O fenômeno do abraço é muito desejado e pouco experimentado. Temos
uma tendência a não dar importância ao contato físico como de fato ele é
necessário. Dizem os especialistas que precisamos de seis abraços por dia para
não nos sentirmos carentes. É através da estimulação da pele que tanto o homem
quanto a mulher chegam ao relaxamento e o alivio do estresse. O contato físico
fortalece o sistema imunológico. Esta harmonia entre duas almas e o contanto de
duas epidermes, enfatiza com elegância uma verdade essencial que sempre
negamos.
Algo especial acontece quando duas pessoas se tocam, porque a
linguagem do tato é a linguagem inicial da vida. Por isso, devemos confiar nos
impulsos e deixar os dedos estabelecerem uma gostosa “conversa” sobre a pele. Uma
química delicada se produz entre duas pessoas que se sentem atraídas uma pela
outra. O encontro se faz quase sempre pelo olhar. Segue-se a participação da
boca, primeiro em sorrisos, depois em
palavras. Aí vai surgindo o
desejo de tocar, de abraçar. A sedução toma conta do momento em que ambos se
olham. Neste caso o fenômeno do abraço torna-se necessário.
Nossos braços servem para abraçar, enlaçar. Só que cada abraço tem
de ser sentido, vivido. Segundo o psiquiatra e escritor José Ângelo Gaiarsa
(1920-2010), temos que tocar o outro sentindo de verdade esse contato, e não
tocar como mera formalidade. Senão você está coisificando o outro. O outro é um
ser humano de carne e osso, por isso o gesto não pode ser impensado, mecânico,
automático. As pessoas estão cansadas dos gestos automáticos que não reflete
nada. Conheço pessoas que abraçam sem entrelaçar os braços. Elas se jogam na
outra pessoa e não sente o prazer do contato vivo e essa química que o abraço
produz.
Quando tocamos o outro, que está além das fronteiras do nosso
próprio corpo, sentimos tocar a nossa consciência. Ao ser tocado, imediatamente
desperta a consciência que tenho que essa pessoa pode estar em mim. Nesse sentido, podemos ficar horas, nos
tocando e nos sentindo. Mergulhado numa gostosa sensação, percebendo o outro e
nos percebendo nesse aconchego. Aqui não implica relação genital, é bom que se
diga. A primeira impressão de amor, que fica gravada indelevelmente no córtex
cerebral da criança, vem do prazer de sugar. Associado à sucção vem o contato
corporal, o calor que emana do corpo da mãe. A sensação de estar sendo abraçada
e acariciada.
A criança registra essa impressão na mente e vai pelo resto da
vida tentando reconstituir, reencontrar essa sensação. Por isso o ser humano
tem necessidade de contato físico, tem fome de abraço. Ele está tentando
repetir o prazer que está associado a essa primeira experiência. Assim como
aprendemos a falar porque algumas pessoas falam conosco. De certo modo, vamos
falar da forma como elas nos ensinaram. Assim como também, aprendemos a
tocar e acariciar em grande parte, dependendo da forma como fomos tocados e
acariciados. O aprendizado do amor começa aqui. As sensações de mamar e amar
ficam profundamente interligados e até inseparáveis na nossa mente.
O comer exageradamente torna-se uma forma de compensar a falta de
amor. É quase certo que, quando estamos carentes, atacamos a geladeira, bebemos
mais cerveja, tomamos mais sorvete, comemos mais chocolate que o habitual. Tudo
aqui é exagerado. Entretanto, enquanto a fome de alimento pode matar sozinhos
com comida, cigarro ou álcool, a fome de contato dificilmente pode ser
satisfeita sem outra pessoa. O que se quer é tocar o outro e se deixar tocar,
mas não com um gesto vazio, automático.
Os gestos traduzem nossos sentimentos, nossas emoções, nossas
intenções. Por isso, cada um tem uma função, um significado diferente,
dependendo de onde se toca e da forma como se toca. Nesse caso pode distinguir
carinho de carícia. Carinho é agrado, gesto de ternura, gesto que protege.
Carícia é o gesto que excita, estimula e erotiza. São esses gestos que nos
aproximam, nos vinculam ao outro. Entretanto, pode-se alisar abraçar, tocar de
forma apressada, impensada, dissociada. Ou pode-se tocar sensualizando,
erotizando cada movimento. Cada gesto traduz um sentimento, uma emoção, que
provoca uma reação. Se o gesto é indiferente, não manifesta nada, não tem
energia nem intenção, você congela o outro e se congela. Se ele for macio,
terno, doce, você derrete o outro e se derrete. Se ele for erótico, excitante,
estimulante, apaixonado, você incandesce o outro e se incandesce também.
Portanto, os dedos são antenas do corpo. É bom sondar, pesquisar,
mergulhar, indo do superficial ao profundo, da periferia ao centro, do habitual
ao diferente. Para a sexóloga e escritora Maria Helena Matarazzo, ninguém pode
dizer que faz amor, pois o amor nunca se acaba, nunca se apresenta como coisa
feita. Sempre há o que fazer e refazer. Contudo, abraço e caricia nunca se
pede, apenas permita-se. Cobrar abraços é o mesmo que abraçar o espelho quando
nele me vejo.
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