1 de agosto de 2020

O DESEJO NÃO DEPENDE DA NOSSA VONTADE

Na maioria das vezes as pessoas em geral, não tem o hábito da reflexão, a não ser por necessidades comuns do cotidiano. Geralmente, não distinguimos o desejo da vontade, e isso é um dos grandes problemas. Sem pensar ou refletir, agimos por impulso e não percebemos que esse impulso – desejante ou reativo – é resultante do que sentimos e se não refletir o que sentimos, certamente agimos na maioria das vezes de maneira equivocada pela perturbação emocional. Vontade é agir de acordo com a reflexão racional e o desejo é agir apenas por impulsos.

Para dialogar sobre a vontade e o desejo trago o filósofo alemão Immanuel Kant (1724-1804), fundador da “Filosofia Crítica”, um sistema que procurou determinar os limites da razão humana. Sua obra é considerada a pedra angular da filosofia moderna. No seu livro “A Crítica da Razão Pura”, ele nos contempla com uma profunda análise moral e distintiva de desejo e vontade; e convida-nos à reflexão sobre as nossas escolhas. Ao estudarmos ética, num contexto histórico de antropologia sociológica, não é difícil entrever a influência negativa da sociedade atual que, através de padrões balizados na importância da personalidade, vêm modelando a conduta humana de maneira cada vez mais egoísta, reativa e intolerante, influenciando de modo decisivo as nossas escolhas.

De modo que, desejo é tudo o que emerge do pensamento à ação sem que se possa controlar; é o impulso instintivo, é a avidez pelo prazer das sensações. Já a vontade, é a ação regida pela razão, independentemente da corrente dos desejos, ou seja, é o uso da razão para deliberar escolhas. Muito diferente de desejo, vontade é o saber materializado em conduta; é tudo o que o pensamento produz para se sobrepor aos instintos, a fim de viver melhor. Sendo assim, a fronteira entre a vida boa e a vida ruim, está no descolamento entre a racionalidade e o impulso desejante, ou seja, entre a vontade e o desejo. De modo que, a vontade percebe que, apesar do desejo, é possível viver na contramão dos instintos. A isso chamamos liberdade, que é a soberania da competência deliberativa sobre as próprias inclinações.

Porém, sou livre quando, ao flagrar meus desejos, consigo agir racionalmente, contrariando o que sugerem meus impulsos. A moral não é uma vigilância castradora, mas, é um olhar sobre si mesmo; é um lugar na mente onde a reflexão impõe os limites que imperam a conduta. No entando, basta não conhecer as próprias fraqueza para se tornar escravo dos apetites que possui. O que difere o ser humano dos outros animais é a sua capacidade de pensar para agir, de modo que, aquele que se conduz pelos seus instintos e inclinações, aproxima-se da animalidade; mas, aquele que age pela via da razão, aproxima-se de sua destinação moral.

No entanto, ao entender a felicidade como acúmulo de desejos saciados, o ser humano tende a priorizar a busca pelos prazeres dos sentidos e das vaidades, sem perceber que quanto mais se sacia um prazer biológico ou vaidoso, mais estravagantes e intensos estes prazeres terão de ser futuramente, a fim de se obter o mesmo nível de satisfação sempre. Porém, a fase de vontade surge, frequentemente, quando os excessos decorrentes da saciação dos apetites resulta em adoecimento físico ou psicológico. Observando o comportamento humano na sociedade atual, percebemos que a maioria necessita do sofrimento para compreender que, a saciação de desejos não representa um estado real de felicidade ao longo do tempo.

Portanto, só posso concluir que é um sentimento de total insatisfação que tende a levar o homem à busca e compreensão de si mesmo. Liberto da prisão de apetites que o faz sofrer, contudo, sentindo-se livre ele vai a busca do aprendizado virtuoso balizado na razão, descrito por Kant. De modo que, a razão inclinada ao aprendizado ético-moral produz, por consequência, equilíbrio e serenidade; e, num mundo caótico, caracterizado pela competição em busca de euforia e saciação de apetites perturbadores. Por acaso, isto não seriam o equilíbrio e a serenidade a própria felicidade? Pense nisso!


Nenhum comentário:

Postar um comentário

POEMA INSTANTE DO POETA JORGE LUÍS BORGES

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ...