2 de fevereiro de 2012

NA ESSÊNCIA SOMOS TODOS SOLITÁRIOS

Acredito que só podem estabelecer relações efetivamente interpessoais aquelas pessoas que estiverem em condições de se reconhecerem como únicas e acima de tudo se aceitarem como criaturas essencialmente solitárias, cujo modo de ser e de pensar não serve para avaliar as outras pessoas. Aqueles que não se aceitam como indivíduos solitários veem o outro como remédio para seu desamparo, ao passo que os que se aceitam sozinhos já sabem que o outro não pode atender a todos os seus desejos. Por exemplo, às vezes pensamos que gostamos de uma determinada pessoa, só porque ela entende a gente e faz coisas gostosas que nos enchem de prazer naquele momento. No entanto, o que mais queremos naquele momento é esse aconchego e ser compreendido por alguém. É ver o outro como remédio para seus males interagindo com ele sempre levando em conta suas enormes necessidades pessoais.
Uma mulher que foi abandonada pelo seu marido, para que ela fique bem com a ausência do seu homem é preciso que tenha capacidade de existir como criatura solitária. Ao contrário, poderá sofrer o resto da vida a perda do seu parceiro e, por dentro, estará pensando “e agora o que será de mim sem ele? Se reconhecermos que somos, de fato, seres solitários, uma vez que nosso cérebro é único, pensamos somente por nós e por mais ninguém e que nossa comunicação é precária. Eu diria que esse ser humano é forte e tem tudo para superar essa perda. Todo o individuo que se basta é justamente aquele que pode relacionar-se verdadeiramente com o outro sem medo da perda, justamente por se reconhecer como um ser solitário e único. A gente vê muito isso nos filmes, no final após o mocinho beijar a mocinha e fazer sexo amoroso, despede-se dela como um cavalheiro solitário para nunca mais se verem.
É evidente que numa relação a dois, o outro existe para nos completar e vice e versa, já que qualquer movimento dele ou nosso que venha estar em desacordo com a nossa expectativa ou a dele, fará surgir uma dolorosa sensação de decepção de algo que não era exatamente o que pensamos que fosse e por isso, definitivamente, não nos sentimos plenamente felizes ao lado dessa pessoa.
O fato é que quase ninguém consegue reconhecer essa sensação de incompletude, já que sempre estamos sentindo falta de alguma coisa. Todavia, buscamos encontrar a parte que nos falta, ou seja, a nossa outra metade, como diz Platão no Banquete, o tal fenômeno do amor romântico. É aqui que mora o perigo. A busca dessa fusão com a outra parte,que também é solitária, nos provoca uma sensação de completude. As afinidades são a base dessas relações, pois as semelhanças no modo de pensar nos fazem sentir menos solitários. Essa é uma característica que nem sempre está presente nesse encontro romântico e que rapidamente irá fazer muita falta. Essa afinidade no modo de pensar é talvez o que há de mais essencial nas amizades. Se o amor estabelece um aconchego físico, as amizades determinam um aconchego intelectual. Se o primeiro é infantil, regressivo, este último é a mais sofisticada expressão de nosso desenvolvimento intelectual. Por isso que o verdadeiro amor nasce a partir de uma sólida amizade constituída. Pautado na confiança e no respeito.
Entretanto, ao considerarmos como metade, como parte que reclama a sua outra metade e não como inteiro e solitário que somos, enxergando o outro como peça necessária para minha estabilidade emocional, certamente vamos desenvolver mecanismo de dominação sobre o outro. Indubitavelmente, estaremos transformando o outro num objeto de uso pessoal, ao passo que ele também é um ser solitário e singular. A minha dependência em relação a essa pessoa crescerá, ao mesmo tempo em que a minha autoestima decrescerá. Todavia, os que não forem capazes de manterem um relacionamento sem achar que o outro tem que estar a seu serviço, tenderão a ficar sozinhos.
Portanto, o número de corações destroçados por decepções inesperadas só tem crescido nos últimos anos. Enquanto tratarmos o outro como metade, como uma parte que reclama e não como inteiro, um ser único e insubstituível, as relações interpessoais serão marcadas por angústia e a dor do fracasso, pois o outro, declaradamente, está sendo usado, ainda que seus anseios verdadeiros estejam sendo satisfeitos. A verdade é que agradar o amado é, em muitos casos, a parte menos relevante nessas relações. Aqui o amor é apenas um remédio para nosso maior mal, que é de nos sentirmos incompletos quando somos de fato, um ser completo. Enfim, reconhecer-se como metade, constitui-se na necessidade do outro, ou seja, uma relação neurótica. E ao reconhecer-se como um ser solitário e único, constitui-se num desejo primordial de querer o outro para AMAR com absoluta negação de todo o tipo de dependência ou necessidade.      

Um comentário:

  1. Ser único e amar-se em primeiro lugar.Só assim estamos prontos para amar o outro

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