28 de dezembro de 2014

DÊ DIGNIDADE AO AMOR

Às vezes a gente pensa que gosta de alguém, só porque aquela pessoa entende a gente. Na verdade, o que mais queremos naquele momento é ser compreendido por alguém. Postulamos essa premissa e misturamos tudo, confundindo amor com carência. Somos invadidos por uma sensação de vazio e solidão que ocupa profundamente o nosso coração de tal forma e com tal intensidade que perdemos a referência dos nossos mais obscuros sentimentos. No entanto, chegamos a pensar que, realmente, seja mesmo o cupido que no flechou (da mitologia grega), no momento em que alguém sorri para nós. Por ser a nossa mente seletiva, e para minimizar os nossos conflitos e neuroses, prontamente criamos fantasias e com isso misturamos os sentimentos, que nos confunde completamente. Para não embarcar nesta loucura, precisamos urgentemente criar um antídoto e desfazer o engano, antes de nos envolver, achando que o amor está batendo a nossa porta.

O primeiro passo é resgatar a nossa dignidade. Palavrinha muito falada e pouco experimentada, que tem a ver com honra, respeito e amor próprio. Para descobrir o amor no outro só é possível através da dignidade, que é a nossa maior autoridade para viver o amor. Um amor digno. Importante não confundir “amor próprio” com narcisismo, que é outra coisa completamente diferente. Assim como a palavra “dignidade”, nada mais é do que uma qualidade moral que infunde respeito entre o sujeito e sua relação com o meio.

Todavia, a dignidade é o antídoto para esse engano. Esta palavra tem tudo a ver com valores e princípios morais, respeito pelos seres viventes. Como seria doce viver se a contenção exterior representasse sempre a imagem da disposição do nosso coração. No entanto, vivemos num mundo dividido e marcado pela intolerância e pela violência. O ser humano está perdido na massa de cultura inferior, abandonado na sua solidão e, ao mesmo tempo, tomado por uma esperança. Então, por que usamos as dificuldades de uma relação para rapidamente ocuparmos o papel de vítima? É o que fazemos quase sempre, achar que o outro pode resolver as minhas carências provisoriamente. Que dignidade existe nesta relação casual? Talvez nos falte coragem para admitir nossas limitações, para conseguir reconhecer no outro o quanto podemos aprender e crescer, quando olhamos com admiração e enxergamos nele o espelho de nós mesmos. Porém, esquecemos que da mesma maneira que este espelho nos mostra as nossas feridas e dores, nossas cicatrizes e medos. Escancara nossa insegurança e evidencia muitas de nossas máscaras, como também nos mostra nossas qualidades, sabedoria, dons e principalmente nosso brilho pessoal.

Entretanto, no exercício de amar e compartilhar o que temos de mais íntimos é que podemos conhecer nossa originalidade, isto é, desde que estejamos dispostos a nos olhar e nos reconhecer exatamente como somos. A partir de então, podemos iniciar o processo de transformação e transmutação da matéria para o mundo das ideias inatas que pregava Platão (427-347 a.C.). Sobretudo, por ser esta a grande magia do amor, a alquimia do coração. Mais importante do que ficarmos fazendo certos questionamentos sobre conceitos e regras do amor, esta é a oportunidade que temos de compreender a força e o poder que contem o amor. Todavia, quando nos sentimos apaixonados por alguém especial, experimentamos a sensação de que amar é querer envelhecer e morrer juntos. No entanto, chega de buscarmos motivos, respostas e garantia de felicidade eterna. Quem pode nos dar essa garantia? Esquecemos simplesmente de sugar o que a vida está nos oferecendo neste instante, que podemos nos agarrar à preciosa chance de nos encontrarmos, de finalmente enxergarmos a nossa própria alma através do amor. Reconhecer no outro o significado da nossa existência. Essa intensidade com que vivemos é que faz a nossa vida valer à pena. A nossa decisão de acreditar que cada um traz consigo um potencial em crescimento. Que faz com que o amor se transforme num caminho para a sua evolução e não um jogo onde só ganha quem acha que está certo.

Para melhor compreensão vamos usar o exemplo do filme “Vida de Inseto”. Pense numa semente. Em ato a semente é o que ela é. Um grão mínimo. Mas nessa mesma semente há uma potência, uma parte oculta que está contida na semente, a árvore. Antes mesmo de a semente ser plantada, já está dentro dela, em potência, uma árvore. Mesmo que essa semente nunca venha a ser plantada, ainda assim a potência está lá, aguardando as condições ideais para, nesse caso, germinar. Ato e potencia do filósofo grego Aristóteles (384-322 a.C.) As pessoas são sementes que aos poucos vão germinando em condições favoráveis e logo se transformam em uma linda árvore. Por isso que o amor transforma as pessoas. O amor é essa potencia que nos modifica e transforma.

Portanto, olhemos bem para o outro e procuramos enxergar nele o amor que temos para dar e a alegria que podemos proporcionar a esta pessoa. O encanto que faz brilhar a sua essência. Inclusive, porque o amor acontece de dentro para fora. Enquanto insistirmos em responsabilizar a nossa vida ao outro ou a relação amorosa, tudo que sentimos de bom ou de ruim, nada terá sentido. De mais dignidade a esse amor, assim como tudo que faz parte de nós. Nossas dores, nossos desesperos, a nossa falta de confiança, o medo de não conseguir. O que importa é o quanto somos dignos no momento em que choramos ou rimos. Enquanto amamos, o que mais importa é sermos honestos com o nosso sentimento. Que possamos ter autoridade sobre o que experimentamos durante todos os dias de nossas vidas, porque depois desses momentos mais difíceis, restará apenas a nossa dignidade. Somos fortes e frágeis porque o amor vive da fragilidade, vive da ternura, da capacidade Brâhmica de você sair ao encontro do outro na expectativa que ele te receba. É uma experiência única. Dar um pouco da tua vida ao outro. Contudo, há de se encontrar o verdadeiro resgate da dignidade humana através desta relação de amor e respeito com a nossa essência. Isto sim é viver com dignidade o amor na sua plenitude. 

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