29 de julho de 2015

EDUCAR PARA A VIDA

Na medida em que são alcançados os objetivos da educação integral, ou seja, na sua totalidade, o aluno não está apenas se preparando para a vida, mas também adquirindo habilidades e conhecimentos que serão úteis para sua formação profissional. A educação, enquanto processo integral é necessário para a aprendizagem dos conhecimentos e habilidades inerentes ao domínio de uma ocupação qualificada. Porém, é importante refletir quanto à qualidade e a natureza da educação que se pretende oferecer. Não basta proporcionar apenas quantidade, principalmente em uma educação acadêmica. O que importa é seu caráter instrumental no sentido de propiciar ao aluno um melhor desempenho no trabalho, assim como na vida social.  

A educação escolar deverá ser organizada de modo que a educação integral desenvolvida cumpra essa função: que é proporcionar ao aluno o domínio de conhecimentos, princípios gerais, básicos, e teóricos. Sobretudo, no sistema educacional brasileiro que a educação tem como fim a compreensão dos direitos, dos deveres da pessoa humana, do cidadão, do Estado, da família e dos demais grupos que compõem a comunidade. Palavras não são eficientes, se elas não forem o transbordamento espontâneo da vivência do educador. O “ser” é a alma, o “dizer” é apenas o corpo da verdadeira pedagogia. Assim como a alma gera o corpo do homem e lhe da à vida, assim o ser do educador da vida e poder a todo o seu dizer ou ensinar.

Tendo em vista, que a Constituição estabelece como objetivo na área do ensino fundamental e médio: proporcionar ao educando a formação necessária para o desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, preparação para o trabalho e para o exercício consciente de sua cidadania. Da forma como está organizado e funcionando o sistema escolar, ele não oferece condições para que o aluno alcance estes objetivos. O que se observa é que muitos não chegam nem a concluir o ensino fundamental e aqueles que terminam o ensino médio não atingem uma formação efetiva a partir dos objetivos propostos na Constituição. Ou por negligência da escola, ou por falta de motivação do aluno e descrença da família na educação pública.

Conclui-se, que tanto a escola como a família devem estar integradas, fazendo parte de um processo global para que possa contribuir de forma efetiva no desenvolvimento integral do discente. A escola precisa rever a sua função e reconhecer onde está inserida para que possa, de fato, produzir autor e atores competentes e capazes de mudar a situação em que o país se encontra, colocando os objetivos gerais, e não apenas os específicos, como finalidade. Nesse sentido, será uma agente de transformação e não apenas uma reprodutora da sociedade que aí se encontra. Contudo, se não acordarmos e trilhar pelo caminho da educação, cada um vai ter o destino que merece. 

25 de julho de 2015

ALÉM DE SI MESMO

Tornou-se muito comum as pessoas nutrir uma atitude de posicionar-se frente à vida de maneira arrogante e prepotente, que impede de enxergar o que está além de si mesmo. Há uma tendência, principalmente entre os jovens, de acharem que sabe e pode tudo, que está sempre certo e os outros errados. Cuidado, essa postura pode ser uma doença. Todavia, existe uma fase na vida em que despertam estas características: ver-se como o centro do universo, ter um ponto de vista limitado, defendê-lo ferrenhamente e não conseguir colocar-se no lugar do outro, sendo incapaz de modificar a própria conduta. Este é um comportamento egocêntrico, que impede o indivíduo de compreender o que vem de fora. Está sempre certo e os outros errados, ele sabe tudo. Esse é o tipo mais odioso de pessoa, para se conviver.
É comum na infância a criança desenvolver uma típica forma de pensamento mágico: quando ocorrem duas coisas simultaneamente. Se o outro está de mau humor, deve ser por minha causa; se está bem comigo hoje, deve ser porque alguém me elogiou. Deduzo o que me convém, para me tranquilizar, e esqueço-me de ver a realidade como ela é. Se não consigo ter clareza sobre o que está acontecendo, em vez de usar o “dedutômetro”, seria melhor perguntar diretamente. Mas o egoísta não faz isto porque ele acha que o mundo gira em torno dele. Esta fase ocorre naturalmente entre dois e sete anos de idade, na fase do pensamento pré-operacional ou do egocentrismo. Esse é um período no qual a criança acha que sabe tudo, muito mais do que os adultos.
Entretanto, de acordo com a idade pode ser pouco, se comparado à de um adulto, ou ser muito para alguém jovem, mas nem por isto deve-se pensar que sabe tudo. A leitura, o conhecimento e o aprendizado vão mostrando-nos que quanto mais sabemos, mais sabemos que não sabemos nada. O astuto acha que sabe tudo e o sábio é aquele que sabe que estará em constante processo de aprendizado. O mundo não gira apenas ao nosso redor, que existem fatores alheios e externos que nos ajudam a perceber que não estamos sozinhos no mundo e que os outros não estão ali somente para nos servir, como pensa as crianças que é servida pelos adultos devido as suas limitações pela idade.
Aquele que se enquadra nestas características, ao menos em parte, precisa expandir a consciência, ampliar a cultura, ler mais, obter mais informações, permitir-se amadurecer, considerando que o mundo do outro também faz parte do próprio mundo, direta ou indiretamente. A teimosia, o egoísmo, a falta de benevolência, a intransigência, a arrogância e o orgulho são sintomas de egocentrismo, de uma “parada” no tempo do desenvolvimento intelectual, emocional, moral e social. Devemos observar a nós mesmo em momentos de teimosia, de defesa de nossas ideias e questionar a nós mesmos como: “Por que estou teimando? Estou certo na minha insistência? Isto me leva a algum lugar? Estou aberto ao ponto de vista do outro, mesmo que sua opinião seja diferente? Quero impor minha maneira de pensar ao outro? Só levo em conta o que quero e quando quero? Por que tenho dificuldade de aceitar um não?
Portanto, quando a pessoa passa essa fase de maneira inadequada, levam para a vida adulta neuroses, psicoses que se transformam em enfermidades mentais, como a esquizofrenia, o transtorno de personalidade narcisista e o transtorno bipolar. Ocorre um desinteresse pelo que é do outro, tornando-se responsável pela perda de contato com a realidade. Carrega em seu inconsciente uma culpa por ser quem é, remetendo-o a um sentimento de inferioridade, incapacidade e inadequação, à vulnerabilidade ao humor do outro. Tudo isso por não estar ao alcance do consciente devido às resistências e ao sentido de preservação. Acaba tomando o sentido inverso: ao invés de se sentir inferior, toma o caminho da arrogância, da petulância e do pedantismo. Talvez como forma de defesa. Dessa maneira, instala-se uma falsa sensação de proteção, convencendo-se de que sua autoestima é muito bem manejada e adaptada. Vivendo uma situação infernal de ruim e dizendo que o outro é a causa do seu desconforto.

22 de julho de 2015

EM BUSCA DE SENTIDO

Tornamo-nos mais humanos quando sabemos que vamos morrer, pois aí nos diferenciamos de outras espécies, pela consciência que temos da morte. Porém, como argumenta à filósofa e educadora Scarlett Marton (1951) da Universidade de São Paulo (USP): “nunca somos vacinados contra a morte. Quando uma pessoa próxima morre, precisamos enfrentar algo novo”. Se a morte nos faz refletir, tanto mais a morte através do suicídio nos traz interrogações profundas sobre o sentido de como levamos a nossa existência. Tanto é que o escritor, dramaturgo e filósofo francês Albert Camus (1913-1960) Premio Nobel de Literatura em 1957, afirmou que: “só existe um problema filosófico realmente sério: o suicídio”.

No contexto contemporâneo, vive-se uma situação paradoxal: por um lado, a banalização da morte. Fala-se dela o tempo todo. Basta olhar ou abrir os jornais. São notícias de guerras, terremotos, acidentes e tragédias, homicídios, mortes no trânsito. Então, por que a morte ainda é vista como escândalo? E o suicídio, por que ainda é encarado como algo proibido e como um tabu? O suicídio é um questionamento inquietante aos que continuam vivendo: Qual a motivação? Que sentido tem? Que ensinamentos tiramos disso?

No jovem, certo espírito de contestação ou mesmo de afronta à sociedade, muitas vezes pela via das drogas, o suicídio aparece como um atalho ou morte prematura. O que estaria levando muitas pessoas à contestação suicida? Seria desespero diante de um mundo sem saídas? A pressão do dia a dia nas grandes cidades, o corre-corre, as cobranças. Um desprezo irresponsável por regras de convivência e civilidade? O que mais? Quando esvaziados os sentidos, as pessoas se lançam numa contramão desesperada, talvez como forma de dizer ao mundo que ainda há tempo para mudar o curso da história.

Pode ser que o grande medo não seja tanto o de perder a vida, como mostra o avanço do número de suicídios entre adolescentes e jovens, mas o medo de perder o sentido da vida ou mesmo de não ter um sentido para perder. A falta de perspectivas, o desemprego e a violência são alguns dos fatores apontados por especialistas que contribuem para elevados índices de suicídio no mundo contemporâneo. Também doenças como depressão e transtorno de bipolaridade tornam adolescentes mais vulneráveis ao suicídio. E o que dizer da moda “suicida”, em que a busca pela jovialidade e pelo manequim ideal cria cada vez mais vítimas? A cultura ocidental, materialista, tende a negar ou disfarçar o fenômeno da morte certa, com as ideias de beleza e juventude eterna, pelos quais existe uma grande pressão pelo sucesso a qualquer custo.

Muitos jovens, em seus atos suicidas, querem expressar alguma dor, como diz a música “Há Tempos” da banda Legião Urbana, na letra e voz de Renato Russo: “Disseste que se tua voz tivesse força igual à imensa dor que sentes, teu grito acordaria não só a tua casa, mas a vizinhança inteira”. Como argumenta a jornalista e pesquisadora Paula Fontenelle no seu livro: “Suicídio – O futuro interrompido”. Afirma que: “a maioria quer dar fim à dor, não necessariamente à vida. Por esse motivo, mais de 90% dão sinais de alerta na tentativa, às vezes inconsciente, de receber ajuda e voltar atrás na decisão”.

Portanto, o sentido da morte depende do sentido que damos à vida. Julgar se a vida vale ou não a pena ser vivida é responder à questão fundamental da filosofia. O suicídio suprime o problema muito mais do que o resolve, somente o amor não o suprime, porém, resolve mais ou menos enquanto estamos vivos, e nos mantém firme na esperança. Se a vida vale ou não a pena ser vivida, melhor dizendo, o prazer de ser vivida, depende primeiro da quantidade de amor de que somos capazes de doar. Pois o amor é o combustível da vida. Este sim precisa ser repensado. Contudo, são as doenças de fundo emocional que inibe os estímulos da vida e reprime a capacidade de amar. Negar o amor é negar a vida.    

20 de julho de 2015

ÉTICA E REALIZAÇÃO HUMANA

Atravessamos por um momento difícil da nossa história e necessitamos urgente do ressurgimento da ética, como necessidade histórica diante da crise social que assola, os mais diversos aspectos da sociedade como: a política, a educação, a saúde, a cultura e assim como também na religião. A ética, portanto, torna-se um instrumento simbólico de intervenção a fim de moldar uma sociedade mais voltada para o humano. O tema da ética visa orientar a sociedade para um agir mais racional em vista do ser humano. Todavia, a ética também pode ser útil para criar uma coesão na sociedade, uma unidade na diversidade, uma compreensão do humano dentro das distinções culturais, um entendimento melhor sobre a teia de relações que constroem o humano. A obrigação primeira do ser humano é ser e agir como humano. E isso não vem acontecendo nem entre as melhores famílias.

Para melhor fundamentar essa reflexão, vou recorrer ao filósofo grego Diógenes Laércio (413-323 a.C.), que certa vez caminhava pelas ruas de Atenas com uma lanterna acesa nas mãos em plena luz do dia. Pode-se considerar que era uma atitude, à primeira vista, excêntrica. Será mesmo? Qual o significado desta atitude no contexto cultural da Grécia Antiga? Para o filósofo mencionado, o objetivo era encontrar um ser humano honesto apenas isso. No entanto, a sede por ética desponta há tempo entre os seres humanos. Entre os gregos, no período ético, destacam-se nesta reflexão dois grupos de pensadores ou duas escolas diferentes: a escola estóica (estoicismo) e a escola epicuréia (epicurismo).

O estoicismo foi formalizado por Zenão de Cítio (333-263 a.C.), em Atenas no ano 300 a.C. O termo significa “pórtico pintado”, que era o local onde os membros da escola se reuniam. Para os estóicos, a filosofia, a lógica e a ética estavam relacionadas. A ética não existe na sociedade isolada do universo. Neste caso, é ético o que está de acordo com a natureza pressuposta pelos estóicos. Como consequência, desponta um certo grau de fatalismo, de determinismo ético: o ser humano deve aceitar os acontecimentos como predeterminados. Um dos pressupostos da ética consiste na busca da felicidade dentro da pólis. Mas, o que era ser feliz para os estóicos? A felicidade (eudaimonia do grego) consistia em assumir um comportamento fundamentado em três valores: a inteligência para conhecer o bem e o mal, a coragem para saber o que temer e o que não temer e a justiça para dar a cada um o que lhe é devido. A felicidade estóica se baseava na busca da tranquilidade, num estado de autocontrole, de austeridade, de ausência de perturbações, mesmo diante dos acontecimentos contrários. A ética estóica perpassou os tempos e teve grande influência no desenvolvimento do cristianismo, onde aparecem aspectos de determinismo, de valorização do autocontrole, de submissão e de austeridade.

O epicurismo foi fundado por Epicuro (341-270 a.C.), em Atenas no ano 306 a.C. Os membros desta escola se reuniam num jardim “Kepos”. Entretanto, defendiam como princípio ético fundamental para o ser humano a felicidade que seria obtida através da tranquilidade e da serenidade. Porém, há divergências com os estóicos em relação ao caminho para se chegar à felicidade. No epicurismo, valoriza-se a inteligência prática: o ser humano age de maneira ética quando deixa livre seus desejos e necessidades humanas naturais. Sendo assim, o prazer é algo natural e a realização dos desejos humanos é algo positivo. Os epicuristas também defendiam a moderação, o autocontrole, mas não a negação dos prazeres e desejos. Diante desta valorização do prazer defendida pelos epicuristas, surgiu uma interpretação distorcida de que o epicurista é alguém voltado para uma vida de prazer, um hedonista.

Portanto, a partir destas considerações, verifica-se que ambos, estóicos e epicuristas, tinham como princípio fundamental da ética, a felicidade. Este é o ponto de convergência entre estas duas escolas gregas. A felicidade é o princípio da vida dos seres humanos. Toda a conduta humana, como a moral deve conduzir os seres humanos à felicidade. Sobretudo, usar uma única coisa que é a racionalidade. Assim sendo, o objetivo da ética consiste em descortinar horizontes para a realização do próprio ser humano. Contudo, a grande finalidade da ética e da moral é a busca da harmonia, da felicidade e da união cósmica com o universo e com a divindade. Porque, dialogar é dividir amor e conviver com sabedoria. Seja ético. Ter paciência e saber ouvir o outro também é ser ético. 

12 de julho de 2015

A CULTURA DO CONSUMISMO

Atualmente os centros comerciais tornaram-se as catedrais do consumo, onde as pessoas, de um modo geral, deixaram de pensar, onde a distância entre ricos e pobres, os que sabem e os que não sabem os que têm e os que não têm acentua-se cada vez mais. Trata-se de uma nova Idade Média, com uma pretensa minoria culta e uma grande massa ignorante. Mas todos frequentam o shopping, todos são consumidores. Por outro lado, será que controlamos nossa ansiedade de consumo? Diante dos bombardeios da mídia, quem decide? Liste o que há num shopping center: roupas, utensílios para casa, som e eletrodomésticos, perfumaria, equipamento de esporte, bancos, praça de alimentação fast food, livraria, supermercados, doces, cinemas, etc. Tudo contornado por uma decoração ímpar e bem iluminada, temperaturas ideais, segurança total e escadas que deslizam por andares. Todavia, encontramos tudo isso e muito mais nesses espaços. Esse exercício de imaginação não é para avaliar a nossa memória, mas, serve para mostrar que as catedrais do consumo já habitam o nosso inconsciente coletivo.

Entretanto, as pessoas buscam estes lugares porque lá estão as promessas de felicidade à sua espera. Também há uma certa obrigação civil de ser um bom consumidor, como ter lazer em shopping depois de uma semana árdua de trabalho, isto porque a ordem é imperativa: consumir é tudo de bom. O que gera uma estressante necessidade de possuir seja lá o que for. Na verdade, somos capturados pela mídia. As imagens do marketing estão em nosso imaginário social. Prometem a satisfação dos desejos desde que se coloque um preço a pagar. Começamos a viver menos nas proximidades dos outros e mais sob o olhar mudo dos objetos, que só vêm para nos reafirmar: “tenha mais, assim será mais”. Quanto mais sua vida se torna produto, mais se separa da vida. Há uma certa hipnose que faz com que a alienação do espectador frente ao objeto contemplado seja de: quanto mais olha, menos vive; quanto mais aceita o convite de reconhecimento ofertado nas imagens publicitárias, menos compreende sua própria existência e seu desejo.

Naturalizamos os excessos de um mundo artificial e levamos nossas crianças para passear no shopping center. Nunca a tirania das imagens e a submissão alienante ao império da mídia foram tão fortes quanto hoje. Há toda uma organização de um verdadeiro espetáculo que nos quer passivos, silenciosos e capturados. Não criando, mas reproduzindo pensamentos e estilos de vida apresentados como os únicos possíveis. Não críticos, mas sim alienados e conformados com os recortes de informações midiológicas que são escolhidos e mostrados como um pensamento globalizado do capital. Esse é o mundo em que vivemos. Em um documentário do roteirista e produtor de cinema Walter Moreira Salles (1962), ele entrevista um menino que trabalha como “aviãozinho” do tráfico para comprar um tênis e um boné de marca, porque, segundo ele, só assim vai ser gente. Que bela ética essa que criamos. Juntam-se o capital e o desejo de ter. A indústria do marketing e da propaganda trabalhando no império das ilusões. Que por sua vez atuam na lógica do desejo, porque os objetos deixam de estar em conexão com sua função real e necessária para se conectar com a imagem ilusória de realização. Voltamos a viver de fato na Caverna de Platão.

No entanto, associam bem-estar pessoal com qualidade de vida, a partir da aquisição de bens de uso e consumo. Conectam com o desejo de querer ter sempre mais. Sendo assim, torna-se claro que a ideologia do capitalismo é persuadir as pessoas a consumir muito além do que realmente precisam para manter a produção sempre ativa. Gosto muito de uma fala do filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) que diz: “onde há poder, há resistência”. Portanto, sempre existem linhas de fuga que nos possibilitam fazer outras escolhas de existência. O poder se faz sentir nas relações de controle, que tentam homogeneizar nossas vontades, capturando-as para impedir que saibamos sobre nós mesmos. Se acordo insatisfeito, querendo mais de mim mesmo e do mundo, é nessa hora que sou capturado por propaganda que vai dizer o que devo ou não fazer. Será que minha vontade seria aquela da propaganda? Por acaso fiz uma pausa para pensar no meu desejo? Ou simplesmente engoli a primeira resposta que me deram? Um dos antídotos possíveis é se conhecer e aprender a pensar. Uma das funções da economia subjetiva do capitalismo é a infantilização, ou seja, que não pensemos para não resistirmos.

Portanto, todos nós somos afetados pela necessidade de consumir. No exemplo do menino do tráfico, ele como todos os meninos, também querem um tênis de marca. Mas para conseguir o que deseja, tem que ser aviãozinho. O escritor português Prêmio Nobel de Literatura, José Saramago (1922-2010), nos faz uma provocação no seu romance “A Caverna”, quando mostra que o único lugar seguro são os shoppings center, que curiosamente não têm janelas. Ora, um lugar sem janelas é uma caverna. Quando escreveu trechos da caverna em “A Republica”, Platão (427-347 a.C.) quis evidenciar que a realidade é inventada por nós, ou seja, se vivemos em uma caverna e vemos sombras projetadas do mundo exterior, essa é a nossa realidade. Só percebemos a amplitude do mundo e as várias realidades outras se sairmos da caverna. O paralelo com nossos dias fazem-se necessário. Nesse caso a caverna é o centro comercial. A caverna engole as pessoas e as tornam prisioneiras: os consumidores atraídos pelos produtos, os fornecedores pela chance de escoar a produção, as pessoas atraídas por melhores condições de vida. Noventa e nove por cento do que existe no shopping é puro fetiche, compra-se porque é chique, não porque precisamos.                 

8 de julho de 2015

SER CRÍTICO É UMA VIRTUDE

Durante muito tempo acreditou-se que ser crítico significava ver o que estava errado a partir de uma visão ocidental, moderna, cristã e marxista. Considerando certo, como verdade já definida. Significava apropriar-se de uma teoria “crítica” sem, necessariamente, uma atitude prática, uma mudança interior. Entre nós, geralmente, esta “teoria crítica” era sinônimo de teoria marxista. Sendo esta teoria responsável por uma critica severa e uma alternativa ao capitalismo, tanto na formação dos estados socialistas, como inspiração para uma infinidade de movimentos e lutas sociais por direitos dos trabalhadores que são excluídos nos países capitalistas.

No entanto, ser crítico no contexto atual, numa sociedade de massa, onde os indivíduos correm o risco de viver a vida toda sem ter sido “ninguém”, se torna bem mais exigente. Mais ainda, ser crítico numa “sociedade do espetáculo”, que segundo a filósofa e psicanalista Maria Rita Kehl (1951), é a própria sociedade de consumo, onde: “a televisão representa a esperança de visibilidade para onde os sujeitos dirigem suas escolhas de vida”, torna-se um desafio que perece quase intransponível. Portanto, a situação atual exige que perguntemos o que significa “ser crítico”. Antes não se faria esta pergunta por que a resposta estava evidente. Ser crítico significava, inclusive, um grande otimismo histórico coletivo e individual, pois já sabíamos muito antes como o mundo deveria ser. Neste contexto, ser crítico se confundia com ver o mal, a contradição fora de mim mesmo e fora da classe que julgava ser ou representar.

Entretanto, para o filósofo e educador Selvino Assmann, da Universidade Federal de Santa Catarina, sugere a crítica como virtude intelectual e moral, referindo-se: “à urgente necessidade do individuo incluir a si próprio naquilo que se critica, à urgente necessidade de trabalharmos com maior otimismo no campo teórico e técnico, para podermos ser de novo um pouco mais otimista na prática”. Para o filósofo e educador Michel Foucault (1926-1984), intelectual francês, analisando o pensamento do filósofo alemão Imannuel Kant (1724-1804), destaca a necessidade de uma atitude crítica, isto é, uma “ontologia do presente e de nós mesmos”, onde nos perguntamos: o que está acontecendo hoje conosco? Foucault conclui que: “ser crítico significa ser mais rigoroso possível, o mais exigente possível em qualquer estudo, não temendo por em xeque as próprias certezas previamente admitidas. Significa pôr-se em jogo constantemente”.  

A crítica, portanto, se põe entre saber e o agir, entre a teoria e a prática, como uma forma de viver, intensamente, sob tensão consigo mesmo e com os outros. Tensão por renunciar à posse da verdade, sem nunca renunciar ao desejo de possuí-la, como descreve o filósofo grego Sócrates (469-399 a.C.) no diálogo platônico com o título de: “O Banquete”, onde o amor é desejar o que nos falta sem nunca podermos realizar. Porque a perfeição está no mundo das ideias platônica. Para o filósofo alemão Kant, a crítica aparece como virtude. Mais ainda, é uma questão de atitude que se justifica, por uma vontade decisória de não ser governado, atitude tanto individual quanto coletiva, sobretudo, para sair do senso comum. Todavia, significa ter coragem de pensar por conta própria e risco, deixando de lado o comodismo e não depender de ninguém para pensar por você. Como diz o filósofo e educador Mario Sérgio Cortella (1954): “a vida é muito curta para ser pequena”. Vou um pouco mais além: “a vida é muito curta para viver o que os outros querem”.   

Portanto, o contexto atual em que vivemos uma espécie de mal-estar, de solidão, de insegurança, de vida menos sólida, com menor grau de convicção, onde desconfiamos de que as mudanças sejam possíveis, de que possamos unir forças com outras pessoas para enfrentar as adversidades, talvez seja o ambiente propício para algo novo. Para o filósofo e educador francês Edgar Morin (1921): “o que morreu foi a ideia de um mundo perfeito, sem classes sociais”. Então, há que se inventar uma sociedade um pouco melhor do que essa que existe, e não abandonar-nos ao conformismo, tornando-nos conservadores do que já somos e temos. Contudo, neste sentido, ser crítico é procurar entender a realidade sem termos uma verdade já definida, a partir da qual analisamos o que está acontecendo. Para o filósofo e sociólogo alemão Teodor Adorno (1903-1969), um dos expoentes da chamada Escola de Frankfurt, afirmava: “elevar o sofrimento humano ao plano teórico, para nos darmos de cara com o perigo e a dramaticidade do que é viver”. Acreditar sempre, porque quando desistimos de algo é porque estamos começando a deixar de amar e perdendo a esperança na vida.

3 de julho de 2015

O PRESSUPOSTO DA EDUCAÇÃO É FORMAR VALORES

A educação é o percurso de nossas vidas. Na escola, onde passamos grande parte de nossa formação educacional, aprendemos ou deveríamos aprender a compartilhar conhecimentos, a dividir brinquedos e brincadeiras, a pesquisar com diversos recursos, a falar e a ouvir. Nesta sociedade de consumo, de valores associados à perfeição, à produção em série e lucrativa, estamos deixando de fazer amigos, deixando de lado aquela conversa agradável no fim da tarde, após um dia de trabalho. Nesta urgência de repensarmos aonde vamos chegar com tanta produção é que a educação reconstrói o seu papel fundamental: o de formar valores, socializar, trilhar um caminho de conquistas para seus educando e educadores como dizia Paulo Freire.

Quem melhor do que o professor, este agente da aprendizagem, para desenvolver essas habilidades juntos a seus alunos? O professor sempre ocupou lugar privilegiado, pois têm acesso as possibilidades de mudança dessa cruel realidade instituída. Cabe a ele a tarefa de educar verdadeiramente, sabendo escutar o aluno, respeitando-o em seus desejos, fazendo-se “sedutor” para ser ouvido, divulgar valores positivos através de sua fala e ações. Dimensionando seu poder de atuação, os professores podem agir mais atentamente. Podem ajudar seus alunos no aprendizado da tolerância, na capacidade de ouvir e de se fazerem ouvidos, no respeito às regras do outro, no convívio em sociedade, nas ações para a melhoria da sua escola, da sua cidade, do seu país. Sendo bom ouvinte, o professor vai formar bons ouvintes, com seu exemplo. Sendo amável, seu aluno saberá muito mais da arte das boas maneiras no trato com as pessoas. Sendo o mestre comunicativo, verá florescer alunos criativos, falantes, dinâmicos na tarefa da expressão.

Entretanto, queremos acreditar que nesse momento atual, a escola nos da esperança de novas relações. Esperança de uma geração que saiba dividir mais o seu pão e estragar menos comida, consumir com mais moderação e ostentar menos roupas e tênis da moda, respeitar os mais velhos e amar o seu próximo como a si mesmo. O professor pode proporcionar que o aluno reconheça o seu interesse em modificar esta realidade, falando com mais docilidade, sendo mais solícito, amável e prestativo, menos competitivo e rude. O professor pode deixar que os alunos vejam o seu melhor: o seu poder de falar e ouvir a todos, com amor e afeição. Afinal, é isso que nos alimenta no desejo de aprender. No entanto, os estudantes na sua maioria conferem ao professor um saber, que o mesmo deve usufruir desta posição, sem tornar-se autoritário, aquele que acha que, quem pode manda e quem tem juízo obedece. Sendo o professor um investigador de comportamentos, atitudes e aprendizagem, o deve saber ouvir e entender o que os alunos precisam compreender, ou seja, nas fases de desenvolvimento deles para melhor planejar suas aulas.

Portanto, ter amor pela educação é não ser passivo. Amar é olhar nos olhos, dizer as necessidades, compartilhar medos e tristezas, relatar alegrias, chamar a atenção, indicar o caminho certo quando o outro insiste em ir pelo lado errado. Amar pelo prazer de educar exige muitos cuidados, exige zelo e trabalho. Amar a educação é acima de tudo, deixar aflorar o carisma, ou seja, aquilo que há de melhor na pessoa: suas potencialidades e habilidades. Contudo, o professor e os alunos serão apaixonados pelo que fazem juntos e isso gera um círculo virtuoso para todas as relações humanas. Enfim, a escola é o lugar onde se faz amigos. Escola é, sobretudo, gente. Gente que trabalha e que estuda, que transmite alegria, que se conhecem e que se estimam.    

AS COISAS SÃO OS NOMES QUE LHE DAMOS

O que é que você está fazendo com a sua solidão? Quando você a lamenta, você está dizendo que gostaria de se livrar dela, que ela é um sofri...