9 de novembro de 2017

OLHAR PARA O ENTARDECER DA VIDA

O símbolo das decisões sabia na Grécia Antiga era uma coruja. E a coruja só voa quando o sol se põe, os gregos e os romanos diziam: “a ave de minerva só alça voo no entardecer”. Assim como a juventude não é sinal de produtividade, a velhice não é sinal de estupidez. O meu medo não é da função que se encerra, mas, da vida que continua. Que o medo não seja da indiferença, mais da própria vida em si. A aposentadoria é uma ocasião não para deprimir, mas, para revelar quem de fato eu sou. Acredite, a cor da vida é a cor da morte. Ninguém se torna excepcionalmente diferente no fim do que era no meio, só a velhice piora algumas coisas.

Há um equilíbrio e uma contradição em cada idade. Suspiramos pela infância e a juventude, mas, nenhuma criança jamais acordou e disse: “como eu gosto de ser criança”. Só os mais velhos que compõem os poemas dizem: “aí que saudades que eu tenho da aurora da minha vida”. Por que naquela época o Natal era uma festa mágica? E hoje é uma festa cara, que eu lembro com susto quando se aproxima. Há uma dor em cada idade, há uma dor na falta de autonomia infantil, há uma dor no envelhecimento. Mas é o momento de dar uma resposta dura, que talvez os anos de trabalho tenham impedido que eu dissesse com clareza: “quem sou eu?” Agora sem a fantasia e sem a personagem.

Envelhecer é tornar-se invisível, já não sou mais o centro das atenções, logo, sou apenas eu e minha circunstância. Aquilo que está a minha volta. A solidão é o lugar onde estou comigo mesmo. A fama e a atenção é o lugar onde estou com os outros. Não sei mais se tenho medo da velhice ou tenho medo de mim mesmo. A diferença entre inferno e purgatório na tradição católica, é que o inferno é para sempre e o purgatório é passageiro. Os budistas tem razão, desejar incessantemente, tem um defeito. Impede que eu veja a beleza do lugar onde estou. Na certa vou ser infeliz. Incessantemente vou ver o pior de cada situação. Envelhecer é para mim, ficar observando as árvores, os rios e os pássaros, voando de galho em galho, coisa que eu não fazia quando jovem.

Portanto, envelhecer é afinar a sensibilidade, apreciar com a alma e ver com o coração. É levar os olhos para passear pela vida, é a estratégia bibliográfica, parar e fixar o olhar em tudo que encanta a alma. É saber desejar o que posso, e aproveitar o que consigo. Dizer a cada época, não existe nada no meu tempo que não seja agora. Como disse Santo Agostinho (354-430) nas Confissões: “só existe presente, o passado é uma memória e o futuro é inexistente”. Só existe hoje, este é o meu tempo. Nunca fui nada, apenas sou. Contudo, quero estar na companhia de pessoas que façam a viagem até o fim, e não daquelas que nos acompanham por conveniência. Pessoas que nos acompanham nesta jornada até o ultimo suspiro, que tenha objetivos e descubra no prazer de envelhecer uma alegria que nunca teve antes, porque o nosso tempo é agora. Quero ter garantia, que minha vida continua sendo minha e gerida por mim, instrumentalizada por mim, tecida com os fios aleatórios do amor. Como dizia Madre Tereza de Calcutá (1910-1997): “quem julga as pessoas não tem tempo para amá-las”.

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