No diálogo de Platão
(427-347 a.C.) “O Banquete”, os
convidados discursam sobre o amor. Sócrates (469-399 a.C.) o último dos
oradores do referido diálogo do amor, começa dizendo que Eros representa um
anelo de qualquer coisa que não se tem e se deseja ter. Para Sócrates o amor é
o desejo, em primeiro lugar, de alguma coisa; em segundo, só de coisas que
estejam faltando. O amor é capaz de desabrochar e de viver, morrer e
ressuscitar no mesmo dia. Come e bebe, dá e se derrama, sem nunca estar rico ou
pobre. A partir desta discussão pela boca de Sócrates, Platão explica a relação
entre Eros e a filosofia. Assim como os deuses não filosofam nem aprendem, por
já possuírem a sabedoria, os tolos e os ignorantes não aspiram adquirir
conhecimento, porque, embora nada saibam, julgam saber. Só o filósofo deseja
conhecer, pois sabe que não sabe e sente necessidade de conhecer.
Dessa forma, Platão não
reduz a busca apenas à procura de outra metade do nosso ser que nos completa
como explica no mito da origem do amor. Pare ele, Eros é ânsia de ajudar o eu
autêntico a se realizar, na medida em que a vontade humana tende para o Bem e
para o Belo, quando subordina a beleza física à beleza espiritual e desliga-se
da paixão por determinado indivíduo ou atividade, ocupando-se com a pura
contemplação da beleza. É uma concepção que deve ser compreendida de acordo com
a relação corpo e alma, segundo a qual Platão subordina Eros a Logos, ou seja,
subjuga as paixões à razão. Sendo assim, tudo que está no mundo sensível diz
respeito às paixões e o que está no mundo das ideias é contemplado pela razão.
Nas relações afetivas, o
desejo não nos impulsiona apenas para alcançar o outro como objeto. Mais que
isso, o desejo exige a relação em que se busca, sobretudo, o reconhecimento do
outro. O amante não deseja se apropriar de uma coisa e sim, deseja capturar a
consciência do outro. A relação amorosa se funda na reciprocidade, ou seja,
desejamos o outro como ser consciente que também nos deseje. O filósofo alemão Georg Wilhelm Friedrich Hegel (1770-1881),
compreende a consciência de si como desejo de reconhecimento. Isso significa
que no amor, quando um corpo se estende em direção a outro corpo, exige que
esse corpo, que ele deseja também se estenda; porque amar é desejar o desejo do
outro. Todavia, o amor é o convite para sair de si. Se a pessoa estiver muito
centrada nela mesma, não será capaz de ouvir o apelo do outro. No entanto, se uma
criança procura com naturalidade quem melhor preencha suas necessidades, se
esse procedimento persistir na vida adulta, torna-se impedimento para encontros
verdadeiros. Esta pessoa ira viver um amor idealizado, em parte fruto do medo
de lançar-se nas contradições do exercício efetivo do amor.
O temido risco de amar para
muitos é a separação. Mergulhar na relação amorosa supõe a possibilidade da
perda. Para o psicanalista austríaco Igor Caruso (1914-1981), a separação é a
vivência da morte numa situação vital. A morte do outro em minha consciência e
a vivência de minha morte na consciência do outro. Quando deixamos de amar ou
não somos mais amados; ou, ainda se as circunstâncias nos obrigam à separação,
mesmo assim o amor recíproco permanece. Se a perda é sentida de forma intensa,
a pessoa precisará de um tempo para se reestruturar, porque, mesmo quando
conseguiu manter a individualidade, o tecido do seu ser passa inevitavelmente
pelo ser do outro. Há um período de luto a ser superado após a separação,
quando ambos estão buscando novo equilíbrio. Uma das características mais
evidente do individuo maduro é saber integrar a possibilidade da morte no
cotidiano da sua vida. Porém, ao falarmos em morte, não nos referimos no
sentido literal da palavra, mas, nas diversas mortes ou perdas que permeiam
nossas vidas. Mesmo nas relações duradouras, as pessoas mudam, e a modificação
do tipo de relação significa consequentemente a perda da forma antiga de
dialogar com esse sentimento chamado amor. A moda antiga de expressar o amor
também está se despedindo do nosso meio romântico. O chamado amor cortez está
fora de moda.
Portanto, com o afrouxamento
dos laços familiares e aqui não estamos analisando as causas e muito menos procurando
uma justificativa. O chamado clássico encontro amoroso está ficando de fora,
não é mais prioridade nas relações afetivas. Com o advento da comunicação, que
em tese deveria melhorar as relações afetivas, lançou as pessoas em um mundo
onde elas contam apenas consigo mesmas. Hoje vivemos um mundo da satisfação
imediata, do prazer aqui e agora, o desejo de emoções fortes substitui os
amores ternos cuja intensidade passional certamente se atenua com o tempo, pois
a paixão é fugaz por natureza. Contudo, é bem verdade que se o amor se funda no
compromisso e se as pessoas cada vez mais tem medo da dor, do sofrimento, do
risco de perda, o que resulta são as relações superficiais, os amores breves.
Relações sem diálogo, sem colorido e sem vida. Na era da comunicação e da
informação rápida, existe um contingente enorme de pessoas alimentando-se do
amor descartável. Um amontoado de seres robóticos. E junto as relações humanas
estão indo para o abismo.
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