28 de fevereiro de 2013

ESCONDE-ESCONDE DOS SENTIMENTOS

Há pouco tempo li um texto escrito pelo filósofo e jornalista Waldir Pedro, que é uma delicia, onde o autor brinca com as palavras, quero dividir aqui com vocês. Todavia, essa narrativa nos remete a uma reflexão profunda, pelo simples fato de mexer com os sentimentos e suas variações. Conta que certa vez reuniram todos os sentimentos e as qualidades do ser humano em algum lugar do planeta.

Entretanto, conta que quando o Aborrecimento havia reclamado pela terceira vez, a Loucura, como sempre tão louca, propôs-lhe: “vamos brincar de esconde-esconde?” A Intriga levantou a sobrancelha, intrigada e, a Curiosidade, sem poder conter-se, perguntou: “esconde-esconde? O que é isso?” "É um jogo, explicou a Loucura, em que eu fecho os olhos e começo a contar de um a um milhão enquanto vocês se escondem e, quando eu tiver terminado de contar, o primeiro de vocês que eu encontrar ocupará meu lugar para continuar o jogo".

O Entusiasmo dançou seguido pela Euforia. A Alegria deu saltos que acabou por convencer a Dúvida e até mesmo a Apatia, que nunca se interessava por nada. Mas nem todos quiseram participar. A Verdade preferiu não se esconder. Esconder por que, se no final todos a encontrariam? A Soberba opinou que era um jogo muito tonto (no fundo o que a incomodava era que a ideia não tinha sido dela) e a Covardia preferiu não se arriscar. Enfim, a Loucura começa a contar.

A primeira a esconder-se foi a Pressa que, como sempre, caiu atrás da primeira pedra do caminho. A Fé subiu ao céu, e a Inveja se escondeu atrás da sombra do Triunfo que, com seu próprio esforço, tinha conseguido subir na copa da árvore mais alta. A Generosidade quase não conseguiu esconder-se, pois cada local que encontrava parecia-lhe maravilhoso para algum de seus amigos. Se for cristalino, ideal para a Beleza, se for à copa de uma árvore, perfeito para a Timidez; se for o vôo de uma borboleta, o melhor era para a Volúpia. Se era uma rajada de vento, magnífico para a Liberdade. E assim acabou escondendo-se em um raio de sol.

O Egoísmo, ao contrário, encontrou um local muito bom desde o início, ventilado, cômodo, mas apenas para ele. A Mentira escondeu-se no fundo do oceano (mentira! Na realidade, escondeu-se atrás do arco-íris). A Paixão e o Desejo esconderam-se no centro do Vulcão. O Esquecimento não me recorda onde se escondeu, mas isso não é o mais importante. Quando a Loucura estava lá pelo 999.999, o Amor ainda não havia encontrado um local para esconder-se, pois todos já estavam ocupados, até que encontrou um roseiral e, carinhosamente, decidiu esconder-se entre as flores. Um milhão! Contou a Loucura e começou a busca.

A primeira a aparecer foi a Pressa, apenas a três passos de uma pedra. Depois se escutou a Fé discutindo com Deus, no céu, sobre zoologia. Vibraram a Paixão e o Desejo no Vulcão. Num descuido, encontrou a Inveja e, claro, pode deduzir onde estava o Triunfo. O Egoísmo não precisou ser procurado. Ele saiu sozinho disparado de seu esconderijo que, na verdade, era um ninho de vespas. De tanto caminhar, a Loucura sentiu sede e, ao aproximar-se do lago, descobriu a Beleza. A Dúvida foi mais fácil ainda, pois a encontrou sentada sobre um muro sem decidir de que lado se esconder. E assim foi encontrando todos. O Talento entre a erva fresca, a Angústia em uma cova escura, a Mentira atrás do arco-íris (mentira! Ela estava no fundo do oceano) e até o Esquecimento, que já havia esquecido que estava brincando de esconde-esconde.

Apenas o Amor não aparecia em lugar algum. A Loucura o procurou atrás de cada árvore, em baixo de cada rocha do planeta e em cima das montanhas. Quando estava a ponto de dar-se por vencida, encontrou um roseiral. Pegou uma forquilha e começou a mover os ramos, quando, no mesmo instante, escutou-se um doloroso grito. Os espinhos havia ferido o Amor nos olhos. A Loucura não sabia o que fazer para desculpar-se. Chorou, rezou, implorou, pediu perdão e até prometeu ser seu guia.

Moral da história! Desde então, desde que brincaram de esconde-esconde no planeta, ficou claro para todos os sentimentos, que o Amor é realmente cego e que a Loucura sempre o acompanha. Por conseguinte, só os loucos invertem a lógica do mundo. Muitos pensadores foram em, suas épocas, considerados loucos. A senhora razão tem prazer em tirar nossos momentos de delírio e nos diz que somos ridículos. Aprendi que se não houver paixão no que estamos fazendo, a gente surta. A única maneira de não ficarmos louco de uma vez, é embarcar nessa loucura que nos conduz ao Amor.


8 comentários:

  1. Realmente nos prende esse texto, muito inteessante e reflexivo!!!

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  2. Lindo! Obrigada
    Estava procurando o autor do Esconde-esconde dos Sentimentos e eis que, depois de muita procura, deparei-me com sua página com o nome dele. Obrigada

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  3. Carolina18:58

    Muito bom

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  4. escutei essa historia quando estava na quinta serie muito bom relembrar

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  5. Ótimo, muito bom, parabéns!!

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  6. Ouvi essa história esse ano ,ah pouco tempo um professor meu me disser em fim amei
    isso nos ajuda muito a reflexão em tudo

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  7. Sou contadora de histórias e essa história faz parte do meu repertório, boa demais de ouvir e de contar.

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