17 de abril de 2017

O MUNDO COMO EXPERIÊNCIA

A vida do ser humano não se restringe apenas ao âmbito dos verbos transitivos. Ela não se limita somente às atividades que têm algo por objeto. Eu percebo alguma coisa. Experimento alguma coisa, ou represento alguma coisa, quero alguma coisa, ou sinto alguma coisa, penso em alguma coisa. A vida do ser humano não consiste unicamente nisto ou em algo semelhante. Tudo isso e o que se assemelha a isso, fundamenta o domínio das coisas. No entanto, afirma-se que o homem experiencia o seu mundo. O que isso significa? Que o homem explora a superfície das coisas e as experiencia. Adquire delas um saber sobre a sua natureza e sua constituição, isto é, uma experiência. Ele experiencia o que é próprio às coisas. Porém, o homem não se aproxima do mundo somente através de experiências. Estas lhe apresentam apenas um mundo constituído por coisas, por signos a ser decodificado.

Por exemplo, os sentidos percebem a existência de uma semente e de uma árvore e nada mais. Estas duas coisas afiguram-se aos sentidos como dois ser inteiramente separado, desconexos, sem nenhuma relação ou nexo um com outro. Por vezes os sentidos percebem que uma dessas duas coisas vêem depois da outra, como a árvore vem depois da semente, igualmente a ave vem depois do ovo; isto que dizer que percebem uma sucessão cronológica de fenômenos. A inteligência, porém, verifica não apenas essas duas coisas interligadas pela percepção sensitiva, mas verifica-se, além disto, uma terceira realidade, um nexo lógico entre os dois primeiros; percebem-se, então, não a existência de ambos independentes entre si, mas também devido à existência do anterior. Em outras palavras, a inteligência possui a faculdade de descobrir que um ser é devido ao outro, de modos que o segundo deve sua existência ao primeiro. A sucessão cronológica é algo pessoalmente externo – o nexo lógico é algo interno, espiritual.

O homem é um experimentador que não participa do mundo. A experiência se realiza nele e não entre ele e o mundo. Porque o mundo não toma parte da experiência, ele se deixa experienciar, mas nada tem a ver com isso, pois, ele nada faz com isso e nada disso o atinge. O mundo como experiência diz respeito à palavra-princípio "Eu-Isso". E a palavra-princípio "Eu-Tu", que fundamenta o mundo das relações. De modo que o mundo das relações se realiza em três esferas. Sendo que a primeira é a nossa vida com a natureza. Nesta esfera a relação realiza-se numa penumbra como que aquém da linguagem. As criaturas movem-se diante de nós sem possibilidade de vir até nós, mas o "Tu" depara-se com o limiar da palavra. A segunda é a vida com os homens. Nesta esfera a relação é explícita e se manifesta a todo instante. Podendo endereçar-se e receber o outro, acolher o "Tu". E a terceira e ultima, é a vida com os seres espirituais. É aqui que a relação se revela, silenciosa, mas gerando a linguagem. Somos nós que proferimos, de todo nosso ser.

Em cada uma das esferas, graças a tudo aquilo que nos torna presente, nós vislumbramos a orla do "Tu Eterno", nós sentimos em cada "Tu" um sopro provindo dele, nós o invocamos à maneira própria de cada esfera. Ao considerar uma árvore, posso apreendê-la como uma imagem. Tronco rígido sob o impacto da luz, ou o verde resplandecente repleto de suavidade pelo azul e prateado do céu que lhe serve de fundo. Posso sentí-la como movimento, filamento fluente da clorofila das folhagens nos seus respectivos vasos, sucção de raízes, respiração das folhas, permuta incessante de terra e ar, e mesmo o próprio desenvolvimento obscuro que delas provem.

Portanto, não se pode viver unicamente no presente, ele poderia consumir alguém se não estivesse previsto que ele seria rápido e radicalmente superado. Pode-se, no entanto, viver unicamente no passado, é somente nele que uma existência pode ser realizada. Basta consagrar cada instante à experiência e à utilização que ele não se consumirá mais. E com toda a seriedade da verdade, vamos pensar: "o homem não aprendeu a viver sem coisificar o outro, mas aquele que vive somente de explorar a superfície das coisas, não é homem e muito menos humano na sua essência”. Humano é aquele que reconhece o seu ser no outro e não aquele que exclui o teu semelhante. Vamos pensar nisso, se realmente sonhamos com a paz!  

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