9 de março de 2014

AS TRÊS GRANDES PAIXÕES DA VIDA

A vida de Bertrand Russell (1872-1970), filósofo, matemático e lógico inglês, abrange um período enorme, quase um século, estendendo-se da Inglaterra Vitoriana à era Espacial. Ele era uma espécie de relíquia vitoriana. Morreu de gripe três meses antes de completar 98 anos, produzindo conhecimento. Defensor de ideais pacifistas, humanitário e da liberdade de pensamento, autor do livro: “O Casamento e a Moral”, argumentava ele que o fator primordial da moral sexual na civilização ocidental, desde os primórdios do cristianismo, consistiu na garantia da virtude feminina, indispensável à família patriarcal. 

Analisava os fundamentos sociais, econômicos, religiosos e culturais da instituição do casamento. Russell não via razão, por exemplo, para condenar duas pessoas que se amam, apenas porque tiveram relação sexual fora do casamento. Além disso, afirmava para o horror dos moralistas de sua época, que uma aventura extraconjugal não deveria ser motivo de escândalo e ruptura. Tendo em vista, que a chave da compreensão das relações extraconjugais, passa primeiro pela imaginação do objeto desejado que é transformado pelos amantes na idealização da felicidade.

O fascínio que Russell exerceu sobre o público dependeu de numerosos fatores. Para além da sua longevidade, há muitas outras facetas que o tornaram único. Grande matemático e filósofo, apóstolo da paz e discutida figura política que era, Bertrand Russell alcançou um enorme prestígio mundial. Era o nonagenário que cativava os mais novos e inspirava os mais velhos; um aristocrata que desprezava a Câmara dos Lordes e se arriscava a ser preso; um anarquista por temperamento que desafiava o poder constituído; um ateu que traçou armas contra o dogma religioso e a moral convencional; um matemático e lógico cujas equações destronaram Euclides; um filósofo que procurou tornar a filosofia acessível aos leigos; finalmente, foi agraciado com o Prêmio Nobel de Literatura em 1950, cuja a elegância de estilo, agudeza de ironia e destreza mental remontam a uma época em que se cultivava a arte de conversar e de escrever cartas.

Entretanto, Bertrand Russell é considerado um pensador excepcional, particularmente pelas contribuições que deu à filosofia da matemática. Tem uma vasta obra de cerca de 40 volumes. A sua atividade como filósofo, como homem da ciência e como político fazem dele uma das figuras mais prestigiadas, admiráveis e discutidas de todos os tempos. Contudo, encerro essa reflexão com um delicioso texto de Bertrand Russell. Que é uma verdadeira obra de arte em prosa. Ofereço a todos que cultivam pelo menos uma das três paixões:

Três paixões, simples, mas irresistivelmente fortes, tem governado a minha vida: o desejo imenso de amar, a busca do conhecimento e uma insuportável compaixão pelo sofrimento da humanidade.

Essas paixões, como os fortes ventos, levaram-me de um lado para outro, em caminhos caprichosos, para além de um profundo oceano de angústias, chegando a beira do verdadeiro desespero.

Primeiro busquei o amor, porque ele traz o êxtases tão grande que sacrificaria todo o resto da minha vida em troca de umas poucas horas desse prazer. Procurei-o também, porque ele abranda a solidão, aquela terrível solidão na qual uma consciência em pedaço se paralisa nas margens do mundo, o insondável e frio abismo sem vida.

Procurei-o finalmente, porque na união do amor vislumbrei, em mistica miniatura, a suposta visão do paraíso que santos e poetas imaginaram. Isso foi o que procurei e, embora pudesse parecer demasiado bom para a vida humana, foi o que finalmente encontrei.

Com a mesma intensidade busquei o conhecimento. Desejei entender o coração dos homens. Desejei saber por que as estrelas brilham. E tentei apreender a força pitagórica pela qual o número se mantem acima do fluxo.

Um pouco disso, não muito, conquistei. Amor e conhecimento, até onde foram possíveis, conduziram-me aos caminhos do paraíso. Mas, a compaixão sempre me trouxe de volta à Terra. Ecos de gritos e de dor refletiram em meu coração. Crianças famintas, vítimas torturadas por opressores, velhos desassistidos como um odioso fardo para seus filhos, e o mundo inteiro de solidão, miséria e sofrimento, transformam em arremedo o que a vida humana deveria ser.

Portanto, anseio ardentemente aliviar o mal, mas não posso, e também sofro. Esta tem sido a minha vida. Achei-a digna de ser vivida, e prazerosamente a viveria outra vez se uma nova oportunidade me fosse oferecida”.

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