1 de junho de 2013

AS DIFERENÇAS SEMÂNTICAS DO AMOR

Começo essa reflexão citando o escritor, semiólogo, crítico literário e filósofo francês, Roland Barthes (1915-1980): “Apesar de que todo amor é vivido como único e que o sujeito rejeite a ideia de repeti-lo mais tarde em outro lugar, às vezes ele surpreende em si mesmo uma espécie de difusão do desejo amoroso, ele compreende então que está condenado a errar até a morte, de amor em amor”. Quero dizer que foi intencional usar o vocábulo semântico por mais paradoxal que seja a palavra paixão e amor, necessita de uma compreensão a luz da linguística e da fisiologia. Tendo em vista, que a semântica é o estudo do significado das palavras individualmente aplicadas a um contexto e com influência de outras palavras. No caso aqui tratado, referimos à paixão e amor. Conhecer o significado das palavras é importante, pois só assim o falante ou escritor será capaz de selecionar a palavra certa para construir a sua mensagem. Vamos entender o que significa um e outro.

Segundo o biólogo, fisiologista e educador Miguel Arcanjo Áreas, do Instituto de Biologia (IB) da Unicamp: A paixão é uma questão sensorial, por isso ela explode e acaba rapidamente. De forma lúdica argumenta Áreas sobre as substâncias mobilizadas no corpo humano, quando as pessoas se apaixonam, amam e se relacionam sexualmente. Está comprovado que a gente se apaixona por uma imagem que formamos ao longo do tempo. Quando uma pessoa parecida com esse padrão que criamos passa por nossa vida, apaixonamo-nos por ela. Ora, então o que leva a gente a se apaixonar? Para o biólogo Áreas são duas substâncias: feniletilamina e serotonina. Estas substâncias são hormônios produzidos pelo corpo no cérebro, cujos níveis variam de acordo com a presença da pessoa que é objeto da paixão. Por conseguinte, o amor por sua vez é conduzido pelos hormônios dopamina, ocitocina e vasopressina. Estas substâncias são liberadas por estímulos dos quais não temos controle. Somos refém do amor. O amor transcende o sensorial. Já o comportamento sexual envolve todos os sentidos, além da expressão corporal e da história de vida dos amantes, por isso o sexo é pessoal, depende unicamente de cada envolvido. 

Como disse Platão (427-347 a.C.), sobre o prazer e a dor: “Procure-se um deles e estaremos sujeitos quase sempre a encontrar também o outro”. É nas relações afetivas que essa combinação paradoxal nos surpreende e fere, acima de qualquer sensação física. No envolvimento passional as impressões subjetivas superam a racionalidade, igualando paixão e amor. Sentimentos que se confundem no coração, mas distinguem-se no cérebro. Sabemos exatamente o que sentimos, só não sabemos os porquês. Pode-se dizer que no porque e no apesar estão as diferenças semânticas que a emotividade não explica. Apaixonamo-nos porque o ser amado parece ter virtudes só visíveis aos nossos olhos. Amamos quando descobrimos que, apesar de aparentes as virtudes e ostensivos os defeitos, predominam a confiança e a compreensão.

Na paixão, está o principio da dor; no amor, está o princípio do prazer. Confundir a natureza desses sentimentos é misturar prazer e dor. Com a paixão vem à posse, o ciúme, a cobrança. Tudo nos leva a pensar e pautar nossa vida na insegurança, uma vida de dor. A autenticidade da paixão está no conflito que ela gera em torno dos envolvidos. Com o amor ficam a admiração, o respeito e a lealdade, formas de amar que poucas pessoas reconhecem. Viver no amor é ter prazer de estar vivo. Nenhum relacionamento sobrevive sem esses ingredientes que decorrem não do arrebatamento, ou seja, atributo da passionalidade insensata. Mas, da razão, da lucidez, atributos esses para a maturidade racional.

Entretanto, a medicina diagnosticou a morbidez passional, atribuindo os estados de depressão e euforia a uma endorfina produzida pelo cérebro. Cientificamente já se provou que o chocolate, além de engordar, engrossar o sangue, ele é um lenitivo dos apaixonados frustrados, afirmam os estudiosos da saúde, que o chocolate ao ser metabolizado no organismo, estimula a química cerebral, provocando uma sensação de prazer semelhante à que produziria a presença da pessoa amada. Na falta do objeto de desejo, no caso aqui exposto, a pessoa amada, buscamos algum outro tipo de prazer que substitua esse objeto de desejo. O chocolate funciona nesses casos, evidentemente, como um atenuante da ansiedade, um tipo de moderador dos desejos mórbidos.

Nos desdobramentos da paixão, o amor e o ódio encontram-se e repelem-se, para negar e consentir, ou seja, no trânsito entre o amor e o não amor está a simpatia; entre o ódio e o não ódio, a antipatia; entre o não amor e o não ódio está a indiferença. Regidos por essas forças, os relacionamentos pessoais, familiares ou sociais, aproximam-se ou distanciam-se num oscilar contínuo, mediados pela sinceridade, pelo carinho, pela solidariedade, tanto quanto pela mentira, pelo desprezo, pelo egoísmo.

Segundo o filósofo holandês Baruch Spinoza (1632-1677), compreendeu que toda a nossa felicidade e toda a nossa miséria residem num só ponto: “a que tipo de objeto está preso pelo amor?” Se este suposto amor estiver centrado no egoísmo do sujeito que se diz amar de paixão, fuja desse amor. Esse amor centrado no egoísmo chama-se paixão, que facilmente é confundida com o amor. O amor, porém, é uma vivência mais ampla, é um modo de ser, de viver, que se conquista gradualmente, à medida que se desenvolve a sensibilidade para com as outras pessoas. Está na nossa capacidade de descentrar-se, sair de si, ir ao encontro do outro, em uma atitude de zelo e respeito que nada quer em troca. Ao dar amor colocamos a prova nossa força, a expressão de nossa vitalidade. No amor damos aquilo que temos de vivo em nós que é: a alegria, o interesse pela vida, a compreensão, o bom humor, o conhecimento e até as nossas tristezas e angústias.

Portanto, amar é preservar a identidade e a diferença do outro, sem perder a sua. É estar comprometido com a realização do outro, é querer seu bem. O amor é uma força de aproximação, aconchego, envolvimento e responsabilidade. Essa força dinamiza a vida que existe em cada um de nós. Derruba fronteiras, estabelece contatos verdadeiros e partilha solidariedade. Ser amoroso está na essência, é uma característica da personalidade do ser humano. Pressupõe toda uma vivência desde o seio materno. Só quem recebeu amor é capaz de amar sem medo. Contudo, enquanto houver uma alma apaixonada, o cérebro e o coração dividirão a soberania das emoções, confundindo paixão e amor.

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