que fizeram os homens de fora, por medo da morte, as mulheres lá dentro, limpando aquele corpo das algas e das coisas verdes do mar. E o silêncio era grande porque sobre o morto desconhecido não há o que falar. Até que uma delas notou que ele era alto demais, e comentou que se ele tivesse vivido na aldeia teria de ter abaixado sempre a cabeça para entrar em suas casas. No que todas concordaram. Foi então que outra olhou para sua boca silenciosa, e perguntou a todas sobre as palavras que dela teriam saído. Seria como o barulho das ondas ou como o sussurro da brisa? E os seus corpos arrepiaram, só de pensar no seu sopro quente aos seus ouvidos e sorriram. E se ouviu então a voz de uma terceira que falava sobre aquelas mãos inertes, tão grandes. Teriam sido ternas? Teriam sabido agradar e acariciar? Teriam sabido abraçar? E todas riram.

Os maridos, de fora, perceberam que o corpo morto do afogado tinha um poder sobre o corpo vivo de suas mulheres que nem mesmo eles possuíam. Quem estaria mais morto? E tiveram inveja do morto com quem sonhavam e seus corpos ficaram mais altos, seus rostos, mais francos, suas mãos, mais bonitas. Termina a estória dizendo que finalmente enterraram o morto. Mas a aldeia nunca mais foi à mesma. No evangelho tem a lenda de um tanque mágico. Vez por outra, inesperadamente, um anjo descia dos céus e agitava as águas. O primeiro a entrar na água ficava curado. Da árvore brota a flor e através do espírito vem o amor. Vez por outra, inesperadamente, essa flor cai, e aquele que apanhar e presenteá-la a um espírito será agraciado pelo amor.

Por conseguinte, conta-se também de outro morto que volta quando se come o pão e se bebe o vinho. Segundo se acredita, quando isto acontece os velhos viram crianças, os pesados se põem a voar, os esquecidos do amor se põem a amar, os mortos voltam a viver. Fico no meu canto, rindo, imaginando o prazer do feiticeiro que, malicioso, bolou todas estas coisas, contando a mesma estória da terra onde o nunca é sempre, pensando que talvez, os moradores de outra aldeia, assentados diante da televisão, criarão coragem, e as mulheres comerão da flor e se esquecerão de vassouras e Shopping Centers para ficar mais bonitas e os homens, políticos corruptos, políticos tolos, educadores domesticados, avarentos mesquinhos. Enamorar-se-ão da lua, ficarão leves e aprenderão a voar nas asas do amor.

POEMA INSTANTE DO POETA JORGE LUÍS BORGES

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ...