Biologicamente
a gente compreende a vida em nascer e morrer. Mas, se quiser pensar
filosoficamente, nós aparecemos e desaparecemos. Nós aparecemos nesse mundo e
não sabemos muito bem como, por mais que se estude do ponto de vista
mecanicista. Mas, no fundo não deixa de ser uma aparição. Uma hora vamos
desaparecer e não temos a certeza para onde vamos. Existir por si só é algo
misterioso. Afinal, quem somos nós? Qual o sentido da nossa vida? O que
significa dizer que somos livres? Até que ponto podemos conhecer a realidade?
Eis aqui a nossa própria existência em questão.
Pois
tais interrogações, dentre tantas outras, incidem sobre a compreensão que
possamos ter das nossas vidas, como das nossas relações com os outros, e afetam
a nossa visão do mundo, se paramos para pensar. Só faz perguntas quem questiona
a pretensa obviedade das coisas. Para tanto, precisamos saber que não sabemos
algo. E isso nos põe em condições de aprender. Pois o “óbvio” não será apenas aquilo em que paramos de pensar, ou
repetimos sem pensar?
Por
isso, dentre outras razões, o filósofo é amigo da sabedoria. E aquele que é
amigo, que ama a sabedoria, sabe que a cada encontro de uma ideia surge um novo
ponto de partida, e que ela não está nunca acabada. A filosofia, desde as suas
origens, na Grécia Antiga, requer uma mutação no olhar e de nossas relações com
a vida e com o conhecimento. Nesse caso, será preciso exercitar um certo “estranhamento” frente a realidade, desde
as coisas mais simples ou aparentemente já sabidas. Há, aqui, uma atitude, onde
o pensar é desafiado a ir além de si mesmo. Ante essa atitude, que assume a
própria “perplexidade” e “admiração” como ponto de partida, a
filosofia é um convite ao diálogo.
Dialogar
envolve um aprendizado de escuta do outro e, dada essa condição, a cooperação
em uma construção conjunta do conhecimento. Em um diálogo não disputamos
ideias, mas, em solidariedade investigativa, acompanhamos o raciocínio do nosso
interlocutor, testando hipóteses, observando contradições, construindo novas
formas de ver e abordar um tema, conhecendo o nosso próprio processo de
conhecer. Mais que isso, dialogar é ouvir também o silêncio das vivências que
impregnam as ideias e as interrogações do outro, para que possamos partilhar um
caminho.
O
filosofar tece, assim, a forma como cada um de nós se relaciona com a sua
existência e com o seu crescimento. Surge assim um convite a pensar naquilo que
é, ainda, não pensado, a ir ao encontro dos nossos próprios limites, condição
de sua superação. Esse convite em direção ao alargamento de nossos horizontes
de sentido põe em jogo, as nossas relações com os outros, com nós mesmos, com o
meio ambiente e com o conhecimento. O caminho, porém, é duplo, e um trabalho
interior interage com as relações educativas que matemos com os demais. Pois a
jornada de nossas vidas o faz simultaneamente sós e acompanhados, quando
conjugamos a aventura de ser “Eu” com
essa outra, a de sermos também “Nós”,
na gradativa descoberta e invenção do sentido de nossa condição humana.
Portanto,
se nos dispomos a buscar o sentido de nossas vidas, não deveremos tocar de
algum modo, em seus mistérios? E isso não poderá tornar a vida ainda mais
interessante? Contudo, para tanto enigma, só mesmo recorrendo ao poeta,
filósofo e escritor português Fernando Pessoa (1888-1935), o poema “Tabacaria”: “Em que hei de pensar? Que sei
eu do que serei, eu que não sei o que sou? Ser o que penso? Mas penso ser tanta
coisa! E há tantos que pensam ser a mesma coisa que não pode haver tantos. Eu, que não tenho nenhuma certeza, sou mais
certo ou menos certo?”
Nenhum comentário:
Postar um comentário