Às vezes a gente pensa que
gosta de alguém, só porque aquela pessoa entende a gente. Na verdade, o que
mais queremos naquele momento é ser compreendido por alguém. Postulamos essa
premissa e misturamos tudo, confundindo amor com carência. Somos invadidos por
uma sensação de vazio e solidão que ocupa profundamente o nosso coração de tal
forma e com tal intensidade que perdemos a referência dos nossos mais obscuros
sentimentos. No entanto, chegamos a pensar que, realmente, seja mesmo o cupido que
no flechou (da mitologia grega), no momento em que alguém sorri para nós. Por
ser a nossa mente seletiva, e para minimizar os nossos conflitos e neuroses,
prontamente criamos fantasias e com isso misturamos os sentimentos, que nos
confunde completamente. Para não embarcar nesta loucura, precisamos
urgentemente criar um antídoto e desfazer o engano, antes de nos envolver,
achando que o amor está batendo a nossa porta.
O primeiro passo é resgatar
a nossa dignidade. Palavrinha muito falada e pouco experimentada, que tem a ver
com honra, respeito e amor próprio. Para descobrir o amor no outro só é
possível através da dignidade, que é a nossa maior autoridade para viver o
amor. Um amor digno. Importante não confundir “amor próprio” com narcisismo, que é outra coisa completamente
diferente. Assim como a palavra “dignidade”,
nada mais é do que uma qualidade moral que infunde respeito entre o sujeito e
sua relação com o meio.
Todavia, a dignidade é o
antídoto para esse engano. Esta palavra tem tudo a ver com valores e princípios
morais, respeito pelos seres viventes. Como seria doce viver se a contenção
exterior representasse sempre a imagem da disposição do nosso coração. No entanto,
vivemos num mundo dividido e marcado pela intolerância e pela violência. O ser
humano está perdido na massa de cultura inferior, abandonado na sua solidão e,
ao mesmo tempo, tomado por uma esperança. Então, por que usamos as dificuldades
de uma relação para rapidamente ocuparmos o papel de vítima? É o que fazemos
quase sempre, achar que o outro pode resolver as minhas carências provisoriamente.
Que dignidade existe nesta relação casual? Talvez nos falte coragem para
admitir nossas limitações, para conseguir reconhecer no outro o quanto podemos
aprender e crescer, quando olhamos com admiração e enxergamos nele o espelho de
nós mesmos. Porém, esquecemos que da mesma maneira que este espelho nos mostra
as nossas feridas e dores, nossas cicatrizes e medos. Escancara nossa
insegurança e evidencia muitas de nossas máscaras, como também nos mostra
nossas qualidades, sabedoria, dons e principalmente nosso brilho pessoal.
Entretanto, no exercício de
amar e compartilhar o que temos de mais íntimos é que podemos conhecer nossa
originalidade, isto é, desde que estejamos dispostos a nos olhar e nos
reconhecer exatamente como somos. A partir de então, podemos iniciar o processo
de transformação e transmutação da matéria para o mundo das ideias inatas que
pregava Platão (427-347 a.C.). Sobretudo, por ser esta a grande magia do amor,
a alquimia do coração. Mais importante do que ficarmos fazendo certos
questionamentos sobre conceitos e regras do amor, esta é a oportunidade que
temos de compreender a força e o poder que contem o amor. Todavia, quando nos
sentimos apaixonados por alguém especial, experimentamos a sensação de que amar
é querer envelhecer e morrer juntos. No entanto, chega de buscarmos motivos,
respostas e garantia de felicidade eterna. Quem pode nos dar essa garantia?
Esquecemos simplesmente de sugar o que a vida está nos oferecendo neste
instante, que podemos nos agarrar à preciosa chance de nos encontrarmos, de
finalmente enxergarmos a nossa própria alma através do amor. Reconhecer no
outro o significado da nossa existência. Essa intensidade com que vivemos é que
faz a nossa vida valer à pena. A nossa decisão de acreditar que cada um traz consigo
um potencial em crescimento. Que faz com que o amor se transforme num caminho
para a sua evolução e não um jogo onde só ganha quem acha que está certo.
Para melhor compreensão
vamos usar o exemplo do filme “Vida de
Inseto”. Pense numa semente. Em ato a semente é o que ela é. Um grão
mínimo. Mas nessa mesma semente há uma potência, uma parte oculta que está
contida na semente, a árvore. Antes mesmo de a semente ser plantada, já está
dentro dela, em potência, uma árvore. Mesmo que essa semente nunca venha a ser
plantada, ainda assim a potência está lá, aguardando as condições ideais para,
nesse caso, germinar. Ato e potencia do filósofo grego Aristóteles (384-322
a.C.) As pessoas são sementes que aos poucos vão germinando em condições
favoráveis e logo se transformam em uma linda árvore. Por isso que o amor
transforma as pessoas. O amor é essa potencia que nos modifica e transforma.
Portanto, olhemos bem para o
outro e procuramos enxergar nele o amor que temos para dar e a alegria que
podemos proporcionar a esta pessoa. O encanto que faz brilhar a sua essência.
Inclusive, porque o amor acontece de dentro para fora. Enquanto insistirmos em
responsabilizar a nossa vida ao outro ou a relação amorosa, tudo que sentimos
de bom ou de ruim, nada terá sentido. De mais dignidade a esse amor, assim como
tudo que faz parte de nós. Nossas dores, nossos desesperos, a nossa falta de
confiança, o medo de não conseguir. O que importa é o quanto somos dignos no
momento em que choramos ou rimos. Enquanto amamos, o que mais importa é sermos
honestos com o nosso sentimento. Que possamos ter autoridade sobre o que
experimentamos durante todos os dias de nossas vidas, porque depois desses
momentos mais difíceis, restará apenas a nossa dignidade. Somos fortes e
frágeis porque o amor vive da fragilidade, vive da ternura, da capacidade
Brâhmica de você sair ao encontro do outro na expectativa que ele te receba. É
uma experiência única. Dar um pouco da tua vida ao outro. Contudo, há de se
encontrar o verdadeiro resgate da dignidade humana através desta relação de
amor e respeito com a nossa essência. Isto sim é viver com dignidade o amor na
sua plenitude.