28 de agosto de 2016

DA FANTASIA BROTA O DESEJO

Dizem os sábios orientais que a única maneira de não ficar louco é mergulhar de uma vez na loucura. Fugir dos fantasmas não é o melhor remédio. Espantá-los também não ajuda, pode até ser pior. De modo que a fantasia é a porta de entrada, para esse universo simbólico. No entanto, o que nos difere de um animal irracional é a nossa capacidade de fantasiar. Então, por que nos reprimimos? O menino começa a ter curiosidade e a imaginar como é a menina e vai formando uma imagem na sua cabeça, vai idealizando um modelo de mulher. A partir daí formará um ideal de amor que vai surgir na idade adulta, todo o processo do apaixonar-se um pelo outro e ambos passam a enamorar através da fantasia, que cada um faz da outra pessoa. É aqui que começa o primeiro movimento do adolescente cercado de conflitos. Surge o interesse pelo outro, mas ao mesmo tempo é de negação do próprio desejo, quanto ao fato da outra pessoa ser interessante. Isto ocorre em função da primeira marca que fica da dor de amor.

Entretanto, quanto maior a expectativa, maior a frustração, assim como os cuidados que devemos ter para não exagerar nas cobranças. Tendo como parâmetro o sentimento inicial das trocas prazenteiras que estão surgindo. De modo que o momento pode ser assustador, desdenhar faz parte do processo normal do encantamento principalmente na adolescência. É não assumir o outro como objeto do nosso desejo, com medo de nos frustrarmos e sofrermos de novo. Evitamos esse desejo, até percebermos que temos alguma chance. Todavia, neste ponto inicia-se o processo de conquista e descoberta do amor.

No processo de conquista muitas coisas vão acontecendo. Há um interesse intelectual um pelo outro, o jeito da pessoa, o tom da voz, o sorriso, o encantamento vai se desenrolando bem devagar. O chamado amor à primeira vista, que pode acabar no instante seguinte dependendo da expectativa criada por ambos. Os dois são responsáveis diretos para a continuação ou não desse vínculo. No momento da conquista, o desejo é transferir aquilo que sente pelo outro para dentro de um vínculo. O primeiro grande erro estratégico é querer transformar logo o que sente em namoro, antes de entender o significado dessa relação. O namoro é uma instituição onde existe um contrato tácito, ou seja, um compromisso moral. Como todo compromisso vira obrigação, ao mesmo tempo você está matando a fantasia e o desejo que sentem um pelo outro. É nesse momento que começam as cobranças. Vida de obrigação ninguém aguenta.

Entretanto, o namoro neste contexto só serve para matar a fantasia, o carinho, o desejo e a magia que existe entre os amantes. A relação fica um vazio, um buraco. Por essa razão que a grande maioria das pessoas vive insatisfeita na sua subjetividade. Brigam o tempo todo para conquistar um ao outro e, quando conseguem aquilo que queriam, agora não querem mais, talvez quisessem outra coisa que o outro não pode oferecer. O processo de desejar é um contínuo sim para muitas pessoas. Quando consegue, não sabe o que fazer, então descarta toda a possibilidade desse amor vingar. Certamente vai sair à procura para preencher esse vazio, é o momento do “ficar”. Na verdade, é um momento de muita ansiedade, o ficar é uma relação rápida de percepção curta em que, via de regra, existe uma paixão fugaz, pouco duradoura. Muitas pessoas só entram nessa por medo de ficarem sozinhas.

O que assusta no amor é que há uma identificação, aquele amor paixão, o amor dos iguais, no qual um olha para o outro e vê algo igualzinho a si próprio. Pensam exatamente as mesmas coisas. Antes de um proferir alguma frase o outro já fala a frase. Existe uma sincronicidade nessa relação, usando uma linguagem junguiana. As chamadas coincidências. Gostam das mesmas coisas. São capazes de ficarem horas conversando e não conseguem esgotar o assunto. A complementação desse amor são as diferenças, mas juntos formam um casal perfeito. Muitos amantes não conseguem se separar porque não sentem capazes de enfrentar o mundo sem aquilo que o outro tem e me completa. Significa amar no outro tudo aquilo que falta em mim, então eu fantasio e desejo o que me falta.

Portanto, quando perdemos alguém que amamos, achamos que nunca mais vamos conseguir nos apaixonar. Junto morre a fantasia e o desejo. Na verdade, o que outro fez por nós, foi nos mostrar que temos condições de amar e de nos apaixonar. Ninguém leva embora a nossa capacidade de amar. Amar é um dom da essência humana. O que fazemos é aguardar que um dia as fantasias e os desejos ressuscitem novamente com a chegada de outra pessoa que venha e consiga despertar esse sentimento nobre outra vez. Tendo em vista que a lembrança permanece, pois cada um é único na sua essência. Jamais o esqueceremos.  

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