O
ato de ouvir exige humildade de quem ouve. E a humildade está nisso: saber, não
com a cabeça, mas com o coração, que é possível que o outro veja mundos
diferentes, que nós não vemos. Mas isso, admitir que o outro vê coisas que nós
não vemos, implica reconhecer que somos meio cegos. Vemos pouco, vemos torto,
vemos errado. E mesmo assim julgamos sem conhecer os fatos.
Bernardo
Soares autor do “Livro do Desassossego”
foi um dos heterônimos do poeta português Fernando Pessoa (1888-1935) que diz: “aquilo que vemos é aquilo que somos”.
Assim, para sair do círculo fechado de nós mesmos, em que só vemos nosso
próprio rosto refletido nas coisas, é preciso que nos coloquemos fora de nós
mesmos. Não somos o umbigo do mundo.
E
isso é muito difícil: reconhecer que não somos o umbigo do mundo! Para se ouvir
de verdade, isto é, para nos colocarmos dentro do mundo do outro, é preciso
colocar entre parêntesis, ainda que provisoriamente, as nossas opiniões. É
claro que eu acredito que as minhas opiniões são a expressão da verdade. Se eu
não acreditasse na verdade daquilo que penso, trocaria meus pensamentos por
outros. Mas, a Filosofia não tem as opiniões como base, somente os fatos.
Todavia,
se falo é para fazer com que aquele que me ouve acredite em mim, troque os seus
pensamentos pelos meus. Isto é uma tolice, querer mudar a maneira pensar do outro. Porém, é norma de boa educação ficar em silêncio enquanto o
outro fala. Mas esse silêncio não é verdadeiro. É apenas um tempo de espera. Estou esperando que ele termine de falar, para então eu dizer a minha verdade.
A
prova disto está no seguinte: se levo a sério o que o outro está dizendo, que é
diferente do que eu penso, depois de terminada a sua fala, eu ficaria em silêncio para ruminar aquilo que ele disse, que me é estranho. Mas isso jamais acontece.
A resposta vem sempre rápida e imediata. A resposta rápida quer dizer: não
preciso ouvi-lo. Basta que ouça a mim mesmo. Não vou perder tempo
ruminando o que ele disse. Aquilo que ele disse não é o que eu diria,
portanto, ele está errado.
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