10 de julho de 2011

CONSUMIDOS PELO CIÚME

Podemos dizer que o ciúme é uma paixão democrática, porque não isenta nenhuma classe social, faixa etária ou nível cultural. E as pessoas seguem levando seus ciúmes ao auge da loucura e aos tribunais de justiça. São milhares pelo mundo afora. Da filosofia à poesia, passando pela mitologia e através das teorias psicanalíticas, não cansamos de procurar uma resposta que explique o ciúme, que particularmente a meu ver e de muita gente boa, o ciúme é o pior sentimento humano, porque ele impede a generalização do amor.
Entretanto, o ciúme supõe algo onde não há nada para justificá-lo. Essa suposição e a forma como se dá revelam o que aquela pessoa pensa sobre a outra quando ama alguém. O ciumento interpreta mal, apesar de estar em busca de compactuar com o desejo de proteger o suposto amor. Por essa atitude ele se mostra, antes de tudo, um pensador meticuloso referente às suas fantasias. Pequenos detalhes, como um tom de voz, uma palavra fora do contexto, pensar para responder, já está armada desconfiança. Inicia-se o processo de vigilância, de busca de certificações, suspeitas. Flagrar o ato criminoso torna-se a sua maior obsessão. A confissão do suposto traidor é esperada e temida ao mesmo tempo, mas sobretudo obrigatória. Quanto mais doentio for o ciumento, maior será a sua engenhosa reflexão, com métodos rigorosos que até as roupas são vistoriadas e cheiradas pelo ciumento.
Podemos avaliar a posição daquele que é tomado pelo ciúme a partir de duas vertentes. De um lado, o que Freud chamou de “ciúme projetado”, de outro o “ciúme delirante”. No caso do ciúme projetado, o desejo de  trair é transferido para o outro. Trata-se de conter nele o que a pessoa não reconhece em si, ou que reconhece e atualiza na forma de infidelidade e culpa. O equívoco deste tipo de ciúme é a suposição de que há simetria do desejo, ou seja, correspondência amorosa. Alguns chegam mesmo a se sentirem denunciados pelo ciúme. Afinal, como posso sentir ciúmes se não preciso dele? Deixar o outro com ciúme é uma estratégia clássica de sedução, torna inevitável a confissão amorosa, que não deixa de ser um delírio do ciumento. Nos dois casos, o ciúme entra para propor o objeto, sugerir que ali se encontrará o preenchimento da falta. A outra metade da laranja. O ajuste das necessidades subjetivas dos que nele se envolvem, é aqui que se dá a raiz do ciúme.
Todavia, isso faz o ciumento traduzir o que sente num ato amoroso. Se te vigio, se te amedronto, se te mato, na verdade, é porque te amo. Talvez não exista mal maior que esse, sinto ciúme porque te amo, te torturo com o meu ciúme por amor. Que estranha satisfação é essa do ciumento crônico? Esse tipo de ciúme é uma perseguição do amor verdadeiro, que poderia vir a ser um amor de grandes qualidades recíprocas. E, no entanto, a ilusão do amor verdadeiro, nesse caso é tão enganosa quanto a evidencia dos fracassos de uma relação, depois que ela se interrompe, depois de ambos entenderem que era um falso amor.  
Segundo o psicanalista Lacan, amar é dar o que não se tem. Para o ciumento, a fórmula funciona ao contrário, possuir, prender o outro, não perder de modo algum. Garantir que todo o seu desejo tenha um único endereço. Não pode haver um terceiro. Por outro lado, o próprio ciumento sabe das dificuldades para controlar o incontrolável, que é a sua insegurança.
No entanto para Platão, ao contrário do que se pode pensar, amamos não o que o outro possui, mas o que lhe falta. Amamos um vazio, que tem a estranha capacidade de se deslocar entre as pessoas, ou seja, como dizia Carlos Drummond de Andrade: “Eu te amo porque não amo bastante ou demais a mim. Porque amor não se troca, não se conjuga nem se ama. Porque o amor é amor a nada, feliz e forte em si mesmo”. É uma angulação pessimista do problema, mas que não deixa de ser romântica. Quais as consequências dessa tese para o entendimento do ciúme? Diríamos que é neste vazio, causa do amor, que o ciúme fabricará imagens e fantasias. Sobretudo, porque o ciumento com seu controle, consegue afastar a quem diz amar cada vez mais.
Portanto, o ciúme é uma emoção agressiva e não amorosa. A vítima do ciumento fica permanentemente prevenida e desconfiada, isto é, significa que uma parede se estabeleceu entre ambos. Começa a se reduzir toda possibilidade de intimidade, de confiança e de entrega. Contudo, se alguém disser que seu ciúme é sinal de amor, fuja desse amor, porque ele vai te consumir.

Um comentário:

  1. Quem ama sente ciumes e quer o ser amado somente para si... mas não "dividi-lo" com o mundo é ser egoista e egoismo não pode fazer parte do amor. Nenhum sentimento negativo pode fazer parte do amor, pois se isso acontecer provavelmente é o começo do fim......

    Beijos com carinho !!

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