O
individualismo é a mais cerrada solidão; enquanto que o coletivismo de cunho burocrático é outra dura modalidade de solidão. Só mesmo o movimento de
entra-se em relação autêntica com o outro é que permite a redescoberta do
sentido profundo de existir convivendo. De modo que o ser humano, no mundo e em
comunhão com o mundo, foi sempre tema nuclear de si mesmo. Para o filósofo
austríaco-judeu Martin Buber (1878-1965), que examinaremos nesta reflexão
levantou varias indagações sobre a relação do homem com a sociedade de consumo.
Assim por exemplo: qual o lugar que corresponde ao homem no cosmo? Quais as
suas relações com o destino e com o mundo das coisas? Como o homem se relaciona
com o seu semelhante na sociedade de consumo?
Na
obra central de Buber, “Eu e Tu”, colhemos suas próprias palavras:
“São três as esferas nas quais o mundo da relação se constrói. A primeira é a
vida com a natureza onde a relação permanece no limiar da linguagem. A segunda
esfera é a vida com os homens, onde a relação toma forma de linguagem. A
terceira é a vida com os seres espirituais, onde a relação embora sem linguagem
gera a linguagem”. Contudo, é claro que as relações humanas estão desfiguradas
por conta da modernidade líquida. As pessoas se relacionam como se o outro fosse
objeto. A relação eu-isso entre
pessoas tem aspectos patológicos, oriundos de fixações emocionais no
desenvolvimento de traumas sofridos nos intercâmbios afetivos e deformações da
personalidade produzidas pelo descaso humano da sociedade de consumo.
Há seres
humanos infelizes que se tornaram incapazes de amar, só querem ser amados. São
aquelas pessoas impotentes para se afeiçoar, vivendo o que poderia ser chamado
de déficit de alteridade que só lhes permite ver os outros como objetos úteis e
convenientes. Não é necessário acrescentar que, para essas pessoas
desventuradas, o seu próprio eu decai
para a condição objetal. Cito Santo Agostinho (354-430), que construiu belos
pensamentos em torno dos vocábulos latinos frui
e uti: “Fruir é inteiramente diverso de utilizar; a fruição implica comunhão
prazerosa, enquanto que a utilização só diz de manifestações frias”. Lembro
aqui estas ideias de Agostinho porque uma das coisas que mais têm degenerado as
relações interpessoais é esse pragmatismo com o qual pergunto apenas se o outro
– meu semelhante – pode ou não ser-me útil.
O eu da relação eu-isso difere do eu da
relação eu-tu. O primeiro eu apenas observa e estabelece juízos de
valores, enquanto o segundo, diferentemente de ser uma coisa em si mesma, é
algo que acontece na comunhão relacional do “encontro humano”, E há nisto uma dinâmica especial, pois o tu é evanescente por não ser
estaticamente objetivado; de modo que há a exigência de uma busca constante do
relacionamento eu-tu. Ora, entre
pessoas cujo encontro humano foi de tal modo legítimo que lhe estreitou a
convivência em verdadeiro amor, seguem acontecendo momentos de eu-isso como acidentes neuróticos da
relação. De qualquer forma, nessa relação ocorre necessariamente que o tu seja o outro polo do nosso eu, pois este só pode ser confirmado na
plenitude de sua humanidade por um tu.
Tal confirmação está, é claro, no fato da “exigência
de reciprocidade”.
Portanto,
no livro “Eu e Tu”, trata-se de uma
obra profundamente filosófica. Para compreender a filosofia do diálogo em sua
totalidade seria necessário ter conversado com o próprio Martin Buber, devido
ao tamanho da complexidade presente na sua obra. Entretanto, a despeito de toda
complexidade (que demonstra a riqueza e validade da obra) é possível inferir que
compete nos priorizar a relação eu-tu,
principalmente, em se tratando do Tu eterno, o encontro com Deus. Sem esquecer,
porém, que a experiência através da palavra-princípio eu-isso é necessária para o nosso conhecimento de mundo. Devemos
também, enxergar a natureza como um tu
e não como um isso, pois, na relação
eu-isso visualizamos a natureza como um tu
e não como um isso, pois, na relação eu-isso visualizamos a natureza como um
fim útil, assim como o mundo capitalista à enxergar, implicando por sua vez,
nos desastres ambientais visto atualmente e na situação pré-apocalíptica em que
colocamos nossa casa mãe no eu-isso.
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