Todas
as vezes que vou a um hospital por algum problema de saúde, desconfio que a
morte ronda por esses lugares. A caminho para a sala de exame, passando por
corredores gelados, porém, o frio dentro de mim ainda era maior. Levamos uma
eternidade até chegar a tal sala de exame. Talvez parecia demorar por conta da
minha ansiedade em fazer logo a tal biópsia.
Porém,
o que me ocorreu naquele momento, foi fazer um pacto com a morte: “nem eu te procuro e nem você me procura, um
dia a gente se encontra, mas, que não seja aqui”. No entanto, a minha
memória recorrente do passado, ao sofrer um choque anafilático, veio à tona
juntamente neste momento.
Choque
anafilático, para quem não sabe, é uma reação alérgica de hipersensibilidade
imediata, que afeta o corpo todo, com a diminuição da pressão arterial e
taquicardia em que há risco de morte. Tinha que pensar nisto agora? De modo que, só aumentou a minha ansiedade naquele corredor interminável.
Já
na sala de exame para a coleta do material. Percebo uma movimentação em torno de mim.
Tudo acontecendo muito rápido. Foi nesta hora que senti que não somos
absolutamente nada e que a morte pode estar por perto nos observando. Pensei
comigo, de que adianta tanto orgulho se precisamos desses profissionais da
saúde para nos manter vivos?
Para
eles sou só mais um paciente. O médico se aproximou de mim e perguntou: “tudo bem com você”? Imagina, quem fica
bem nesta situação? Para piorar, vem a enfermeira pede para tirar a calça e a cueca. E oferece-me um avental aberto atras para vestir. Quase perguntei, mais a senhora vai
ficar aqui junto? Pois, ela permaneceu ali auxiliando o médico. Eu deitado
quase de bruços, com tudo exposto em uma situação vexatória. Quase morri de vergonha!
Não
sabia se ria ou chorava! Mas o pacto com a morte estava selado. Tinha certeza que
ela não iria me incomodar, pelo menos, não naquele momento de ansiedade. Passado alguns
segundos começa a viagem pelo interior do meu corpo. Entro numa dimensão de
serenidade e paz. Pensava na fala do médico e ria por dentro. Como posso estar bem se algo está
sendo introduzindo via reto em meu corpo?
Posso
descrever esta experiência como uma viagem, que nos coloca na fronteira entre a
vida e a morte. É nesta hora que o milagre torna-se eminente e a nossa certeza
que Deus está no comando de tudo. De modo que, quem quiser conhecer a
verdadeira sala dos milagres, faça uma visita ao centro cirúrgico ou a sala de exames. É impressionante como as pessoas chegam e sai bem. Costuma-se
entender por milagre um fato maravilhoso ou extraordinário que suscita
admiração. Hoje posso dizer que o milagre é o preâmbulo da nossa fé. É a
assinatura de Deus.
Nos
hospitais vidas são salvas a todo instante. Não perguntamos sobre os caminhos
pelos quais a vida nos conduz. Nesta hora nos restam às lembranças dos
encontros com o que a vida nos apresentou de poético e fugaz. Quando tudo
parece desabar, cabe a nós decidir entre rir ou chorar, ir ou ficar, desistir
ou lutar. Descobri no caminho incerto da vida, que o mais importante é o
decidir. Seja para qual for a direção, temos que escolher.
Portanto,
a vida nos toma pelas mãos, nos da à possibilidade de rever os nossos
conceitos, nos revela o seu mistério, nos esconde da morte e às vezes nos
concede novamente aquela oportunidade de dizer a quem amamos: “preciso de
você”. Às vezes sou julgado por coisas que não fiz e não sou. Gente maldosa
fazendo a cabeça de gente fraca de caráter. Do gosto pela vida nasce a
solidariedade e desta emana uma força muito grande, que nos arranca da
acomodação e nos faz reerguer. Sou um novo homem e reconheço a minha
fragilidade e impotência, diante dos percalços da vida.