16 de dezembro de 2017

O AMOR COMO BUSCA DA COMPLETUDE

Acho muito difícil e complexo comentar de uma forma nova um assunto que já conhecemos. Temos uma forte tendência conservadora, que nos leva a rejeitar, ao menos num primeiro instante, qualquer ideia que não esteja em concordância com o que já sabemos. Trago para esta reflexão o outro lado do amor. Ou seja, o avesso de tudo aquilo que acreditamos que seja o amor. E o mais difícil ainda é a pessoa enxergar seu aspecto menos simpático. No entanto, o amor corresponde a uma busca de completude. Todos nós, desde o inicio da vida, temos a sensação de sermos incompletos. Parece que só nos sentimos inteiros e em paz quando estamos com o nosso eleito. Sendo assim, é óbvio que nosso primeiro amor é nossa mãe, e todos os outros objetos de amor que venhamos a ter ao longo das nossas vidas serão substitutos dela. Desse modo, passamos a viver com o outro uma relação infantilizada.

No entanto, quase todas as crianças são extremamente dependentes de suas mães, com as quais têm a sensação de estarem fundidas. Sentem-se inseguras quando estão longe delas e vivem atormentadas pelo pesadelo de que ela poderá abandoná-las ou morrer. Quando refletimos sobre as relações amorosas entre adultos, percebemos que o modo como se unem é muito semelhante ao sentimento que liga uma criança à sua mãe. A grande verdade é que os ingredientes negativos relacionados ao ciúme também se manifestam de uma forma muito intensa. É por causa disso que costumamos perceber o amor como um sentimento que acaba se opondo de modo mais ou menos definitivo aos desejos de individualidade. O amor adulto é uma cópia do que se passa na infância. O discurso é mais racional, mas as reações são idênticas às das crianças. Casais apaixonados se tratam com certo mimo infantil e gostam também de receber agrados infantis. Não sabem dialogar quando necessário.

Entretanto, esses pequenos detalhes não seriam importantes se não viessem acompanhados da noção, que aqueles que se amam têm direito sobre seus amados. A mãe se acha com direito sobre seus filhos e isso, até certa idade, faz sentido. Agora, que o marido possa dizer à esposa se ela pode ou não usar determinada roupa, se pode ir ou não a um dado lugar, é uma ofensa aos direitos individuais. O outro tipo de relacionamento íntimo que vivenciamos é o da amizade. Aqui, o prazer da companhia é tão importante quanto o que existe nas relações chamadas amorosas. A confiança recíproca, o vinculo criado e a cumplicidade costuma ser até maiores do que as alianças encontradas entre os que se amam. Somos mais respeitosos e menos dependentes de nossos amigos. Diz a sabedoria milenar que toda relação amorosa é uma longa conversa, entre duas pessoas amigas.

Portanto, qual a conclusão que tiramos disso? Para mim, fica claro que o amor é um processo infantil que costuma se perpetuar ao longo da nossa vida adulta. A amizade é um tipo de aliança muito mais sofisticada porque não busca a fusão e sim a aproximação de duas criaturas que tenham importantes afinidades e interesses em comum. Nossa parte adulta estabelece vínculos respeitosos e ricos em intimidade, que correspondem à amizade. Nossa parte infantil tende a estabelecer um elo único com outra pessoa, em relação à qual passamos a ter expectativas similares àquelas que tínhamos de nossa mãe. Não tenho nenhuma dúvida a respeito: “amizade é um processo muito mais adulto do que aquele que chamamos de amor”. Aquele que se diz amar é o que mais machuca o seu amor. Só posso dizer que nesse amor infantilizado, não há completude.

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