Podemos
nos conhecer totalmente? Conhecer todas as nossas ansiedades, medos, sofrimentos,
a dor que cada um traz no peito, as feridas psicológicas, os apegos e a esperança.
Os nossos anseios e nossa fatídica solidão, o mal do século. A totalidade
disso, um pouco aprendemos. A questão é: “cada um pode aprender tudo sobre si
mesmo”? Ao longo dos anos, meses e dias ou até morrer? Penso que podemos
aprender sobre nós completamente agora, talvez neste instante em que estamos
lendo esta reflexão. Basta fazer a seguinte pergunta: “o que eu não estou procurando e reclamo por não ter”? Foi para isso
que eu fui educado? Reclamamos muito daquilo que não temos e nada fazemos para
ter.
Aprender
com a natureza e as estruturas vivas, que é um movimento sobre nós mesmos, por
isso que estamos juntos nessa teia da vida. Quem vai nos ensinar? O que há para
aprender sobre mim? Nada! Não há absolutamente nada para aprender sobre mim mesmo,
porque eu mesmo não sei nada! Coloquei muitos ensinamentos nesta afirmativa
socrática. Só sei que nada sei! Neste nada está a educação, ciência e
filosofia. Amontoe todos os ensinamentos que as religiões disseram que são as
coisas mais destrutivas, o que de pior fizeram conosco. Elas colocaram tudo
isso sobre nós, neste essencialmente nada. E nós estamos batalhando e lutando,
sobre estas coisas. Tornou-se simples as pessoas dispensar uma boa amizade,
porque a amizade parece não significar mais nada. Mudamos de amigos sem pensar
muito nos beneficio que aquele nos trouxe até aqui.
Certa
vez ouvi uma frase chapada da Dona Lazinha (1904-2010), minha saudosa mãe. Ela
disse a uma pessoa conhecida da família as seguintes palavras: “não sou ninguém, mas sou muita coisa. O
senhor tem razão, mas eu tenho muito mais se for ver”. Penso até hoje na
força dessa expressão. O quanto de fé e amor próprio está contido nessa
inferência. É o mesmo que dizer: “o
primeiro amor da minha vida sou eu mesmo”. Como saber sobre mim se não me
amo? Cada ser humano desde a infância é ferido. Ferido pelos pais psicologicamente,
ferido pela escola, através da comparação, através da competição, sendo cobrado
naquela matéria, para ser o primeiro da classe e assim por diante, na faculdade
e na vida é um constante processo de ser ferido.
Somos
todos seres humanos magoados profundamente e podemos não estar consciente
disso. Uma vez feridos desenvolvemos todas as formas de ações neuróticas. Parte
da nossa consciência exposta ou oculta, que está ferida. É possível não ser
ferido de alguma forma? Somos feridos. As consequências para não se ferir são:
“a construção de um escudo invisível em
torno de si, o afastamento das relações de amizades ou afetivas uns com os
outros para não se machucarem mais”. E nisto existe o medo, um gradual
isolamento. É possível estar livres das feridas do passado? É possível nunca se
machucar novamente? Não por insensibilidade, pelas indiferenças, ou pela total
desconsideração de todas as relações, mas sim, questionar o porque e o que está
sendo ferido.
Entretanto,
esta ferida é parte da nossa consciência, onde varias ações contraditórias e
neuróticas acontecem. Estamos examinando a mágoa, que faz parte da nossa
consciência, que não é algo fora de nós. Um ser humano que é livre totalmente,
nunca será ferido por qualquer coisa, psicologicamente. É comum dizer estou
magoado. Quem está magoado? Desde a infância tem sido construída uma imagem de
si mesmo. Temos muitas imagens de nós mesmos, não apenas as imagens que as
pessoas nos dão, mas também as imagens que nós mesmos construímos como as redes
virtuais que são apenas imagem. É com essa imagem que relacionamos. Assim, o “Eu” é a imagem que construí sobre mim,
como um grande homem ou uma grande mulher. Que sou muito bom nisso ou naquilo.
No entanto, é essa imagem que se machuca.
Portanto,
essas imagens são a totalidade do “Eu”.
Quando digo que estou magoado, entende-se que a imagem está ferida. Ou seja, a
imagem que construí a meu respeito como não sendo um idiota. Se alguém me chama
de idiota, fico magoado. Contudo, carrego essa imagem que foi ferida, para o
resto da minha vida. Então, vou cuidar para não me magoar mais, afastando
qualquer afirmação a respeito da minha tolice. Isto é muito sério, porque as
consequências de se ferir são muito complexas. E a partir dessa ferida
poderemos querer nos preencher, podendo nos tornar isso ou aquilo, para escapar
dessa terrível dor. É preciso compreender isso. É possível não ter
absolutamente nenhuma imagem a respeito de si próprio? Você pode ter uma
aparência muito bonita, brilhante, inteligente, um rosto expressivo, e eu quero
ser como você, se não sou me machuco. Sendo assim, a comparação pode ser um dos
fatores que provocam as feridas, psicologicamente. Então, por que comparar?
Podemos viver nesse mundo de modernidade, sem uma única imagem? Afinal, quem
sou eu?
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