29 de abril de 2015

AMAR É HABITAR O PARAÍSO

A vida do homem não pode ser vivida pela repetição do modelo da sua espécie, ele tem que vivê-la. O homem é o único animal que pode sentir-se aborrecido, que pode sentir-se expulso do paraíso. O homem é o único animal que considera a sua existência um problema que tem de ser resolvido e do qual não pode escapar. Não pode voltar ao estado pré-humano de harmonia com a natureza; tem que prosseguir no aprimoramento da sua razão até tornar-se o senhor da natureza e de si mesmo. Para, então, concluir que o homem que vive no Jardim do Éden, em completa harmonia com a natureza, mas sem autoconsciência, inicia a sua história pelo primeiro ato de liberdade, pela desobediência ao comando. E concomitantemente, adquire a consciência de si mesmo, da sua separação, do seu desamparo; é expulso do paraíso. Contudo, o pecado original é um ato de liberdade e o ganho da consciência.

Ao ganhar a consciência o homem descobriu o amor. Aprendeu que o amor não é apenas um sentimento forte, e sim uma decisão, um juízo e ao mesmo tempo uma promessa. Se o amor fosse apenas um sentimento, não haveria base para a promessa de amar um ao outro para sempre. Um sentimento vem e pode ir. Como posso julgar se ele vai ficar para sempre, se meu ato não envolver juízo e decisão? Segundo o filósofo e psicanalista Erich Fromm (1900-1980) ao iniciar seu livro “A Arte de Amar”, afirma que para sermos sujeitos capazes de exercer essa arte, devemos aprender a teoria e a prática do amor. O amor é uma arte? Então requer conhecimento e esforço. Em muitos casos o ideal amoroso é desmistificado. Se não houver a consciência do estado de separação do homem e o exercício da liberdade para a prática do poder de amar dando ao outro a expressão e manifestação de que se é vivo nele, em sua alegria, compreensão, interesse, conhecimento, sem sacrificar a própria vida, o pseudo amor se esvai com os primeiros antagonismos.

Entretanto, o amor é desvendado como resposta para o problema da existência humana. Só há certeza com relação ao passado; com relação ao futuro, a única certeza que existe é a da morte. A consciência do estado de separação faz com que o homem busque a união para superar a solidão, a culpa e a ansiedade. A necessidade de se unir é observada nos mais remotos mitos como, por exemplo: a história de Adão e Eva. Ao deixar o paraíso descubro o amor e de posse desse conhecimento, sinto que amar também é estar no paraíso, só que agora com consciência. Fica claro que o amor é o único meio de conhecimento. No ato de união ele dá resposta à minha busca. No ato de amar, de me dar, de penetrar a alma do outro, encontro-me e descubro o ser humano que sou no outro, descubro a essência humana. Todavia, o amor é desvendado em suas inúmeras formas.

A começar pelo amor fraterno que é o amor por todos os seres humanos, o amor universal pelos iguais. O amor materno que é uma afirmação incondicional pela vida: duas pessoas que eram uma se separam e vivem a necessária relação simbiótica nos primeiros anos, o crescimento da criança e o amadurecimento do vínculo, ilustram muito bem essa afirmativa. Amor está no nível ou grau de responsabilidade, utilidade e prazer com que lidamos com as coisas e pessoas que conhecemos. O amor erótico é o anseio da plena fusão, nele ocorre o paradoxo de que dois seres se tornam um, mesmo permanecendo dois. O amor a si próprio é liberto do estigma de ser egoísta para ser a declaração de capacidade de amar. No entanto, o amor a Deus é a forma religiosa do amor e também nasce da necessidade de superar o estado de separação e alcançar a união. Nada poderia ser mais perfeito que o amor.

Erich Fromm discorre no seu livro sobre a desintegração do amor da sociedade ocidental contemporânea, a sociedade capitalista e os paliativos encontrados para a pessoa não tomar consciência de seu estado de solidão e as psicopatologias presentes no homem moderno como os distúrbios neuróticos e as relações eivadas de sadismo e masoquismo. Nossa civilização oferece vários paliativos que ajudam as pessoas a não tomar consciência de sua solidão. O primeiro deles é a estrita rotina de trabalho burocratizado e mecânico, com o intuito de ajudar as pessoas a permanecerem inconscientes de seus desejos humanos mais primitivos e fundamentais, do anseio de transcendência e unidade. No entanto, o que importa em relação ao amor é a fé em nosso próprio amor, na capacidade que este tem de produzir amor nos outros e na confiabilidade desse amor. Ser capaz de amar é ter a coragem de assumir riscos e empreender a única maneira saudável de responder ao problema da existência humana. Acreditar na possibilidade do amor, também como fenômeno social, é a fé racional baseada na compreensão da natureza verdadeira do homem.

Por outro lado, corremos o risco da obsessão e descontrole, sinais claros de doenças sérias e merecem respeito e tratamento, mas batizar isso de “amar demais”. Fica implícito que amar tem medida, que amar tem limite, quando na verdade amar nunca é demais. O que existe são mulheres e homens que tem baixa auto-estima, que tem níveis exagerados de insegurança e que não sabem a diferença entre amor e possessão. Ainda tem aqueles que são apenas ciumentos e desconfiados, tornando-se chatos demais. Tendo em vista, que amar não é se envolver com a pessoa certa, perfeita, aquela dos nossos sonhos. Não existem príncipes nem princesas, encare a outra pessoa de forma sincera e real, exaltando suas qualidades, mas sabendo também de seus defeitos. O amor só é lindo, quando encontramos alguém que nos transforme no melhor que podemos ser. Com o tempo vamos percebendo que para ser feliz com outra pessoa é preciso em primeiro lugar não precisar dela. O segredo é não correr atrás das borboletas, e sim cuidar do jardim para que elas venham até você. Assim também é com o amor. No final vamos achar não quem estávamos procurando, mas quem estava nos procurando.

Portanto, aprenda a se gostar, a se cuidar e principalmente a olhar para aquele que realmente gosta de você. A idade vai chegando e com o passar dos anos, nossas prioridades na vida vão mudando. Nunca toque numa vida se não pretende romper um coração. Nunca olhe nos olhos de alguém se não quiser vê-lo se derramar em lágrimas por causa de ti. A coisa mais cruel que podemos fazer é permitir que alguém se apaixone quando na verdade, não pretendemos dividir nosso amor com essa pessoa. Contudo, conquistar um coração de verdade dá trabalho, requer paciência, é como se fosse tecer uma colcha de retalhos, aplicar uma renda em um vestido, tratar de um jardim, cuidar de uma criança. É necessário que seja com destreza, com vontade, com encanto, carinho e sinceridade. Para se conquistar um coração definitivamente tem que ter garra e esperteza, mas não falo dessa esperteza que todos conhecem, falo da esperteza de sentimentos, daquele que existe guardado na alma em todos os momentos. Até que um dia, cansado de estar dividido ao meio, esse coração chamará a sua outra parte e alguém por vontade própria, sem que precisemos roubá-la ou furtá-la nos entregará a metade que faltava. Quando isto acontecer, voltaremos a habitar o Paraíso.

Um comentário:

  1. O amor só é lindo, quando encontramos alguém que nos transforme no melhor que podemos ser.
    Eu encontrei este alguém, que me ajuda a cada dia me transformar, espero ter sido o mesmo para ele...

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