31 de agosto de 2021

OUVIR EXIGE HUMILDADE DE QUEM OUVE

Como muito bem argumentou o psicanalista, filósofo e educador Rubem Alves (1933-2014) em uma de suas belas crônicas: “o ato de ouvir exige humildade de quem ouve. E a humildade está nisso: saber, não com a cabeça mas com o coração, que é possível que o outro veja mundos que nós não vemos”. Mas, admitir que o outro vê coisas que nós não vemos, implica reconhecer que vemos pouco ou errado. Bernardo Soares diz que aquilo que vemos é aquilo que somos. (Bernardo Soares é um tipo particular dentre os heterônimos do poeta e escritor português Fernando Pessoa. Ele é o autor do livro Desassossego).

Assim, para sair do círculo fechado de nós mesmos, em que só vemos nosso próprio rosto refletido nas coisas, é preciso que nos coloquemos fora de nós mesmos. Não somos o umbigo do mundo. E isso é muito difícil: reconhecer que não somos o umbigo do mundo! Para se ouvir de verdade, isso é, para nos colocarmos dentro do mundo do outro, é preciso colocar entre parêntesis, ainda que provisoriamente, as nossas opiniões.

Minhas opiniões! É claro que eu acredito que as minhas opiniões são a expressão da verdade. Se eu não acreditasse na verdade daquilo que penso, trocaria meus pensamentos por outros. E se falo é para fazer com que aquele que me ouve acredite em mim, troque os seus pensamentos pelos meus. É norma de boa educação ficar em silêncio enquanto o outro fala. Mas esse silêncio não é verdadeiro. É apenas um tempo de espera: estou esperando que ele termine de falar para que eu, então, diga a verdade.

A prova disto está no seguinte: se levo a sério o que o outro está dizendo, que é diferente do que penso, depois de terminada a sua fala eu ficaria em silêncio, para ruminar aquilo que ele disse, que me é estranho. Mas isso jamais acontece. A resposta vem sempre rápida e imediata. Para Rubem Alves resposta rápida quer dizer: “Não preciso ouvi-lo. Basta que eu me ouça a mim mesmo. Não vou perder tempo ruminando o que ele disse. Aquilo que ele disse não é o que eu diria, portanto está errado”.

Portanto, a luta pela felicidade em vida. A revolta por tudo aquilo que, embora lógico, não faz sentido (e, ainda assim, é aceito!). A palavra que é sentida pelo coração, como olhar para uma árvore, uma horta, uma amizade, a arte, Deus, o milagre da natureza e até mesmo a morte. Todos eles ganham uma nova dimensão quando paramos para olhar e ouvi-los. Temos que aprender a ter paciência, saber ouvir e a colocar-se no lugar do outro, por pior que este seja, pois quem ouve e compreende tem o dom de se colocar na mesma situação, entende o problema, e dá força para juntos encontrem a solução. As vezes fazemos as escolhas erradas para chegar ao lugar certo.

Um comentário:

  1. Belo texto... Ouvir exige muito... Precisamos praticar a escuta... A escuta empática e atenta.

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