É
com muita tristeza que notamos que a sociedade perece não conceder ao amor e à
paixão o lugar de destaque, em que ocupou por muitos anos esse sentimento. Cito
um texto maravilhoso do poeta mexicano Octávio Paz (1914-1998): “Paulatino Crepúsculo da Imagem do Amor nas
Sociedades” que fala com clareza e lucidez sobre esse tema, esclarecendo
sobre o poder do dinheiro que vem corroendo a liberdade de amar. Permite-se que
a liberdade afetiva seja confiscada pelos poderes do capital, do mercado e da
publicidade. De modo que, se for verdade que o dinheiro é um elemento
importante, ele não tem sido suficiênte para explicar o amor à vida. Como
argumenta meu amigo religioso, educador e conêgo Álvaro Augusto Ambiel: “o corpo vem sofrendo a dessacralização e vem
sendo utilizado como objeto de consumo”.
O
homem vive em sociedade acreditando que o bem é natural, quando na realidade o
nosso maior medo é a maldade e a dor que nos causam. De modo que a vida vai
sempre de encontro com a tristeza, e quando se possui um momento de felicidade,
ele logo acaba o que prova que a felicidade vem a ser apenas um breve remédio
para a dor intensa e real, até parece que nada tem sentido se o fim não for à
dor. A sociedade é para o filósofo alemão Arthur Schopenhauer (1788-1860), uma
convenção controladora incrível, pois o homem naturalmente é o caos e causador
dessa desordem. Já para o sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925), há três
formas do medo afligir as pessoas em nossa sociedade líquida: primeiro; o medo
de não conseguir garantir o futuro, de não conseguir trabalhar ou ter qualquer
tipo de sustento. Segundo: o medo de não conseguir se fixar na estrutura
social, que significa, basicamente, o medo de perder a posição que se ocupa, de
cair para posições vulneráveis e por ultimo: o medo em torno da integridade
física, como uma doença grave ou sofrer algum tipo de agressão.
Entretanto,
a cidade é o lugar do encontro, da mistura, da efervescência, do novo, é o
lugar onde tudo e todos se encontram, mesmo sem querer encontrar, é o lugar
onde estar com quem não se conhece é um pressuposto, é um termo aceito
tacitamente e, por isso, ela é um espaço mixofílico (que tem a virtude de
aproximar as pessoas, que faz da mistura um gosto aceitável e aprovável). No
entanto, a sujeira precisa ser limpa. É na cidade onde se podem encontrar os
resultados da exclusão, da forma mais perversa e covarde.
Todavia,
nos grandes centros que encontramos os mendigos, as favelas e seus moradores,
todos estes estranhos são seres que provocam o desprezo e a repulsa dos
cidadãos ditos “normais”. A mixofobia
(a repulsa pelo estranho) é vista materialmente de forma peculiar. Passando
pela avenida paulista o maior centro financeiro da cidade de São Paulo e, como
é de se esperar, é um antro da exclusão, do comportamento “blasé” e da normatização hegemônica. Em frente aos grandes prédios,
além dos vários seguranças que efetivamente estão lá para espantar os
excluídos, há a presença de longas barras de ferro cheias de pontas que ficam
acopladas em frente às vitrines. Qual o motivo? Para os mendigos não dormir?
Isto é uma expressão clara de mixofobia.
Portanto,
o medo do outro não desaparece apenas ao se adquirir distância dele. O mais
angustiante e doloroso é perceber que esse outro de quem se tem medo é um
concidadão, que convive conosco dentro da mesma gaiola. E o maior problema da
mixofobia urbana é que ela institui o não diálogo entre quem se sente
atemorizado e quem causa tal temor. Felizmente, a mixofilia, o amor à mistura,
é cidadã a priori da cidade. Afinal, não foi por segurança que o homem se
aglomerou em cidades? Contudo, para minimizar esta dor, precisamos criar espaços
afetivos, através de boas amizades e cultivar o respeito pelo próximo.
Consolidar na perspectiva de viver mais o amor à mistura, que à separação. Somos
mais cidadãos agrupados no passeio público do que segregado num Alphaville. Um
exemplo claro dessa dor é a separação de quem amamos, que inscreve-se entre
as mais difíceis de suportar, porque se trata de uma situação em que o prazer
perdido é muito grande.
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