1 de novembro de 2011

PODE-SE TER AMOR?

Toda a felicidade humana está fundada no amor. As pessoas que não amam não podem ser felizes. A embriaguez dos amantes é consequência do seu êxtase amoroso. Pessoas que durante muito tempo não acreditavam na própria possibilidade de amar, converteram-se em escravos humildes e rendidos a um parceiro que lhe proporcionou o encontro com a divindade, mostrando a riqueza desse sentimento quando experimentado no corpo e na alma. É a valorização plena do SER.
Se pudéssemos ter o amor, certamente ele deveria ser uma coisa, uma substância que pudéssemos tocar e possuir, uma coisa adquirida. Na verdade, não é bem assim, não existe algo tão sublime quanto o amor que se possa ter. O amor é algo para sentir e não para se ter. Amor é abstração, nele existe apenas o ato de amar. Implica cuidado, conhecimento, ajuste, afirmação, gozo. Significa trazer à vida, melhorar os anos vividos. É um processo, autorrenovador e autocrescente.
Quando o amor é vivido no modo ter, ele implica confinamento, aprisionamento ou controle do objeto que se ama. É sufocante, debilitante, mortificante e estéril. O que chamamos de amor é quase sempre um emprego equivocado da palavra, a fim de ocultar a realidade do desamor. As pessoas se tornam coisas que podem ser adquiridas, consumidas e descartadas ao gosto do consumidor, bastando apenas que ela enjoe do parceiro, trocando-o por outro que aparentemente demonstre ser mais interessante para aquele momento. É impressionante a facilidade que as pessoas têm para jogar no lixo o amor quando ele aparece.
Nessa dinâmica existencial, ninguém é considerado insubstituível e toda ideia de singularidade se torna motivo de risos e de zombaria pelo parceiro que não quer enxergar o amor como um dom a ser cultivado. As relações amorosas se tornam apenas um meio de obtenção imediata de prazer sexual e não uma genuína interação interpessoal pautada pelo respeito e afirmação do valor do outro, experiência na qual as duas partes ampliam as suas forças vitais por meio da alegria e do prazer de estarem juntas. Para Erich Fromm, “se amo o outro, sinto-me um só com ele, mas com ele como ele é, e não na medida em que preciso dele como objeto para o meu uso”.
Entretanto, essa disposição do TER desconhece a experiência da alteridade, aquilo que é distinto, a genuína compreensão da prática amorosa, que se sustenta na necessidade mais profunda do ser humano de superar seu estado de isolamento em relação ao outro. A incapacidade de amar das pessoas faz com que o outro vislumbre no consumismo a conquista de um fugaz bem estar por meio do consumo onde as relações permanecem descartáveis. Acredita que a felicidade pode ser adquirida como uma mercadoria, contudo, acaba originando uma sensação de vazio interior, de desespero, de confusão e temor.
As pessoas, na sua maioria, já sentiram isso no corpo e na alma e tornaram-se mais realistas e sóbrias, já perceberam que não é a atração sexual que significa amor, nem que um relacionamento amistoso seja manifestação de amor.
No entanto, o casamento dá a cada sócio a posse exclusiva do corpo do outro, dos sentimentos e do cuidado. Ninguém mais tem que conquistar, porque o amor tornou-se alguma coisa que eu tenho, ou seja, passo a ter o outro como minha propriedade. Ambos deixam de se esforçar em serem amáveis e produzirem amor, daí tornaram-se entediados, e com isto desaparece a beleza que poderia continuar a existir entre os pombinhos. Ficam desapontados e perturbados. Cada qual, em geral, procura a causa da mudança no outro e cada um sente-se enganado. O que não percebem é que não mais são a mesma pessoa daquela época, quando amavam um ao outro, que o erro do que se pode dizer que seja o amor levou-os a deixar de se amarem. Desse modo, em certos casos, o casamento iniciado na base do amor converte-se numa propriedade amigável, numa empresa em que os dois egoístas se juntam no único interesse o da sagrada família. 
Portanto, os defensores das formas modernas de relacionamentos amorosos, tais como de vida conjunta e casamento aberto, como troca de casais e sexo grupal, tentam apenas evitar o problema de suas dificuldades de amar. Este tipo de relacionamento aparece como alternativa, mediante a suposta cura do tédio que abatem os pombinhos. Surge como estímulo sempre novo e pela vontade de ter mais amantes do que ser capaz de amar mesmo que seja uma só pessoa.           

Nenhum comentário:

Postar um comentário

POEMA INSTANTE DO POETA JORGE LUÍS BORGES

Se eu pudesse viver novamente a minha vida, na próxima trataria de cometer mais erros. Não tentaria ser tão perfeito, relaxaria mais. Seria ...