As
implicações do “eterno retorno”
levarão inevitavelmente a outro conceito muito importante que Friedrich Nietzsche
(1844-1900) chamou de amor-fati, isto é, amor ao destino. Para ele a formula da
grandeza do homem está no amor ao destino. Não querer nada de outro modo, nem
para adiante e nem para trás, nem em toda eternidade. Não meramente suportar o
necessário, e menos ainda dissimulá-lo, mas amá-lo. Se tudo retorna
eternamente, e exatamente como é agora, então é imprescindível ao homem seu
destino. Se não existe nada além desta existência, há de se concluir que apenas
ela merece nosso amor.
A
grande lição de Nietzsche já no fim de sua produção intelectual, era a gente
aprender a amar nosso destino, encontrar beleza no necessário, encaixar o nosso
desejo no desejo do tempo. Talvez seu último grande ensinamento. Dizer sim à
vida, porque só ela que existe e somente ela traz valor em si mesma. Esta lição
serve tanto para momentos de felicidade como para momentos de desespero.
Transformar o “foi assim” em “eu quis assim” da um sentido próprio ao
que aconteceu na sua trajetória existencial.
O
controle do passado implica aceitar o que lhe foi dado e tirado. Todos os acontecimentos
se inserem numa ordem causal da natureza, assim como cada um de nós, portanto,
nada poderia ter acontecido de outra forma, nada poderia ter sido diferente,
não adianta lamentar-se. É preciso afirma até mesmo o erro, afinal de contas,
nosso passado não é um erro, não somos um erro! Era absolutamente necessário
naquele momento e só pode ser interpretado como um erro se tomarmos formas
superiores para nos guiar (mas Deus está morto).
A
exortação de apropriar-se do que nos aconteceu torna capaz de seguir adiante. O
bom e o ruim, a dor e o prazer, são inerentes à vida, amar o que lhe acontece e
acontecerá é o primeiro passo para tornar-se quem é você. Nietzsche argumenta:
“Em vez de esperar que um poder
transcendente justifique o mundo, o homem tem de dar sentido à própria vida; em
vez de aguardar que venham redimi-lo, deve amar cada instante como ele é”.
“O homem é algo que deve ser superado” (Nietzsche
em Zaratustra, prólogo). A forma homem é velha e caduca, ela vai errar sempre
porque ainda está presa em ídolos metafísicos, presa à forma. É preciso deixar
a forma-homem para trás para afirmar aquilo que passou e mais, amar aquilo que
passou, porque assim deveria ser por toda a eternidade. Redimir o passado,
desatar os nós do ressentimento, dissolver a má-consciência. Sendo assim, para
que mais serviria o amor ao destino?
Devemos
afirmar a vida, negando toda calúnia, toda desvalorização, toda acusação que
possa ser feita contra ela. Mas este ensinamento foi muito mal compreendido. O
amor ao destino não implica em resignação, sua lição não é de aceitação
passiva, muito menos acovardar-se. Não devemos abaixar a cabeça e aceitar,
muito menos virar a outra face (Mt 5,39). O amor ao destino diz para o
indivíduo amar a vida, porque só ela existe e fora dela não há mais nada.
Significa afirmar o que tinha que ser sem deixar de afirmar a vontade de
potência, em si e no mundo.
E
negar os negadores é uma forma de afirmar! Por isso a luta também faz parte
deste amor; não se pode apenas entender que existem paradoxos e contradições, é
necessário amá-los. Devemos amar a luta, a revolta, a insubmissão. E que dizer
“não” seja apenas um passo para se
disser “sim” cada vez mais alto!
Porque temos cada vez mais vontade de dizer sim! Vontade de estar no mundo.
Vontade de amar. Amor ao destino. Isto é, amor à vida.
Portanto,
a partir da minha leitura em Nietzsche, quero cada vez mais aprender a ver como
belo aquilo que é necessário nas coisas. Amor ao destino: seja este, doravante,
o meu amor. Não quero fazer guerra ao que é feio. Não quero acusar, não quero
nem mesmo acusar os acusadores, que minha única negação seja desviar o olhar.
E, tudo somado e em suma: quero ser, algum dia, apenas alguém que diz Sim à
Vida!
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