18 de novembro de 2015

O AMOR SE ALIMENTA DA CONFIANÇA

Não acredito que possa haver alguém que tenha experimentado o amor mesmo que desprovido de intenções sexuais e não tenha conhecido o ciúme. Até porque os dois geralmente andam juntos. Há pessoas que acham que o ciúme é o tempero do amor. Com certeza estão equivocados. O ciúme impede a generalização do amor. Uma pitadinha de ciúme às vezes pode valorizar a pessoa amada. Costumo comparar o ciúme com a pimenta. Quando demais, acaba estragando o prato predileto. Uma pitadinha é ótimo; demais, leva o amor a se transformar em sofrimento. Parece que as pessoas andam se tornando mais possessivas, mais controladoras e, por isso, mais sofredoras e mais causadoras de sofrimentos.

Vou pontuar essa reflexão numa pesquisa do meu colega psicólogo e educador Ênio Brito Pinto, autor do livro: “Orientação Sexual na Escola – A importância da psicopedagogia nessa nova realidade”. Segundo o Ênio Brito, o que é terrível no ciúme é o sofrimento que ele causa tanto na pessoa ciumenta, como na pessoa vítima dos ciúmes. Vou um pouco além, quem sente ciúme está sempre alerta, sempre estressado, sempre atento além da conta para a possibilidade de uma traição. O corpo fica rígido, a respiração curta, o sistema nervoso simpático mais atuante do que o parassimpático. Vou explicar melhor para entendermos o ciúme.

Nós temos em nosso corpo o que é chamado de Sistema Nervoso Autônomo. Ele tem esse nome porque é mesmo autônomo, ou seja, não depende de nossa vontade. Vamos dizer que ele é composto por dois pilares: “o sistema nervoso simpático e parassimpático”. O parassimpático é o responsável pelas nossas sensações de calma e de tranquilidade. O simpático, ao contrário do que o nome sugere, é o responsável pelo estado de alerta, pela atenção, pela descarga de adrenalina no corpo. Se estivermos passeando calmamente, felizes da vida, uma conversa agradável ou ao lado da amada curtindo uma fantasia interessante, prevalece o parassimpático. Mas, se de repente a pessoa é tomada subitamente por um susto, passa predominar o sistema nervoso simpático.

Ora, o que acontece é que a pessoa ciumenta fica muito no simpático. Tudo a assusta, tudo é motivo para achar que o outro a está traindo ou poderá trair. Será que amar é estar alerta, como se a pessoa só pudesse olhar para os riscos do amor? Acontece que o amor é um risco. Não existe amor sem risco, porque nenhum amor nos de certeza. Amar é uma aposta razoável. Temos que acreditar que o outro nos respeitará, sempre nos valorizando por compartilhar do mesmo amor que junto sentimos. Amor é fogo e certeza é vácuo. Quando acaba a incerteza, o amor também se acaba, já que nada é mais destruidor de amor do que a certeza. O amor se alimenta da confiança. Ela é o nutriente do amor, é oxigênio para a lareira amorosa. Não há nada que nutra melhor o amor do que a confiança de que o outro nos ama e valoriza este amor. Este é o limite da relação amorosa, pois está alicerçada na confiança.

Entretanto, de qualquer forma, mesmo com essa confiança básica, amar é conviver com algum grau de insegurança. Finalizo essa reflexão citando um grande poeta português Luís Vaz de Camões (1524-1580), que expressava em seus poemas um amor idealizado que não chegava às vias de fato, colocava-se sempre no plano da abstração. Falava do amor preso ao dualismo, do amor que por um lado ilumina a mente, gera a poesia e enobrece o espírito, que aproxima do divino, do belo, do eterno, do puro e do maravilhoso. Dizia também do amor que tortura e escraviza pela impossibilidade de ignorar o desejo de posse da amada e as urgências da carne. Camões queixou-se inúmeras vezes, amargamente, da tirania desses amores impossíveis, chorou as distâncias, as despedidas, a saudade, a falta de reciprocidade e a impalpabilidade dos nobres frutos que esse amor produz.

Concluo então, com um soneto de Camões muito conhecido: “Amor é fogo que arde sem se ver. É ferida que dói e não se sente. É um contentamento descontente. É dor que desatina sem doer. É um não querer mais que bem querer. É solitário andar por entre a gente. É nunca contentar-se de contente. É cuidar que se ganha em se perder. É querer estar preso por vontade. É servir a quem vence o vencedor. É ter com quem nos mata lealdade. Mas como causar pode seu favor. Nos corações humanos amizade. Se tão contrário a si é o mesmo amor?” 

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