3 de outubro de 2018

O TEMPO É APENAS UM FIO

No livro “Do Universo à Jabuticaba”, do nosso mestre, filósofo e educador Rubem Alves (1933-2014), traz uma frase que gosto muito e cito sempre que me é oportuno: “Senti que o tempo é apenas um fio. Nesse fio vão sendo enfiadas todas as experiências de beleza e de amor por quem passamos. Aquilo que a memória amou fica eterno”. Para mim tudo que é belo tende a morrer. Beleza e morte andam sempre de mãos dadas. Eternidade é o tempo completo, esse tempo do qual a gente diz: “valeu a pena”. Não é preciso evolução, não é preciso transformação. O tempo é completo e a felicidade é total. Nele, a alma não encontra morada. A sua morada está no amor. Qual a magia que informa os ipês, todos eles, em lugares muito diferentes? Qual é hora de perder as folhas e florescer? E sem misturar as cores. Primeiro os rosas, depois os amarelos e, finalmente, os brancos. Seria bom se nós como os ipês, nos abríssemos para o amor.

A precisão dos números marca o tempo das máquinas. O tempo do amor se marca com o corpo. Um calendário é coisa precisa, pois marca anos, meses, dias, horas, que são marcados com números. Esses números medem o tempo. Mas os pedaços de tempo são bolsos vazios, que nada há dentro deles. O bolso vazio do tempo se torna parte do nosso corpo quando o enchemos com vida. Aí o tempo não mais pode ser representado por números. O tempo aparece como um fruto que vai sendo comido. À medida que vai sendo comido, vai acabando. Vem à tristeza. O tempo da vida se marca por alegrias e tristezas. Há inícios e há fins. O tempo foge, “carpe diem”, quer dizer: “colha a vida”. Colha o dia como um fruto que amanhã estará podre. Viver ao ritmo de alegrias e tristezas é ser sábio. Sábio do latim quer dizer: “eu saboreio”. O sábio é um degustador da vida. A vida não é para ser medida. Ela é para ser saboreada.

Por conseguinte, Heráclito (535-475 a.C.) foi um filósofo grego fascinado pelo tempo. Contemplava o rio e via que tudo é rio. Percebeu que não é possível entrar duas vezes no mesmo rio; na segunda vez, as águas serão outras, o primeiro rio já não existirá. Assim é a vida, tempo que flui sem parar. Para nós o tempo é um velho, cada vez mais velho, sobre quem se acumulam os anos que passam e de quem a vida foge. Heráclito diz que o tempo é criança, início permanente, movimento circular, o fim que volta sempre ao início, fonte de juventude eterna, possibilidade de novo começo. Senti que o tempo é apenas um fio. Nesse fio vão sendo enfiadas todas as experiências de beleza e de amor pelo qual passamos. Aquilo que a memória amou fica eterno. Complemento a frase para dizer que houve muitos momentos de tanta beleza em minha vida, que eu disse para mim mesmo: “Valeu a pena viver toda a minha vida até aqui, só para poder ter vivido esses momentos. Há momentos efêmeros que justificam toda uma vida de amor e esperança”.

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