18 de julho de 2018

VIVER O AMOR COMO MEIO E NÃO COMO FIM

Está mais que na hora de substituir o ideal romântico do amor, que basta em si, por uma relação que traga crescimento individual. Penso que há algo de errado na forma como temos vivido nossas relações amorosas. Isso é fácil de ser constatado, pois temos sofrido muito por amor. Se o que anda bem tem que nos fazer felizes, o sofrimento só pode significar que estamos numa rota equivocada. Segundo o psiquiatra Flávio Gikovate, desde criança aprendemos que o amor não deve ser objeto de reflexão e de entendimento racional, que deve ser apenas vivenciado, como uma mágica fascinante que nos faz sentir completos e aconchegados quando estamos ao lado daquela pessoa que se tornou única e especial.

No entanto, aprendemos que a mágica do amor não pode ser perturbada pela razão, que devemos evitar esse tipo de “contaminação” para podermos usufruir integralmente as delícias dessa emoção. Mas, na maioria das vezes não tem dado certo. Vamos pensar sobre o tema com sinceridade e coragem. As ideias que governam nossa visão de amor precisa ser revista. Imaginamos sempre que um bom vínculo afetivo significa o fim de todos os nossos problemas. Nosso ideal romântico é assim: “duas pessoas se encontram, compõem um forte elo de grande dependência, sentem-se preenchidas, completas e sonham. Pensam em refugiar de tudo e viver inteiramente uma para a outra, usufruindo o aconchego de ter achado sua cara metade”.

Nada parece nos faltar. Quem não viveu isso? O que antes valorizavam, como dinheiro, aparência física, trabalho, posição social, parece não ter mais a menor importância. Tudo o que não diz respeito ao amor se transforma em banalidade, algo supérfluo que agora pode ser descartado sem o menor problema. Sabemos que quem quis levar essa fantasia do amor como um fim, se deu mal. Com o passar do tempo, percebe-se que uma vida reclusa, sem novos estímulos, somente voltada para a relação amorosa, muito depressa se torna tediosa e desinteressante.

Podemos sonhar com o paraíso perdido ou com a volta ao útero, mas não podemos fugir ao fato de que estamos habituados a viver com certos riscos, certos desafios, que nos fazem muito bem. De certo modo, a realização do ideal romântico corresponde à negação da vida. Visto por esse ângulo, o amor é um aditivo contra a vida, pois em nome dele abandonamos tudo aquilo que até então era a nossa vida. No primeiro momento até podemos achar que estamos fazendo uma boa troca, mas rapidamente nos aborrecemos com o vazio deixado por essa renúncia à vida. A partir daí, começa a irritação com o ser amado, agora entendido como o causador do tédio, como uma pessoa pouco criativa e desinteressante. O casal rompe e cada um volta à sua vida anterior, levando consigo a impressão de ter falido em seu ideal de vida.

Somos todos carentes e achamos que o amor é a mágica que dá significado à vida. O que nos falta aparece sempre idealizado, como o elixir da longa vida e da eterna felicidade. Diariamente a realidade tem nos mostrado que as coisas não são bem assim, e acho importante aprendermos com ela. Nossa concepção de amor deve se basear em fatos, nossos projetos têm que estar de acordo com aquilo que costuma dar certo no mundo real. Fantasia e sonhos, ao contrário, têm origem em processos psíquicos ligados às lembranças e frustrações do passado. O amor tem o seu papel como meio e não como fim.

Portanto, se é verdade que o amor nos enche de alegria, vitalidade e coragem – e isso ninguém contesta – por que não direcionar essa energia para ativar ainda mais os projetos nos quais estamos empenhados? Quando amamos e nos sentimos amados por alguém que admiramos e valorizamos, nossa autoestima cresce e nos sentimos dignos e fortes. O amor tomou conta do nosso ser como meio e não como um fim. Tornamo-nos ousados e capazes de tentar coisas novas, tanto em relação ao mundo exterior como na compreensão da nossa subjetividade. Em vez de ser um fim em si mesmo, o amor poderia funcionar como um meio para o aprimoramento individual, nos curando das frustrações do passado e nos impulsionando para o futuro. Casais que conseguem viver dessa maneira, crescem e evoluem. E sob essa condição, seu amor se renova e se revitaliza. Contudo, são capazes de dizer um ao outro: “sua ternura e amizade são tão preciosas para mim, que ainda posso me sentir feliz e severamente grato, quando olho para você dentro de mim. Só espero que essa ternura e amizade nunca me abandonem”. Como diz a música: "Eu queria ser um anjo".

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